No penúltimo debate entre os presidenciáveis, realizado ontem conjuntamente por SBT, CNN e outros veículos de imprensa, o candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi o alvo de todos os adversários que disputam o Palácio do Planalto. Como não esteve presente, os rivais aproveitaram para pregar no
ex-presidente a pecha de corrupto e de não ter participado para não ser confrontado com as denúncias nos governos petistas. Mas isso não quer dizer que Jair Bolsonaro (PL) nadou de braçada: exceto por Padre Kelmon (PTB), que deixou claro que seria linha auxiliar do presidente, todos os demais fizeram cobranças sobre os erros e omissões do atual governo. Em matéria de ideias, o debate teve pouquíssimo: foi mais um ringue em que cada um aproveitou a chance para desqualificar o outro.
A senha dos ataques a Lula foi dada por Soraya Thronicke (União Brasil) ao comentar a ausência do petista — a todo tempo enfatizada pelo apresentador Carlos Nascimento. "Uma sabatina, um debate, é como uma entrevista de emprego. Você aí, na sua casa, contrataria um candidato que faltou à entrevista de emprego? Esse é o candidato Luiz Inácio Lula da Silva, que não merece o seu voto de maneira nenhuma", cutucou.
Mesmo com um tom de voz moduladamente ameno, Bolsonaro não fez por menos e referiu-se a Lula várias vezes como "presidiário". Ciro Gomes (PDT) chamou a atenção para a suposta empáfia do petista — que está à frente em todas as pesquisas de intenção de votos. "Lula está de salto alto, acha que já ganhou. Mas ele não veio porque não tem como explicar as promessas e denúncias de corrupção", cobrou. Simone Tebet (MDB) preferiu criticar a campanha do voto útil em favor do ex-presidente, que corre nas redes sociais. "Me espanta quem prega o voto útil fugir de um debate", lamentou.
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Apesar de os ataques a Lula permearem nas mais de duas horas de confronto, Bolsonaro também foi colocado contra a parede. Soraya respondeu agressivamente a uma provocação — quando disse que ela se elegeu por causa dele, em 2018 —, e disse que o presidente "traiu" as pautas com que se comprometeu, como o combate à corrupção. A senadora foi rechaçada por Bolsonaro, que a acusou — e também à Simone — de terem derrubado o veto dele ao Orçamento secreto.
A emedebista indignou-se e devolveu que o presidente não queria disponibilizar o Auxílio Emergencial no início da pandemia de covid-19. Acusou-o, ainda, de demorar a comprar a vacina contra a doença. Ciro engrossou as críticas afirmando que Bolsonaro teve uma "oportunidade de ouro" para acabar com a corrupção, mas deixou passar.
O presidente continuou contra as cordas e, mais uma vez, coube a Soraya expô-lo. "O que é, o que é? Tira remédio da Farmácia Popular, mas mantém a compra de Viagra? Não compra vacina para covid, mas distribui prótese peniana para seus amigos?", ironizou a senadora na pergunta dirigida a Felipe D'Ávila (Novo), que não deu sequência ao deboche.
Judiciário
A cobrança ao presidente veio também dos jornalistas. Foi questionado sobre os ataques ao Judiciário e, como resposta, disse que os magistrados "mais lúcidos" do Supremo Tribunal Federal (STF) são os que indicou, Nunes Marques e André Mendonça. Para o presidente, a corte faz "muita coisa errada" e se deixa envolver pelo que classifica de "ativismo judicial".
"A judicialização feita contra o Executivo é clara, quase toda semana tem algo contra o Executivo. Essa questão realmente é grave. O Supremo Tribunal tem que se preocupar basicamente com questões de constitucionalidade e deixar o governo ir para frente", salientou.
O STF continuou na berlinda quando Simone foi questionada por D'Ávila sobre a proposta de reajuste de 18% do salário dos ministros. A emedebista lembrou que há "33 milhões de pessoas com insegurança alimentar e passando fome" e qualificou o aumento no contra-cheque de "vergonhoso, afrontoso, imoral".
O candidato do Novo disse que, se eleito, vai "enquadrar" a Corte. Mais: que "o Supremo foi responsável por soltar Lula e deixar que um criminoso seja candidato" — de novo trazendo o petista para o centro das discussões.
Diante da falta de espaço para questões relacionadas às propostas dos candidatos — por opção deles próprios —, a certa altura o agronegócio foi razão de discussão. Sabendo que o setor é maciçamente apoiador de Bolsonaro, mas com ilhas favoráveis a Lula, Ciro fez um aceno.
"O agronegócio está livre para fazer o que quiser e bem entender? Claro que não. E o setor mais moderno e avançado do agronegócio já sabe que tem que produzir em bases sustentáveis. Temos que estimular o bom exemplo, que é generalizadamente a característica da maioria. Não tenha dúvida de que toda a qualquer perseguição ao agro é tiro no pé", observou.
A nota inusitada do debate foi a participação de Padre Kelmon. Em uma das primeiras intervenções, se alinhou com Bolsonaro. "Será que o presidente da República não fez nada de bom? Vocês só enxergam maldade, corrupção? Todos esses candidatos aqui atacando um só. Estou só observando a fala de cada um, cinco contra um. Mas, agora, são cinco contra dois porque nós somos candidatos de direita", reagiu.
Em outro momento, o religioso questionou Simone sobre a posição que tem sobre o aborto. Kelmon insinuou que o fato de a candidata ser feminista significava que era a favor da descriminalização da prática. Irritada, ela respondeu que feminismo não pode ser confundido como pauta da esquerda.
"Sou contra o aborto, porque sou católica e sou cristã. Isso não me faz menos feminista", respondeu. Como Kelmon continuou insistindo, Simone deu a cartada final. "Peço desculpas a você, católico, por ter lamentavelmente aqui um padre colocando palavra na boca de uma cidadã. Jamais me confessaria com o senhor."
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