A agenda extra do presidente Jair Bolsonaro (PL) durante sua passagem por Nova York, nos Estados Unidos, na semana que vem, deverá ser marcada por reuniões bilaterais com presidentes de países que, juntos, somam apenas 0,75% das exportações brasileiras.
De acordo com o Ministério das Relações Exteriores (MRE), há previsão de que Bolsonaro se reúna com os presidentes de Polônia, Equador, Guatemala e Sérvia. Além da relativamente pequena relevância econômica para o Brasil, os quatro países têm, em comum, o fato de serem governados por líderes de direita e conservadores.
Bolsonaro deverá chegar a Nova York na segunda-feira (19/9) para participar da 77ª reunião da Assembleia-Geral da Organização das Nações Unidas (ONU). Antes, ele passará por Londres, no Reino Unido, onde irá ao funeral da rainha Elizabeth 2ª.
Como de praxe, Bolsonaro fará o discurso de abertura da reunião, previsto para a manhã de terça-feira (20/9). Tradicionalmente, os presidentes e chefes de Estado que participam da reunião aproveitam o evento para manter reuniões bilaterais com seus homólogos para debater pautas de interesse mútuo como temas políticos ou comerciais.
Neste ano, o que chamou atenção foi o tamanho da participação econômica que os quatro países com cujos líderes Bolsonaro irá se encontrar tem na balança comercial brasileira.
De acordo com dados do Ministério da Economia, as exportações brasileiras em 2021 somaram US$ 280,8 bilhões. Juntos, os quatros países importaram pouco mais de US$ 2,1 bilhões. Isso é o equivalente a 0,75% de tudo o que o Brasil exportou para o mundo inteiro.
No ranking dos principais importadores de produtos brasileiros, a Polônia fica em 49º lugar (US$ 902,5 milhões), seguida do Equador na 50ª (US$ 895,3 milhões), Guatemala na 63ª e Sérvia na 125ª posição.
A relevância diplomática desses países para o Brasil chama atenção especialmente na comparação com a agenda do ano passado, quando Bolsonaro se reuniu com o então primeiro-ministro britânico, Boris Johnson. Em 2021, o Reino Unido importou US$ 3,07 bilhões em produtos brasileiros e ficou na 21ª no ranking de compradores externos do país.
Agenda apertada e proximidade ideológica
O secretário de Assuntos Multilaterais Políticos, embaixador Paulino Franco de Carvalho Neto, justificou a ausência de reuniões bilaterais do presidente com líderes de países mais influentes no cenário internacional a dois fatores principais: a permanência curta de Bolsonaro em Nova York e a possibilidade de que ele venha a se encontrar com outros chefes de Estado em Londres, durante o funeral da rainha Elizabeth 2ª.
O embaixador também apontou o calendário eleitoral como um fator que limitou a agenda de Bolsonaro nos Estados Unidos.
"Ele (Bolsonaro) está em plena campanha eleitoral e isso não permite que ele fiquem muito tempo fora do país", afirmou o diplomata. Além dos presidentes desses quatro países, Bolsonaro também deverá se encontrar como secretário-geral da ONU, o português António Guterres.
Para o professor de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Guilherme Casarões, as reuniões previstas de Bolsonaro com os presidentes dos quatro países têm um forte viés ideológico.
"Esses quatro presidentes com quem ele vai se encontrar têm algo em comum: uma agenda conservadora. Eles são conservadores nos costumes e liberais na economia", explicou Casarões.
"A gente vê que esses presidentes estão alinhados com o perfil de Bolsonaro, mas diplomaticamente isso agrega pouco", afirmou o professor.
Na Polônia, o presidente é Andrezj Duda. Reeleito em 2020, ele é um político de direita e abertamente conservador.
Nos últimos anos, ele vem sendo criticado por organismos internacionais, inclusive a União Europeia (da qual o país faz parte), pela adoção de uma agenda contrária aos direitos da comunidade LGBTQIA+ e por realizar uma reforma do Poder Judiciário que teria diminuído a independência dos juízes e ministros da Suprema Corte da Polônia.
Durante a campanha à reeleição em 2020, ele chegou a afirmar que uma suposta "ideologia LGBT" seria pior que o comunismo. Bolsonaro e Duda se encontraram em 2021, durante a última Assembleia-Geral da ONU.
No Equador, o presidente é o ex-banqueiro Guillermo Lasso. Também de direita, Lasso se elegeu defendendo uma agenda conservadora, anticorrupção e prometendo reativar a economia equatoriana.
Ele venceu o candidato Andrés Arauz, apoiado pelo ex-presidente Rafael Correa, principal liderança de esquerda. Lasso é conhecido por ser contrário à descriminalização do aborto.
Em março deste ano, ele vetou parcialmente uma lei aprovada pelo Parlamento equatoriano que permitia o aborto até a 18ª semana de gestação para mulheres vítimas de estupro.
Após o veto, o limite temporal para o aborto nessas situações ficou em 12 semanas. Desde junho, Lasso vem enfrentando uma série de protestos liderados por movimentos indígenas e de trabalhadores que se manifestam contra a inflação e aumento do desemprego no país.
Em junho, ele chegou a decretar estado de exceção em partes do país. Desde então, entidades como a organização não-governamental Human Rights Watch vêm criticando o suposto uso excessivo da força na repressão da polícia contra os protestos.
Na Guatemala, o presidente é o líder de direita e conservador Alejandro Giammattei. Ele foi eleito em 2019.
Ex-chefe do sistema penitenciário do país, ele venceu as eleições prometendo acabar com a corrupção e endurecer o combate ao crime organizado no país. Ele também diz ser contra o aborto e defender a vida desde a concepção.
Giammattei também vem enfrentando protestos em seu país. Em março deste ano, por exemplo, mulheres protestaram pelas ruas do país contra um projeto de lei que previa penas de até 10 anos de prisão para quem se submetesse a um aborto.
Em um movimento que surpreendeu defensores dos direitos humanos, Giammattei anunciou que vetaria uma lei alegando que ela tinha "deficiências" e violaria a constituição do país.
Na Sérvia, o presidente é Aleksandar Vucic. Em abril, ele foi reeleito com 58% dos votos. Conservador, Vucic prometeu em sua campanha manter os laços políticos com a Rússia mesmo após o país invadir a Ucrânia.
Em agosto, após protestos pelas ruas da capital, Belgrado, Vucic anunciou que o governo iria proibir a realização de uma parada pan-europeia do orgulho LGBTQIA+. Ele justificou a decisão alegando que o país enfrenta ameaças de grupos de extrema-direita e tensões com o Kosovo. Entidades que defendem os direitos humanos afirmam que irão contestar a decisão judicialmente.
- Este texto foi publicado em https://www.bbc.com/portuguese/brasil-62922622
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