Eleições 2022

Bolsonaro ataca STF e desqualifica carta em defesa da democracia

Presidente critica Luiz Fux, considera inquéritos de Alexandre de Moraes uma "enganação" e chama Luís Barroso de "criminoso". Considera, ainda, "cara de pau" e "sem caráter" quem assinou o manifesto da USP

Ingrid Soares
Luana Patriolino
postado em 03/08/2022 05:59
 (crédito: ED ALVES/CB/D.A.Press)
(crédito: ED ALVES/CB/D.A.Press)

A dois meses da eleição, o governo de Jair Bolsonaro mantém em alto tom as investidas contra o sistema eleitoral. Os ataques mais agressivos partiram do chefe do Palácio do Planalto. Em entrevista a uma rádio, Bolsonaro desqualificou os signatários da Carta pela Democracia, documento organizado pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. O presidente disparou, ainda e mais uma vez, impropérios contra ministros do Supremo Tribunal Federal.

Em uma ação paralela, o ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, encaminhou ao Tribunal Superior Eleitoral um pedido, em caráter “urgentíssimo”, para acessar os códigos-fontes das urnas eletrônicas. Essas informações estão disponíveis desde outubro de 2021, mas o TSE atendeu à requisição de Nogueira. Militares devem inspecionar esses códigos hoje, em um ambiente controlado da corte eleitoral.

Além de reiterar os ataques às urnas eletrônicas, o presidente Bolsonaro criticou o ministro Luiz Fux, presidente do Supremo Tribunal Federal. Na segunda-feira, ao comandar a sessão de abertura do segundo semestre no Judiciário, Fux fez um apelo pelo respeito e pelo diálogo nas eleições. Reafirmou, ainda, a confiança no sistema eleitoral.

Na entrevista à Rádio Guaíba, Bolsonaro afirmou que Fux deveria ser investigado em inquérito. O chefe do Executivo também voltou a atacar o ministro Alexandre de Moraes.

“Que maravilha de sistema esse que ninguém quer, a não ser Bangladesh, Butão? Venezuela, também parece que usa esse negócio [urna eletrônica]. Com todo o respeito ao Fux, de vez em quando nós trocamos algumas palavras aqui, ele é chefe de Poder”, disse Bolsonaro.

Segundo o presidente da República, Fux “deveria estar respondendo processo lá no inquérito do Alexandre de Moraes, se fosse um inquérito sério e não essa mentira, essa enganação que são esses inquéritos do Alexandre de Moraes”.

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) contesta a alegação sobre o uso do sistema eletrônico de votação em outros países. Informa que, segundo o Instituto Internacional para a Democracia e a Assistência Social (IDEA Internacional), 23 países usam urnas com tecnologia eletrônica para eleições gerais e outros 18 as utilizam em pleitos regionais. Entre os países estão o Canadá, a Índia e a França, além dos Estados Unidos, que têm urnas eletrônicas em alguns estados.

Bolsonaro foi além nos ataques à Justiça. Disse que o ministro do STF Luís Roberto Barroso interferiu na votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do voto impresso. “No ano passado o Congresso ia aprovar o voto impresso numa PEC. O que o Barroso fez? Ele era presidente do TSE. Foi dentro do Parlamento, nem tentou fazer escondido, foi para dentro do Parlamento, se reuniu com uma dezena de líderes e, no dia seguinte, vários líderes trocaram os integrantes da comissão de modo que eles votaram contra a PEC do voto impresso. É interferência direta. É uma interferência política, isso é um crime previsto na Constituição. O Barroso é um criminoso. Barroso, tu é um mentiroso, um mentiroso”, atacou Bolsonaro.

Barroso respondeu, por meio das redes sociais. “Mentir precisa voltar a ser errado de novo. Compareci à Câmara dos Deputados, como presidente do TSE [Tribunal Superior Eleitoral], para debater o voto impresso, atendendo a três convites oficiais. E foi a própria Câmara que derrotou a proposta de retrocesso. Mas sempre haverá maus perdedores”, escreveu o ministro.

Apesar das críticas ao sistema eleitoral, o presidente afirmou que não tem pretensões golpistas. “Ninguém quer dar golpe, vai ter eleição. Mas queremos transparência”, exigiu.

Ainda assim, Bolsonaro desqualificou iniciativas da sociedade civil. Chamou de “cara de pau” e “sem caráter” os signatários da Carta pela Democracia, organizada pela Universidade de São Paulo (USP) e que será lida no dia 11. O texto reúne juristas, banqueiros, empresários e civis, e ultrapassa 600 mil assinaturas.

“Esse pessoal que assina esse manifesto é cara de pau, sem caráter, não vou falar outros adjetivos, porque sou uma pessoa bastante educada”, atacou o presidente.

O presidente alegou que o manifesto é apoiado por banqueiros porque eles teriam perdido cerca de R$ 20 bilhões de receita por causa do Pix. Chamou artistas de “desmamados” da Lei Rouanet. “(Assinaram a carta) artistas que foram desmamados na Lei Rouanet. (...) Olha os perfis dos políticos. Só no Brasil gente do partido comunista defende democracia”, concluiu.

Militares no TSE

Representantes das Forças Armadas devem ir ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), hoje, para acessar o código-fonte das urnas eletrônicas. A vistoria ocorre após o ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, enviar um ofício “urgentíssimo” ao ministro Edson Fachin, presidente da Corte, solicitando acesso aos dados.

No entanto, os dados solicitados com urgência estão disponíveis desde outubro de 2021. À época, o TSE permitiu o acesso a qualquer entidade fiscalizadora, incluindo militares, o Ministério Público, universidades, peritos, Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), partidos políticos e outros.

A ida dos militares deve ocorrer entre 10h e 18h. A fiscalização dos códigos ocorre em ambiente controlado, sem acesso à internet. Segundo o TSE, é proibido qualquer registro ou gravação de áudio e vídeo e retirar, sem autorização, qualquer elemento dos sistemas.

“Solicito a Vossa Excelência a disponibilização dos códigos-fontes dos sistemas eleitorais, mais especificamente do Sistema de Apuração (SA), do Sistema de Votação (Vota), do Sistema de Logs de aplicações SA e Vota e do Sistema de Totalização (SisTot), que serão utilizados no processo eleitoral de 2022”, escreveu o general no documento.

O Executivo e o Judiciário têm acumulado atritos a respeito do papel das Forças Armadas nas eleições deste ano. Durante 26 anos, não houve nenhum questionamento dos militares ao sistema eleitoral brasileiro.

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