No jargão do futebol, tabu é para ser quebrado. Nesse caso, a palavra é usada como metáfora para algo que nunca aconteceu ou que não acontece há tempos. Como também representam embate entre times diferentes, as eleições também têm seus tabus, que são repetidos a cada ciclo eleitoral. Frases como "nunca um candidato que chegou na frente do adversário no primeiro turno perdeu a disputa" são recorrentemente lembradas. Ou "quem ganha em Minas Gerais ganha no Brasil". Algumas dessas "certezas" não passam de lendas. Outras são suportadas por números e estatísticas.
Essas afirmações circulam no senso comum, entre eleitores, analistas, candidatos e na imprensa. O Correio buscou analisar quatro delas, para saber o quanto de fato há por trás desses chavões. Confira abaixo.
Quem vence em Minas Gerais ganha no Brasil
Minas Gerais é uma grande amostra do Brasil. Por ser a unidade da Federação que faz fronteira com o maior número de estados e o segundo maior colégio eleitoral do país, Minas acaba sendo uma amostra da cultura política. "Os resultados eleitorais têm apontado nessa direção. Por exemplo, a vitória que Dilma (Rousseff) teve em Minas não explica a vitória dela no Brasil. Não teria sido suficiente para Dilma ganhar no Brasil na eleição de 2014", explica o sociólogo e cientista político Antonio Lavareda.
Para além do contingente de votos, Minas tem composição socioeconômica e cultural bastante heterogênea, com forte contraste entre regiões metropolitanas densas e prósperas e vastas áreas empobrecidas no interior. "Essa heterogeneidade demográfica, do contraste entre dois 'brasis' muito distintos, representa, como nenhum outro estado, uma espécie de amostra quase perfeita do país. Evidência disso é o placar presidencial mineiro, no primeiro turno, ter praticamente espelhado o nacional", salienta o mestre em ciência política e professor do Ibmec-DF Danilo Morais. Ou seja, o chavão representa muito mais a ótica qualitativa do comportamento eleitoral.
Quem vence o primeiro turno, repete a vitória no segundo
Pela sétima vez, os brasileiros levam ao segundo turno uma eleição presidencial. Historicamente, desde a redemocratização, o candidato que finaliza o primeiro turno na liderança permanece desta forma no segundo, sem virada no placar. "Em eleições polarizadas, com forte concentração do eleitorado entre dois favoritos, como é a tradição no cenário nacional, essa vantagem tende a refletir certa tendência de confirmação também no segundo turno. Justo por isso, jamais houve virada nas eleições presidenciais pós-redemocratização. Se ocorrer, será inédito", destaca Morais.
Mas a premissa não se repete nos estados. Em eleições fragmentárias, com alta dispersão de votos, a vantagem inicial pode ser desfazer no segundo turno. "De 1998 a 2018, nos estados em que haviam configurações mais fragmentárias em primeiro turno, foram empiricamente mais recorrentes: houve 108 eleições de segundo turno e, em apenas 31, houve virada", analisa o professor.
As pesquisas de intenção de voto, por outro lado, mostram um retrato diferente e reacendem a esperança da virada na campanha bolsonarista. Lavareda relembra, no entanto, que apesar do ineditismo de uma virada nas urnas, a inversão nas pesquisas não é inédita: "Em 1989, Fernando Collor saiu com uma larga diferença sobre Lula do primeiro turno, mas, no segundo turno, os números deles se aproximaram bastante durante a campanha. E, depois, eles terminam com uma distância de 6 pontos percentuais de votos válidos. Já em 2014, nas duas primeiras semanas, quem estava à frente era Aécio Neves, não Dilma. Dilma só ultrapassou Aécio Neves nas pesquisas de 20 de outubro, faltando praticamente sete dias para a eleição", relembra.
Os indecisos podem mudar o resultado final
Ao longo da campanha do primeiro turno, o voto dos indecisos — correspondente a 11% da população apta a votar, não havia definido o voto a um dia da eleição. Apesar de a maioria ter sacramentado o voto — 85%, segundo o Datafolha, no primeiro turno —, os que estão em dúvida sobre quem escolher tiveram o poder de levar a eleição para mais uma rodada.
Mas, quando se trata do resultado final da eleição, os indecisos são capazes de alterar o rumo de quem assumirá o mais alto cargo político do país na última hora? Para Lavareda, não há possibilidade de alterações fora da curva. "Os movimentos que podem ocorrer são movimentos de dois pontos percentuais. Nós estamos falando de menos de dois milhões e meio de eleitores que votaram no primeiro turno. Pelo acirramento, podem ser decisivos, mas o montante não é expressivo", frisa. O mesmo avalia Morais: "Embora estejamos falando de uma eleição definida nas margens, Lula, ao que tudo indica, segue estatisticamente favorito".
A abstenção é maior entre os mais pobres
A afirmação é verdadeira e já evidenciada por dados do TSE. Conforme os números da eleição do primeiro turno, homens, jovens e menos escolarizados foram os principais faltosos. Em números absolutos, os eleitores entre 25 e 29 anos foram os que mais se abstiveram: 3,5 milhões de jovens não compareceram às urnas. Em relação ao gênero, homens tiveram abstenção de 22%, enquanto mulheres, de 20%.
Dos 156,4 milhões de eleitores aptos a votar em 2022, 32,7 milhões não foram às urnas (20,91%). Lavareda destaca que há uma correlação negativa considerável entre escolaridade e abstenção, ou seja, quanto menos escolaridade mais abstenção. "A abstenção do Brasil se dá sobretudo entre os eleitores pobres", crava.
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