Na avaliação de especialistas, o presidenciável do PDT, Ciro Gomes, adotou um tom moderado, na entrevista ao Jornal Nacional, que foge aos seus padrões, assim como fez o presidente Jair Bolsonaro (PL) na sabatina de segunda-feira também no telejornal.
Para o cientista político André Rosa, Ciro está em uma situação difícil agora. Consideravelmente atrás dos dois líderes — aparece em terceiro lugar nas pesquisas, com 7% das intenções de voto —, ele tem como única opção continuar nos ataques aos rivais para tentar crescer. Porém, na visão do especialista, o maior desafio do pedetista não é a sua estratégia, mas, sim, a presença do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no páreo.
Já em relação às propostas concretas do programa de Ciro, o cientista político ressaltou que o eleitor brasileiro não costuma ser pautado tanto pelas medidas a serem tomadas em um próximo governo, mas pela identificação com a figura de quem está concorrendo.
"O eleitor não se guia por propostas. Senão, bastaria uma proposta mirabolante para virar uma campanha", disse André Rosa, que também viu a moderação de Ciro na entrevista como um sinal de "falta de direcionamento político" por parte de sua equipe.
Na análise de Publio Madrugado, sócio da Distrito Relações Governamentais, o candidato poderia focar em pautas mais próximas e de maior entendimento da população, como o auxílio para pessoas em situação de vulnerabilidade. "Ele tem um assunto que está em voga, que é um auxílio de R$ 1 mil, que foi um ponto positivo. Acabou mudando de assunto muito rápido. Deveria continuar com isso, até por conta da questão eleitoreira do Bolsonaro, tem o Lula que diz que o projeto é do PT. E é um tema que as pessoas entendem mais facilmente. Mas ele teve dificuldade de se conectar com o eleitor, passou a falar rebuscado e jogar muita informação, o que gera uma dispersão no eleitor."
O especialista disse ainda que Ciro foi bem em termos de empatia, pois, diferentemente de outras aparições públicas, não demonstrou agressividade. "Estava à vontade e de bom humor, muito diferente do Ciro Gomes com aspecto mais encrenqueiro que ele costuma ser. Falou algumas coisas de Lula e Bolsonaro, mas dentro do que estava dizendo e de forma muito tranquila. Isso faz muita diferença", avaliou. "No geral, acho que ele foi muito bem e é capaz de ganhar alguns votos."
O professor de ciência política Valdir Pucci classificou a sabatina como positiva de maneira geral, mas alertou que o presidenciável não explicou como pretendia convencer o Parlamento a apoiar os projetos de seu governo.
"Ele propôs uma espécie de pacto nacional. Por exemplo, disse que convenceria o Congresso a apoiar as medidas dele, como taxação de grandes fortunas. Entretanto, esse processo de convencimento do Congresso não ficou claro. Ou seja, ele apenas usou a retórica de que a proposta é boa e, por isso, deve ser seguida pelo Congresso. Nós já sabemos que no Brasil isso não funciona tão linearmente, não basta apenas que possa ser boa para haver o convencimento dos parlamentares."
Pucci também manifestou preocupação com a ideia de Ciro sobre estabelecer plebiscitos programáticos, caso o Congresso não compre o projeto defendido pelo governo.
"Preocupa-me a possibilidade que ele cita de, caso o Congresso não o apoie em algum projeto, recorrer a plebiscitos. Os plebiscitos não são usados dessa forma, não são usados para dirimir conflitos entre o Executivo e o Legislativo", destacou. "Estados Unidos e Europa não utilizam plebiscito como forma de dirimir conflitos entre os poderes, mas, sim, para ouvir a população. Depois, o próprio Congresso toma as decisões", acrescentou.