ELEIÇÕES 2022

Dinastias mais longevas da política brasileira estão ameaçadas

Intrigas de família, jogos de poder e o avanço de poderosas forças adversárias põem em risco a existência de oligarquias e coalizões políticas, que guerreiam com todas as forças para manter o espaço de sobrevivência

Vinicius Doria
postado em 24/09/2022 03:55
 (crédito: Reprodução/Governo de São Paulo)
(crédito: Reprodução/Governo de São Paulo)

As dinastias mais longevas da política brasileira estão ameaçadas. A nove dias das eleições, disputas entre parentes, inimigos históricos e lideranças emergentes põem em risco a estabilidade de domínios que, até agora, mantinham-se fortes em torno de palácios tradicionais. Forças à esquerda e à direita aproveitam-se do cenário de desestabilização política para tentar expulsar das fortalezas os clãs que, há anos, controlam o poder em quatro dos estados mais influentes desta terra chamada Brasil.

São três os palácios sob cerco adversário: da Abolição, nas terras do Ceará; de Ondina, na mística Bahia; e dos Bandeirantes, sede do mais poderoso trono da Federação. Em Pernambuco, a ameaça vem de dentro do Palácio das Princesas: na disputa entre primos, a hegemonia do clã dominante está sendo desafiada por uma herdeira insurgente.

O Correio consultou mapas, conselheiros e oráculos para contar, em breve resumo, essa versão abrasileirada da guerra dos tronos.

Política Guerra dos Tronos
Política Guerra dos Tronos (foto: Valdo Virgo)

Desidratação dos Gomes

Nas terras de Irapuã, Iracema e Tupã, como cantou o velho menestrel, a Casa dos Gomes está sob ameaça. Há 16 anos, a oligarquia mantém hasteada nas torres do Palácio da Abolição o estandarte pedetista da Rosa Púrpura, em aliança com os proletários da Estrela Vermelha do PT.

Nesse período, o Ceará tornou-se vitrine para o sonho de poder de Ciro Gomes, que nunca se contentou com os domínios regionais. Ele tenta, neste ano, alcançar o trono nacional pela quinta vez, sempre ancorado no controle que a família detém no Ceará.

Agora, porém, aproveitando-se de um racha no coração do poder local, um certo Capitão Wagner (União Brasil) organizou uma frente de oposição conservadora e, avançando fortemente pela direita, intensifica o cerco a Fortaleza, a cidade-sede do trono cearense. Pelos magos das pesquisas de intenção de votos, a tomada do poder pela força emergente é uma possibilidade concreta.

Wagner escala pela direita as muralhas do Palácio da Abolição com 29% das intenções de voto, segundo o oráculo do Ipec, anunciado na última quinta-feira. No flanco esquerdo, estão as tropas lideradas por Elmano de Freitas, sob o estandarte dos ex-aliados da Estrela Vermelha, com 30%.

No alto da torre palaciana, vai ficando para trás o candidato ungido por Ciro Gomes, o ex-alcaide de Fortaleza Roberto Cláudio (PDT), que arregimentou 22% da preferência dos súditos, até agora. A batalha pela tomada do Abolição promete ser intensa até o dia 2, pois Wagner e Elmano estão tecnicamente empatados. O estado começa a refletir a polarização nacional entre o presidente Jair Bolsonaro e o petista Luiz Inácio Lula da Silva, além da desidratação de Ciro.

Os Magalhães contra-atacam

Nas místicas terras da Bahia, é o estandarte petista da Estrela Vermelha que tremula no alto das torres do Palácio de Ondina há 16 anos. Agora, esse poder está sendo confrontado pelo ex-alcaide de Salvador, sucessor de um poderoso líder do passado, que conquista cada vez mais súditos em sua marcha para retomar o controle do estado.

