Como avalia esse discurso do presidente Jair Bolsonaro sobre as inserções em rádio e televisão? Isso aumenta a tensão?
Não sei o estado psicológico do presidente da República hoje, mas o que tenho percebido é que ele tem perdido um pouco o controle. Tem acusado desnecessariamente pessoas, tem colocado coisas que não aconteceram em dúvida, e esse negócio das rádios é uma coisa da incompetência da equipe dele, que nós não temos nada a ver com isso. Ele tentar criar uma confusão por conta disso é porque está, do ponto de vista psicológico, um pouco desestruturado. Ele percebe, finalmente, que tem possibilidade de perder estas eleições, porque eu estou convencido de que nós temos chances de ganhar estas eleições, não só porque estamos na frente, mas porque nós temos uma campanha mais densa, mais estruturada. Desde a proclamação da República, ninguém nunca gastou a quantidade de dinheiro que o Bolsonaro tem gastado e inventado programa de última hora. São bilhões e bilhões nesta campanha, e ele não trabalha mais. Ou seja, quando fui candidato à reeleição, só saía para fazer campanha depois das 18h. Ele passa o dia inteiro fazendo campanha e não tem limite. Então, acho que o que ele fez ontem (quarta-feira), desesperado, convocar uma reunião, tentar falar com militares, é um pouco de desespero dele.
Bolsonaro disse na reunião que vai levar o caso das inserções ao STF e que vai fazer tudo dentro das quatro linhas da Constituição. Mas aliados dele cogitaram até pedir um adiamento do segundo turno. Como avalia isso?
Não pode ser sério alguém falar em adiamento das eleições, que tem que fazer uma PEC (proposta de emenda à Constituição), ou seja, vai ser votada quando? Ano que vem? É um absurdo. A pessoa, na verdade, não tem o que falar e, aí, falou uma bobagem dessa. A gente não pode aceitar essa discussão porque as eleições serão domingo, todo mundo está preparado para votar, o povo já está decidido. Quem vai votar no Bolsonaro, vai votar no Bolsonaro. Quem vai votar no Lula, vai votar no Lula. Nós, na verdade, temos de disputar algumas pessoas que estão indecisas, ou algumas que votaram em branco ou nulo, que a gente tem de convencê-los a ir votar. No restante, é o direito de chorar, de espernear, de quem está percebendo que vai perder as eleições.
Na sua opinião, é por isso que ele adotou essa postura?
Acho que o Bolsonaro está ciente de que ele vai perder essas eleições, está ciente de que o povo já está tomando uma decisão. Ele acompanha pesquisa, estuda pesquisa, encomenda pesquisa e sabe que vai perder estas eleições porque o povo está precisando de mudança. O povo quer um Brasil mais alegre, com esperança, o povo quer um Brasil com prazer de ser brasileiro. O povo quer um país em que se distribua livros, e não armas. Um país em que se distribua empregos. Ou seja, nós vivemos hoje um Brasil em que os servidores públicos não receberam nenhum reajuste de salário desde 2017, os servidores públicos federais. É uma coisa absurda. Então, o povo quer mudar, e o presidente Bolsonaro tem o direito de espernear, tem o direito de recorrer, tem o direito de processar, e vamos tocar, porque a vida segue.
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Alguém da sua campanha está dando golpes "abaixo da linha da cintura", como acusou Bolsonaro?
É só assistir aos programas de governo que você vai ver a diferença de comportamento da nossa campanha. Obviamente que, de vez em quando, a campanha responde a alguns ataques. Ontem, eu estava vendo que Bolsonaro, em uma semana, gastou quatro vezes mais do que nós, a campanha dele. Ele tem uma indústria de fake news. Nós já ganhamos 39 processos para tirar fake news dele das redes sociais, mas ele tem uma máquina poderosa. Não sei quantos robôs tem, mas tem uma máquina poderosa de contar mentira para este país, e nós vamos desmontando isso no nosso programa. É o mínimo que a gente pode fazer para reestabelecer a verdade neste país. As mentiras mais absurdas, as coisas sem nenhum nexo. E eles vão falando, e vão mentindo, e vão repetindo. Nós entramos com vários processos. Ganhamos quase 39 processos contra o Bolsonaro, porque ele mente demais.
