Pela quarta vez na corrida pela Presidência da República, o candidato Ciro Gomes (PDT) apresentou aos eleitores que assistiam a entrevista dele no Jornal Nacional, nesta terça-feira (23/8), um leque de propostas que, segundo ele, vai “projetar o Brasil” para alcançar patamares sociais e econômicos que resultem em uma qualidade de vida comparada a de Portugal em até 30 anos.
Sem falar no termo “nova política”, usado em exaustão em 2018 pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), o pedetista prometeu aos eleitores um modelo diferente de governança democrática sem o alinhamento ao Centrão e com participação popular; um programa fixo de transferência de renda de R$ 1 mil e a instituição de um taxa para grandes fortunas.
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— Correio Braziliense (@correio) August 23, 2022
Conhecido por ser um candidato “sem papas nas línguas”, Ciro assumiu um tom sereno. Em 40 minutos de entrevistas, fez poucas críticas aos adversários à frente nas pesquisas, Lula (PT) e Bolsonaro (PL), a quem tem sido o alvo diário do pedetista, que aparece em terceiro lugar nos levantamentos de intenções de voto.
A postura foi, inclusive, questionada por Renata Vasconcellos, que classificou algumas falas como ofensivas. “O senhor tem criticado o clima de polarização entre os candidatos que estão à frente das pesquisas, mas o senhor tem se referido a eles em termos bastante duros, eu diria até em alguns casos ofensivos. É com esse discurso que o senhor pretende unir o país?”, pergunta a jornalista.
Ciro se esquivou da resposta sobre as falas contundentes e disse que uniria o Brasil “ao redor de um projeto”, que é “a maior grave crise” vivida na história, com fome e economia. A jornalista volta a questioná-lo se o discurso dele não agrava a polarização. O pedetista diz, então, que levará em consideração a fala de Renata para reavaliar o estilo de discurso adotado por ele e que a cultura do nordeste é “palavrosa”, com a qual o restante do país não está acostumada.
“Eu venho de uma tradição do Nordeste, nossa cultura política é palavrosa, digamos assim, às vezes no Sul e no Sudeste as pessoas não entendem bem. Não me custa nada rever certos temas, especialmente na proporção de que meu sonho é reconciliar o país”, apaziguou.
No entanto, ele não deixou de falar do governo de Bolsonaro e da visão do Partido dos Trabalhadores, de Lula. O candidato chegou a afirmar que o modelo político da Venezuela é replicado pela sigla brasileira.
As críticas a Lula, inclusive, são inéditas nas falas do candidato no Jornal Nacional. Em 2018, quando se sentou à frente de William Bonner e Renata Vasconcellos, Ciro lamentou a então prisão do petista, a quem se referiu como “o maior líder popular do país. “A população mais pobre sentiu na pele as consequências de um bom governo”, afirmou naquele ano.
Ciro ainda afirmou que pretende ter “pulso firme” com infratores das legislações ambientais e afirmou que o enfrentamento das facções criminosas não serão enfrentadas localmente, mas sim por um modelo de segurança pública federal.
Veja abaixo os 5 pontos principais da entrevista de Ciro:
1) Reconciliar o Brasil
O candidato afirmou que o projeto de governo dele é reconciliar o Brasil e resolver o cenário da "mais grave crise” da história do país, causada pela fome. Para isso, Ciro afirma que irá cortar os privilégios criados para acúmulo de renda e criticou a corrupção.
“A corrupção é feita por pessoas, e o desastre econômico e privilégios criados é o que faz com que o Brasil tenha cinco pessoas acumulando a renda das 100 milhões mais pobres e da classe média", afirmou, dizendo que é importante, na gestão, olhar para o futuro.
“Trinta e três milhões de pessoas estão com fome e 120 milhões não fizeram as três refeições hoje. E determinados grupos políticos são responsáveis por essa tragédia. Eu acho, francamente, que a maior ameaça à democracia é o fracasso dela na vida do povo, mas vou me esforçar para unir e reconciliar o Brasil', disse o candidato.
O candidato afirmou que a crise veio da união do governo Bolsonaro e dos governos do PT. "A ciência da insanidade é você repetir as mesmas coisas e buscar resultado diferente", continuou o candidato. "Em 2018, eu estava tentando advertir sobre a promessa enganosa do Bolsonaro para repudiar a corrupção generalizada e o colapso gravíssimo causado pelo governo do PT”, disse.
2) Mudança no modelo de governança política e comparação de PT com política da Venezuela
Questionado sobre a dificuldade que teve em formar alianças nacionais em torno da sua candidatura, o presidenciável disse que irá mudar o modelo de governança política instaurado na redemocratização e que trouxe caos para os presidentes em todos os anos de 1989 até aqui.
“O Collor governou com esse modelo e foi caçado. O Fernando Henrique e o PSDB nunca mais ganharam uma eleição nacional com esse modelo. O Lula foi parar na prisão. Esse modelo é o que se convencionou chamar de presidencialismo de coalizão, na expressão elegante de FHC, ou na adesão vexaminosa e corrupta ao Centrão”, explicou.
“A questão é a gente chegar à conclusão de que esse modelo é a certeza de uma crise eterna”, afirmou. Para isso, Ciro diz que pretende dialogar com o Congresso Nacional e, em casos de impasse, irá convocar a população para decidir a questão por voto, no que chamamos de plebiscito.
