A explosão de casos de assédio eleitoral durante o pleito deste ano causou preocupação no Judiciário e órgãos envolvidos na proteção do trabalhador e do direito eleitoral. Segundo o Ministério Público do Trabalho (MPT), foram 2.549 denúncias do crime, referente a 1.948 empresas durante as eleições. O número é doze vezes maior do que o registrado em 2018. Ao Correio, o presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Luiz Antonio Colussi, disse que a entidade está acompanhando com rigor o tema e destacou a gravidade da situação.
“Trata-se de uma herança que remete a uma mentalidade escravocrata. A universalização do direito ao voto direto e secreto, infelizmente, não aboliu por completo a mentalidade retrógrada e os abusos contra as relações trabalhistas e ao sufrágio universal. São casos de violações como assédio moral, que ferem direitos de liberdade de expressão, de proteção da intimidade e de garantia de não discriminação dos trabalhadores e trabalhadoras”, ressaltou.
Confira na entrevista na íntegra
Como a Anamatra tem acompanhado os desdobramentos dos casos de assédio eleitoral?
O número de casos de assédio eleitoral no ambiente de trabalho atingiu níveis alarmantes nas eleições deste ano. Estamos acompanhando com atenção as denúncias apresentadas pelo Ministério Público do Trabalho a juízas e juízes do Trabalho em todo o país, que estão atuando com muita seriedade e observado criteriosamente a legislação para garantir os direitos dos trabalhadores e permitir que eles se sintam seguros para denunciar esse tipo de prática em seu trabalho. Inclusive, apoiamos o Tribunal Superior do Trabalho (TST) na ampliação do plantão da Justiça do Trabalho no fim de semana da eleição neste segundo turno.
A entidade pode ajudar a combater esses crimes?
O acesso à informação é muito importante, ajuda as pessoas a conhecerem seus direitos e as encoraja a denunciar irregularidades, por isso a Anamatra vem divulgando à população informações sobre o direito ao voto livre – enfatizando que ele é pessoal, direto e secreto – e como enfrentar e denunciar o assédio. Também temos falado à Imprensa e ao público em geral, explicando o que é o assédio eleitoral e como combatê-lo. Somos parceiros do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em seus programas contra a desinformação, pois isso é muito importante para a democracia e para um Poder Judiciário melhor para todos.
O que há de mais grave nessa situação?
Além de ser uma prática absolutamente antidemocrática, o assédio eleitoral é uma conduta vedada pelo ordenamento jurídico nas mais variadas esferas: eleitoral, criminal e trabalhista. Ele pode gerar uma série de repercussões também no âmbito das relações de trabalho. Na prática, o que acontece é que alguns empregadores coagem, obrigam e estimulam seus empregados a votar ou não votar em determinados candidatos, seja por meio de ameaças diretas, seja mediante o oferecimento de vantagens a quem votar em determinado candidato, ou caso ele seja eleito. Isso nos leva a ter representantes e governantes que a população não necessariamente escolheria e oprime o trabalhador.
Nesta eleição, tivemos um salto em crimes dessa natureza. Como o senhor avalia essa escalada?
A coação de trabalhadores tem sido banalizada e precisa ser contida, por desrespeitar a legislação trabalhista e a eleitoral. Trata-se de uma herança que remete a uma mentalidade escravocrata. A universalização do direito ao voto direto e secreto, infelizmente, não aboliu por completo a mentalidade retrógrada e os abusos contra as relações trabalhistas e ao sufrágio universal. São casos de violações como assédio moral, que ferem direitos de liberdade de expressão, de proteção da intimidade e de garantia de não discriminação dos trabalhadores e trabalhadoras.
Nunca se falou tanto sobre assédio eleitoral. Qual seria a solução para combater o problema?
O aumento foi exponencial e vem na esteira das fake news e dos ataques aos direitos sociais. Essa é uma prática muito grave e que tem a capacidade de mudar os desígnios eleitorais de um país inteiro. O Brasil não pode aceitar isso.
É importante que os trabalhadores que se sintam de alguma forma tolhidos do seu direito legítimo de escolher com livre consciência e se sintam tolhidos de sua liberdade política - que é um direito fundamental -, que eles denunciem, porque o ordenamento jurídico brasileiro prevê inúmeras medidas que podem ser utilizadas para a proteção e reparação do empregado vítima de assédio eleitoral.
O empregado que sofrer assédio eleitoral ou, pior ainda, for mandado embora por não ter seguido a orientação eleitoral do empregador tem direito a inúmeras formas de reparação, de forma específica, como a reintegração ao serviço, ou reparatória, por meio de indenização. O empregador também está sujeito a pagar elevadas quantias a título de dano moral, tanto ao empregado, individualmente, quanto à coletividade – quando o valor estipulado para reparar o dano moral à sociedade é revertido a entidades filantrópicas, por exemplo.
A CPI do Assédio Eleitoral ganha adesão no Senado e pode ser aberta após a eleição. Como o senhor avalia a criação de um colegiado com esse tema?
Acredito que o problema vá além de uma relação trabalhista - na qual o MPT e a Justiça do Trabalho atuam -, e envolve também uma pressão política, que requer uma apuração firme, como vem sendo feita pelo Ministério Público Federal e pela Justiça Eleitoral. Entendo que o Parlamento precisa acompanhar com seriedade e consequência fatos que afetam o país e até mesmo possa contribuir para a discussão e aperfeiçoamento legislativo em torno do tema. Defendemos uma legislação que defina de forma mais clara as infrações e que as punições sejam mais duras.
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