O senhor tem apoio de economistas que vão de Guilherme Melo, um perfil mais à esquerda, até Henrique Meirelles, de perfil mais liberal. Qual vai ser o perfil do seu ministro da Economia?
Meu ministro da Economia terá perfil de um cara com muita inteligência política, que tenha compromisso social, que tenha que pensar na responsabilidade fiscal e na responsabilidade social. Cada vez que a gente pensar que tem de segurar o dinheiro, tem de pensar que há gente passando fome, dormindo na ponte, crianças abandonadas. Para tudo isso é preciso que haja uma política quase que de guerra, que envolva toda a sociedade, para a gente poder recuperar este país e fazer as pessoas voltarem a acreditar. Digo sempre que tem três palavras cruciais para que um presidente da República possa governar: credibilidade, estabilidade e previsibilidade. O Bolsonaro não garante nenhuma, a gente nunca sabe o que vai acontecer no dia seguinte. É tudo de surpresa e tudo uma aventura. Ele não fala de economia, de trabalho, sindicato ou de desenvolvimento. Ou seja, ele vive de fazer fake news no seu cercadinho. O país não pode ser assim, tem de voltar a ser democrático, com as instituições funcionando. Vamos conversar com o Congresso o que fazer para voltar à normalidade. Não é normal o Congresso querer administrar o Orçamento. O Orçamento é administrado pelo Poder Executivo. Vou conversar com o Arthur Lira (presidente da Câmara) e com o Rodrigo Pacheco (presidente do Senado) para a gente discutir esses assuntos.
Em 2003, na sua posse, o senhor disse que só descansaria quando não tivéssemos nenhum brasileiro passando fome, e agora a gente vê que a fome é uma realidade no Brasil. Como avalia a situação?
O grave é que quando eu deixei a Presidência da República este país vivia o seu melhor momento de esperança. Lembro de uma pesquisa feita pela ONU (Organização das Nações Unidas) em que o Brasil era o país mais alegre do mundo, e o povo brasileiro era o que mais tinha esperança no mundo. A gente estava vivendo o auge de um crescimento econômico e de uma distribuição de riqueza, o PIB (Produto Interno Bruto) estava crescendo 7,5%, as pessoas estavam comprando carro, trocando geladeira, fogão, máquina de lavar. A gente tinha implantado o Minha Casa, Minha Vida, a gente vivia um momento de êxtase aqui no Brasil. Tínhamos mais de 13 mil obras funcionando no país inteiro. E, 13 anos depois, volto, e o país está pior do que eu peguei em 2003. Embora a inflação esteja um pouco menor, a inflação dos alimentos está mais alta. Embora o desemprego esteja um pouco menor, ainda está acima de 10%. Mais de 33 milhões de pessoas estão passando fome, abaixo da linha da pobreza. Ou seja, nós vamos ter de começar quase que tudo de novo.
Como fará isso?
Vamos ter de começar, primeiro, fazendo a economia voltar a crescer. Se eu ganhar as eleições, logo na primeira semana quero ter uma reunião com os 27 governadores para que a gente possa estabelecer quais as prioridades de cada estado do ponto de vista de infraestrutura, da educação e da saúde, para que a gente possa ver que dinheiro tem de Orçamento e que dinheiro os empresários podem investir. Para que a gente comece, efetivamente, a trabalhar 24h por dia para a economia voltar a crescer, para gerar emprego e renda. E, aí, a gente vai cuidar dos pobres outra vez, a gente vai ter de incentivar muito a agricultura, sobretudo até 100 hectares, que são 4,5 milhões de pequenos produtores, que é quem produz a comida do povo brasileiro, para que a gente aumente a nossa capacidade produtiva para balancear os alimentos. Vamos fazer a Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) fazer um estoque regulador. A gente utilizava o estoque da Conab para equilibrar o preço. Quando o mercado estava aumentando muito o preço, a gente liberava os produtos da Conab para baratear, e tudo isso acabou. Vamos ter de começar quase tudo de novo outra vez.