“O fato é que o plebiscito tem sido usado por líderes populistas, especialmente na América Latina, como um instrumento para esvaziar o Congresso, o Poder Legislativo, criando crises institucionais graves”, inicia Renata Vasconcellos, que media a entrevista ao lado de William Bonner.
“Esse modelo de democracia direta pode colocar em cheque a nossa democracia representativa. Como o senhor pode evitar isso?”, pergunta. Ciro é enfático ao dizer que se espelha nos modelos de plebiscitos da Europa e dos Estados Unidos e menos para o país sul-americano.
“Eu faço isso olhando mais para a Europa e os Estados Unidos do que para a Venezuela. Eu acho o regime da Venezuela abominável. É muito clara a minha distinção com esse populismo sul-americano que infelizmente o PT replica aqui. Ortega na Nicarágua, eu acho tudo isso trágico”, declarou.
Saiba Mais
O candidato do PDT afirma que a ideia dele é fazer “com que as eleições sejam um plebiscito programático”. “Persistindo o impasse, é ao Congresso que interessa chamar a população para deslindar esse impasse. Se persistir o impasse, vamos pedir ao povo que vote”, diz.
3) Pulso firme para infratores ambientais e crítica ao governo Bolsonaro
O próximo presidente da República irá se deparar com um país com urgências ambientais e acordos internacionais de preservação de florestas e biomas a cumprir. Para o candidato à Presidência Ciro Gomes (PDT), a principal forma de retomar o controle das políticas ambientais e fazer com que as legislações existentes sejam respeitadas é punir os infratores. Em um eventual governo dele, ele afirma que "a algema vai voltar a funcionar".
"Sabe onde estão desflorestando? Unidades de conservação. Sabe onde estão invadindo? Reservas indígenas já pactuadas. Sabe onde é que estão destruindo recursos hídricos, nascentes? Em áreas que já estão protegidas pelo Código Florestal. Nesses casos, o que falta mesmo é uma mão firme, e a algema vai voltar a funcionar no primeiro dia do meu governo. Disso ninguém duvide", pontuou.
O presidenciável afirma conhecer as situações de infração ambiental, como garimpo ilegal e pesca predatória no Norte do país, e que é processado pelo ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, por ter afirmado que a "extenso domínio pelo narcotráfico, desfloramento, pesca e caça ilegais, é um processo de holding de crimes que não ocorreria sem a conivência ou a emissão das Forças Armadas".
4) Transferência de renda fixa de R$ 1 mil
O candidato também defendeu uma das principais propostas de seu programa de governo, a criação de um imposto para grandes fortunas, ao qual atribui a possibilidade de arrecadar o suficiente para financiar um programa de renda básica universal de R$ 1 mil. A proposta é taxar fortunas acima de R$ 20 milhões.
"Essas pessoas vão dizer que isso é ruim, que isso vai trazer fuga de capital. Se a alíquota fosse alta, sim, mas eu vou fazer uma alíquota calibrada", afirmou o candidato. "Cada super rico vai pagar a vida digna de 821 mil brasileiros mais pobres", disse Ciro. "Eu vou energizar a política brasileira, porque a crise brasileira está instalada e tem 30 anos."
5) Federalização de alguns pontos da segurança pública
Ciro aposta na federalização de algumas “figuras penais” ou postos de chefia da segurança pública. “O enfrentamento das facções criminosas que hoje domina a periferia de todas as grandes cidades brasileiras não serão enfrentadas localmente. Por circunstância que a gente pode entender, quem conhece a intimidade do Brasil. O policial é um trabalhador cuja família mora na periferia e se ele não acertar um pacto de sobrevivência dele e da família, naquele local dominado pelo terrorismo, ele não vai conseguir sobreviver”, diz.
Para o pedetista, a solução é um combate externo e capacitado, composto por núcleos de inteligência e tecnologia, mas com a união dos atores responsáveis pelas diferentes forças. “Quantas vezes eu ouvi nos governos que eu tive perto que segurança é problema dos estados. Se o governo federal não assumir pra si a tarefa inteirinha de investigar, prender, fazer a comunicação ao Ministério Público, julgar e aprisionar, isolando a comunicação das cabeças das organizações criminosas, nenhum estado será capaz de resolver isso”, detalha.
Ele ainda afirma que o plano é destinado para facções criminosas, milícias, narcotráfico, contrabando de armas, lavagem de dinheiro e crimes de colarinho branco da política passarão a ser “integralmente federais a partir da investigação até o segmento penitenciário”.
Sabatina JN
Ciro é o segundo convidado da série de entrevistas promovida pelo telejornal com os presidenciáveis com melhor desempenho na pesquisa Datafolha de 28 de julho. A ordem das sabatinas, que duram 40 minutos, foi estabelecida por meio de sorteio.
O presidente Jair Bolsonaro (PL) abriu a série na segunda-feira (22/8). Depois de Ciro, William Bonner e Renata Vasconcellos entrevistam Lula (PT), na quinta (25/8), e Simone Tebet (MDB), na sexta (26/8). André Janones (Avante) seria o quinto candidato a participar da série, mas retirou a candidatura para apoiar Lula no primeiro turno.
Colaborou Raphael Felice e Victor Correia
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