ACM Neto (União Brasil) herdou do avô, Antônio Carlos Magalhães, não apenas o nome, mas a ambição de comandar os rumos do estado e influenciar as decisões nacionais. O ex-prefeito está arregimentando antigas forças aliadas para marchar em direção ao palácio governamental e impedir que o atual mandatário, o governador Ruy Costa (PT), faça de Jerônimo Rodrigues (PT) seu sucessor.

De acordo com as últimas projeções, a vitória de ACM Neto talvez se estenda por mais de uma batalha. O oráculo do Ipec, consultado ontem, aponta a liderança de ACM Neto, com 47% — e chance de fechar a disputa ainda no primeiro turno — contra 32% de Jerônimo, que consegue reorganizar as linhas de defesa e tenta adiar a tomada do poder.

A princesa rebelde

Palco de guerras sangrentas, invasões estrangeiras e insurreições, Pernambuco assistiu, nos últimos anos, a um jogo de intrigas e disputas familiares pelo trono do Palácio das Princesas. À sombra do mítico líder Miguel Arraes — cuja imagem foi construída na defesa dos camponeses e na luta contra uma tirânica ditadura militar —, dois primos se digladiam pelo espólio político do avô, um dos fundadores do PSB.

Essa herança estava destinada a um dos netos de Arraes, Eduardo Campos, morto em acidente aéreo quando tentava alçar seu voo mais alto, a Presidência da República, em 2014. Ao filho dele, o jovem João Campos, foi dada a missão de conduzir os projetos políticos da família. Mas sua prima de segundo grau, Marília Arraes (Solidariedade), que não aceitara o poder dado a Eduardo, também rechaçou aliar-se a João.

Nestas eleições, Marília mostra-se disposta a tomar o Palácio das Princesas, enfrentando Danilo Cabral, nome apoiado pelo PSB do primo e pelo PT, partido do qual se desfiliou.

O oráculo do Ipec mostrou, na semana passada, que Marília lidera a marcha pelo poder com apoio de 33% dos eleitorado. A colocação de Cabral, com apenas 11% das intenções de votos, aponta para a derrota da Casa dos Campos em outubro. Outros três também se animaram para disputar o poder, e arregimentam, cada um, 11% do eleitorado, rigorosamente empatadas com Cabral: Raquel Lyra (PSDB), Miguel Coelho (União Brasil) e Anderson Ferreira (PL). O sobrenome Arraes, porém, ainda paira acima de todas as disputas.

Duas ameaças após 27 anos

Comandado há 27 anos pela Ordem Tucana do PSDB, o mais rico e poderoso dos reinos da Terra Brasilis está sob fogo cerrado de forças invasoras, tanto à esquerda quanto à direita. O Palácio dos Bandeirantes, cidadela até então inexpugnável do tucanato, resiste ao fogo de dois comandantes de forças antagônicas: Fernando Haddad, com o estandarte da Bandeira Vermelha e o apoio de Lula; e Tarcísio de Freitas, da emergente aliança conservadora-religiosa ligada ao poder central de Bolsonaro.

Enfraquecido pelas disputas internas, o tucanato se escora no nome do atual governador, Rodrigo Garcia, para manter intacta a cidadela de São Paulo. Os invasores, porém, estão cada vez mais perto das muralhas do Palácio dos Bandeirantes. E, se os oráculos se confirmarem, o pavilhão do PSDB poderá cair antes de Haddad e Tarcísio se digladiarem na batalha final.

As tropas do comandante Haddad, por enquanto, são as que mais força demonstram ter para derrubar o governo da Ordem Tucana. As pitonisas do Ipec, na consulta da última quinta-feira, mostram o candidato da Estrela Vermelha com 34% de chances de tomar o Palácio dos Bandeirantes, seguido pelas forças de Tarcísio, com 23%.

Mas, para Garcia, a guerra não está perdida: com 19% de apoio dos súditos do estado, o PSDB mantém erguidas as paliçadas para tentar barrar o ataque dos adversários e conta com os adeptos de sempre para defender o domínio do Palácio dos Bandeirantes.

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    Política Guerra dos Tronos Foto: Valdo Virgo
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