Que análise faz do nível atual do emprego?
Temos um emprego informal muito grande no país, as pessoas estão perdendo os seus direitos. A reforma previdenciária trouxe prejuízo enorme aos aposentados. É uma espécie de pequena destruição do país além de destruição das instituições. Nós temos um governo que não respeita o Congresso, não respeita a Suprema Corte, o Poder Judiciário nem o sindicato. É um presidente que não conversa com ninguém. Então, vou ter de voltar e trabalhar mais que 24h por dia para que a gente possa colocar o Brasil nos eixos. Fico triste porque o salário está menor, o salário do servidor público está menor, é preciso ter concurso para contratar mais gente e ter melhor atendimento.
Quais são seus planos para saúde?
É preciso colocar mais dinheiro na saúde, na educação, tudo isso está sendo desmontado. Parece-me que o presidente não tem apreço por educação, por cultura. Então, nós vamos ter de retomar, e espero que a sociedade possa participar ativamente disso. Vou voltar a retomar as conferências nacionais. Fiz 74 no meu mandato, para que a gente possa permitir que a sociedade defina quais políticas públicas boas para cada setor. Tudo isso vai ter de ser muito rápido, porque o Brasil não pode esperar. Eu tenho consciência de que muita gente fala que eu não deveria estar me candidatando, porque tive um mandato muito produtivo, mas eu estou voltando porque acredito que é possível reconstruir o Brasil.
Que propostas tem para o ensino fundamental?
Precisamos melhorar o ensino fundamental, colocar ensino de qualidade. Para isso, precisamos melhorar o salário dos professores e dos funcionários. Não adianta a gente querer comparar a escola privada com a escola pública, porque o professor ganha muito mais, e as condições de aula são muito melhores. No Brasil, a gente quer que os professores trabalhem com um salário de fome. Professores na periferia têm de saber se a criança está comendo ou está com algum problema em casa. Precisamos discutir a educação com mais seriedade. Estou convencido de que nós vamos fazer escolas de tempo integral e, para isso, vamos ter de mudar, inclusive, o tamanho das escolas e o jeito que são feitas. É preciso que as escolas tenham multifuncionalidade e possam ter lazer e cultura, para que as crianças sintam prazer em ir para a escola, acordem e não queiram perder a aula. Precisamos chegar a esse ponto para nos transformar em um país efetivamente com educação formal e universitária de qualidade.
E em relação ao ensino médio?
Criar um ensino médio profissionalizante para que o jovem saia do ensino médio com uma profissão para entrar no mercado de trabalho. Tudo isso a gente vai começar a fazer logo no começo e vai acontecendo ao longo do nosso mandato. Em política não tem mágica. Quando as pessoas veem que está acontecendo, elas começam a acreditar e a contribuir para permitir que as coisas aconteçam com mais facilidade. Tenho quatro anos da minha vida para dedicar a este país, eu não quero fracassar. Se eu ganhar as eleições, quero fazer um mandato exitoso e melhorar a vida do povo brasileiro, sobretudo a questão da educação, que é a coisa mais extraordinária. Tudo que a mãe quer para o filho é que ele seja formado e tenha uma profissão, é importante para que ele seja independente e possa ter um bom emprego no mercado de trabalho, criar a sua família e viver bem. É isso que precisamos e é isso que eu tenho como meta fazer neste país.
O que pretende fazer na política externa?
Vou imediatamente fazer reunião com a União Europeia, com os Estados Unidos, com a China, com os países da América do Sul, porque não é possível a gente viver em um país em que o presidente não conversa com ninguém. Ninguém o convida para viajar e ninguém quer vir aqui ao Brasil. O Brasil está isolado. Um país que não tem contencioso internacional com ninguém, o único contencioso é o Bolsonaro falando bobagem quanto aos países vizinhos, o que não é papel de um presidente.
*Estagiário sob a supervisão de Cida Barbosa
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