A ativista indígena Célia Xakriabá, que concorre a uma cadeira na Câmara dos Deputados pelo Psol de Minas Gerais, renunciou à doação de R$ 15 mil que sua campanha recebeu de Luciano Huck, apresentador da TV Globo. Outros R$ 20 mil, repassados por Candido Botelho Bracher, ex-presidente do Itaú Unibanco, também vão ser devolvidos.
Já Elisa, irmã do banqueiro, entregou R$ 60 mil à empreitada de Célia. Essa quantia, contudo, vai ser utilizada pela campanha, porque, para a equipe da candidata, a mulher não tem conexões com a gestão da instituição financeira.
Considerada a sucessora da correligionária Áurea Carolina, que não vai tentar renovar o mandato de deputada federal, Célia é uma das principais apostas do Psol no estado. Segundo a postulante ao Congresso Nacional, as doações de Huck e de Candido Bracher serão devolvidas por estarem em desacordo com os princípios do partido.
"A partir dos critérios estabelecidos pelo partido, serão devolvidos os recursos em desconformidade com a resolução política do Psol. No caso da doação de Luciano Huck, no valor de R$ 15 mil reais, já foi solicitada sua devolução, mesmo que ela não infrinja nenhuma lei eleitoral", explicou o staff de Célia, em nota enviada ontem (21/9) ao Estado de Minas.
A legenda que abriga a indígena veta repasses feitos por pessoas ligadas à administração de bancos. Assim, o dinheiro de Candido será devolvido. A doação de Elisa Bracher, por sua vez, foi interpretada sob ótica diferente "Apesar de ser da família, ela não tem qualquer relação com a direção ou gestão do banco. Suas relações de trabalho se dão em outras áreas".
A importância de Célia para o Psol pode ser vista na base de dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Isso porque a direção nacional da agremiação enviou mais de R$ 1,1 milhão à campanha dela. O grupo da indígena deposita fichas, também, em um financiamento coletivo que arrecadou R$ 11,5 mil.
Financiar campanhas é costume para Bracher e Hulk
As doações de Huck e dos Bracher para Célia Xakriabá aconteceram a reboque de uma série de repasses feitos por eles a outros concorrentes ao Legislativo Brasil afora. O apresentador já desembolsou R$ 120 mil por causa da eleição geral deste ano.
Na lista de agraciados com recursos de Huck, há, por exemplo, o ex-ministro da Cultura Marcelo Calero (PSD-RJ), que concorre a deputado federal, e o ex-vice-presidente da Câmara, Marcelo Ramos (PSD-AM), candidato à reeleição. Cada um deles recebeu R$ 15 mil, mesmo valor entregue à congressista Tabata Amaral (PSB-SP).
Além de Célia, Huck fez doação a pelo menos mais um candidato indígena: trata-se de Almir Suruí, do PDT de Rondônia, que ficou com R$ 5 mil para investir na busca por votos.
Sétimo maior doador do país, Candido Bracher aportou, até aqui, R$ 1,7 milhão em diversas campanhas eleitorais. O maior agraciado com as verbas é Vinicius Marchese (PSD-SP). Candidato a deputado federal, o pessedista recebeu R$ 133,3 mil do banqueiro. Ele cedeu, ainda, R$ 100 mil a Marcelo Freixo (PSB), que concorre ao governo do Rio, e R$ 50 mil ao ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta (União Brasil), candidato ao Senado Federal pelo Mato Grosso do Sul.
Segundo a Justiça Eleitoral, o topo do ranking de doadores a candidatos pertence a Rubens Ometto Silveira Mello. O bilionário, responsável por controlar o grupo sucroalcoleiro Cosan, gastou R$ 5,75 milhões com ajudas a campanhas.
O maior beneficiário da verba foi o PSD, cuja direção nacional recebeu R$ 2 milhões. O diretório do PP na Paraíba também ficou com porção relevante da contribuição de Ometto: R$ 1,5 milhão.
Célia é trunfo do Psol para formar 'bancada do cocar'
Como mostrou o EM em agosto, 177 indígenas se registraram rumo à eleição deste ano. O número representa 0,62% do total de candidaturas apresentadas à Justiça Eleitoral. Na Câmara dos Deputados, há Joenia Wapichana (Rede-RR), eleita em 2018. Ela quebrou hiato que vigorava desde 1982, quando Mário Juruna conseguiu assento pelo PDT do Rio de Janeiro.
Neste ano, além de Célia Xakriabá, as apostas estão em nomes como Sônia Guajajara (SP), que concorre pelo Psol. Em 2018, ela foi candidata a vice-presidente na chapa do correligionário Guilherme Boulos.
Segundo a equipe de Célia, o apoio a candidaturas indígenas está relacionado a uma "reparação".
"É preciso romper inúmeros obstáculos e garantir condições competitivas para um resultado vitorioso. É importante lembrar que não há nenhum tipo de reserva de recursos previstos em lei para as candidaturas indígenas, o que faz com que elas sejam colocadas como a de qualquer outro candidato ou candidata. Doar para uma candidatura indígena é sobre entender o racismo da ausência e a urgência em rompermos com esse ciclo, dando espaço e representatividade para esses povos", lê-se em trecho do comunicado enviado ao EM.