Diante das eleições mais tensas desde a redemocratização, o ministro Alexandre de Moraes, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), estabeleceu uma blindagem ainda mais robusta ao processo eleitoral e ao Judiciário brasileiro. A quantidade recorde de mesários voluntários já indica a rede de proteção em torno do sistema. Neste ano, o número quase dobrou em relação a 2018 — serão 830 mil participantes, aumento de 48%.
Ao todo, 1,7 milhão de mesários foram convocados para comparecer às seções eleitorais, neste ano. Entre eles, 52% foram nomeados pela Justiça Eleitoral, enquanto 48% se candidataram para atuar por vontade própria.
De acordo com o último relatório Justiça em Números, divulgado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) na última quinta-feira, a Justiça Eleitoral reúne uma força de trabalho de 31.251 pessoas, sendo 20.823 servidores, 7.608 auxiliares e 2.820 juízes. Os dados são relativos ao ano de 2021.
Segundo o documento, o investimento anual é de mais de 187 milhões apenas em tecnologia, o que corresponde a um terço do total. Além disso, o TSE conta com mais 2.278 pessoas em seu quadro, a um custo de R$ 130 milhões em informática. O orçamento da Justiça Eleitoral ultrapassa R$ 6 bilhões por ano.
Fernando Xavier, CEO da BuscaJuris, destaca que o investimento é fundamental para garantir a lisura do sistema de votação. "Existem recursos e muitas pessoas envolvidas para garantir que o processo eleitoral ocorra de forma segura. Em 2022, serão mais de 1,7 milhão de mesários trabalhando nas eleições. Existe uma preocupação grande com a segurança dos próprios candidatos também", observou.
No comando da Corte há menos de um mês, o ministro Alexandre de Moraes investiu na criação de núcleos de inteligência e tem reforçado as campanhas de proteção às urnas eletrônicas. A estrutura é uma das maiores montadas no país.
Várias medidas já foram aprovadas pelo TSE visando à segurança dos eleitores e das seções eleitorais nos dias de votação em primeiro e segundo turnos. Estão proibidos o porte de armas a menos de 100 metros dos locais de votação e a entrada, na cabine da urna eletrônica, com telefone celular.
Desde que foi eleito, o presidente Jair Bolsonaro (PL) se queixa de fraude nas eleições de 2018 — nunca comprovada — e que a chapa dele teria ganhado em primeiro turno contra Fernando Haddad (PT). O chefe do Executivo chegou a sugerir que as Forças Armadas fizessem uma apuração paralela nas eleições deste ano, causando, mais uma vez, atrito entre os Poderes. É esse clima de beligerância que o TSE quer conter, com a ajuda de outras instituições.
A rede de proteção começou a ser estruturada ainda na gestão do ministro Luís Roberto Barroso. Em setembro do ano passado, o magistrado nomeou uma comissão com o objetivo de aumentar a participação de especialistas, representantes da sociedade civil e instituições públicas na fiscalização e auditoria do processo eleitoral.
Temendo a repetição da onda de fake news vista do último pleito presidencial, o Judiciário também investiu criação de programas para educar a população a respeito do perigo das notícias falsas. Na gestão do ministro Edson Fachin (fevereiro a agosto de 2022), o TSE firmou e renovou parcerias com as principais mídias digitais, que passaram a defender com mais frequência a integridade do sistema publicamente.
Fontes ouvidas pelo Correio confirmaram que o tribunal tem um plano pronto para conduzir as eleições de outubro com o menor nível de turbulência possível, e para prevenir a Justiça em caso de cenários extremos. Bolsonaro já afirmou, em ocasiões passadas, que não iria aceitar o resultado do pleito, caso não lhe seja favorável.
O TSE também já tem engatilhadas reações e segurança jurídica em caso de ações de partidos com pedidos de impugnação da candidatura ou de cassação de chapa.
O consultor político Bruno Scobino, da Acrópole Relações Governamentais, ressalta que o Judiciário, ao lado do Executivo e do Legislativo, deve estar preparado para preservar o Estado Democrático de Direito. "Uma de suas responsabilidades é regular o que as outras esferas de poder político podem ou não fazer, com a finalidade de impedir que o Estado tome ações inconstitucionais ou, até mesmo, autocráticas", destacou.
Scobino citou o papel moderador dos tribunais superiores, que devem estar atentos a qualquer inconstitucionalidade ou abuso de poder. "Essa é a ação que o Judiciário deve cumprir quando achar necessário, assim como teorizado por Montesquieu, autor iluminista e pai da separação de Poderes", pontuou.
O cientista político André Rosa partilha do mesmo entendimento sobre o papel dos magistrados. "Deve-se assegurar que o Sistema Judiciário tenha poder para frear exorbitações tanto do Legislativo quanto do Executivo. Ou seja, precisa ter uma última chancela ante ações autoritárias", reiterou.
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Mulheres no comando
Os personagens que estarão à frente da Justiça durante o pleito traçam estratégias para proteger a lisura do sistema de votação. Além de Moraes à frente do TSE, o Supremo Tribunal Federal (STF) vai ser chefiado pela ministra Rosa Weber, a partir do dia 12 de setembro.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) também tem um nome que ficará à frente da Corte durante as eleições. Maria Thereza de Assis Moura foi escolhida para ocupar o cargo no biênio 2022/2024. Ela é a segunda mulher a presidir o STJ na história. Luis Felipe Salomão foi designado para atuar como corregedor Nacional de Justiça, e o ministro Og Fernandes é o vice-presidente.
O TSE, tribunal máximo para as questões relacionadas às eleições, conta com sete ministros efetivos, sendo três oriundos do STF; dois escolhidos dentre os membros do STJ; e dois juristas. Atualmente, a Corte também tem cinco magistrados substitutos, estabelecidos pelos os mesmos critérios (confira no quadro acima).
Os magistrados têm lidado com uma guerra jurídica entre os candidatos. Desde o início da campanha, a Corte passou a receber inúmeros pedidos sobre supostas irregularidades dos presidenciáveis, principalmente, a respeito do comportamento nas redes sociais. São alegadas ofensas à honra, desinformação e propagandas irregulares.
Um dos casos de maior repercussão foi o da primeira-dama Michelle Bolsonaro. A ministra Maria Claudia Bucchianeri suspendeu, na semana passada, a exibição do comercial eleitoral do presidente no qual a mulher do candidato fala sobre a transposição do Rio São Francisco por 30 segundos. O argumento foi que a aparição extrapolou o limite de 25% do tempo total destinado a apoiador em propaganda eleitoral gratuita.
O TSE também determinou a remoção de uma publicação do Partido da Causa Operária (PCO) que associava a candidata à presidência Simone Tebet (MDB) à morte de indígenas.
A Corte ainda negou um pedido da coligação do presidenciável Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para a remoção de vídeos do TikTok e do Facebook de bolsonaristas. A defesa do petista alegou que o conteúdo tem desinformação para "manipular a opinião pública".
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