Em nova tentativa de desacreditar a lisura do processo eleitoral brasileiro, o presidente Jair Bolsonaro (PL) se reuniu, ontem, com dezenas de embaixadores, no Palácio da Alvorada. À plateia, o chefe do Executivo se valeu de um Power Point para reiterar suspeitas contra as urnas eletrônicas, já desmentidas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), e criticar ministros da Corte e do Supremo Tribunal Federal (STF). O presidente do TSE, Edson Fachin, rebateu afirmando que "é hora de dizer um basta à desinformação e ao populismo autoritário".
O quórum qualificado estava esvaziado, pois os maiores parceiros comerciais do Brasil — China, Estados Unidos, União Europeia e Argentina não tinham diplomatas presentes na reunião. As embaixadas da China e da Argentina sequer foram convidadas para o encontro, conforme informou o jornal O Globo. Já as embaixadas dos EUA — que ainda não tem um representante no país — e a da UE enviaram encarregados de negócios. Por sua vez, o Itamaraty não participou da organização do evento. O Palácio do Planalto foi o responsável por tudo.
No encontro, Bolsonaro retomou a narrativa sobre o inquérito aberto pela Polícia Federal em 2018, após ser acionada pelo TSE. A motivação foi a suposta invasão de um hacker ao sistema e o acesso a documentos sigilosos da Corte. As investigações mostram que foram adotadas diferentes diligências pela Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal para a apuração do caso, mas não há conclusão ou suspeita de que as urnas eletrônicas tenham sido comprometidas. Desde o início do voto eletrônico no Brasil, em 1996, nenhum caso de fraude foi identificado.
"Quero me basear exclusivamente no inquérito da PF que foi aberto após o segundo turno das eleições de 2018, onde um hacker falou que tinha havido fraude por ocasião das eleições. Falou que ele e o grupo dele tinham invadido o TSE", afirmou Bolsonaro. "Tudo começa na denúncia onde o hacker diz claramente que ele teve acesso a tudo no TSE. Disse que obteve acesso aos milhares de códigos-fontes, que teve acesso à senha de um ministro do TSE, bem como de outras autoridades. Várias senhas ele conseguiu."
Ele relatou que, segundo o TSE, os hackers ficaram por oito meses dentro dos computadores. "Com código-fonte, senhas — muito à vontade dentro do TSE. E (a Polícia Federal) diz, ao longo do inquérito, que eles poderiam alterar nomes de candidatos, tirar voto de um e mandar para o outro. O invasor teve acesso a toda a documentação do TSE, toda base de dados por oito meses. É uma coisa que, com todo respeito, eu sou o presidente do Brasil e fico envergonhado de falar isso daí."
O chefe do Executivo repetiu críticas a ministros do TSE e do Supremo, afirmando que Luís Roberto Barroso e Edson Fachin "começaram a andar pelo mundo atacando-o" e que o atual presidente da Corte eleitoral foi o responsável por "soltar Lula".
"Quando se fala em eleições, vem à nossa cabeça transparência. E o senhor Barroso e o senhor Edson Fachin começaram a andar pelo mundo me criticando, como se eu estivesse preparando um golpe. É exatamente o contrário o que está acontecendo", argumentou.
Lula
Líder das pesquisas de intenção de voto, Lula também foi alvo. Segundo o presidente, o petista sofre forte rejeição. "Agora, pessoas que devem favores a ele não querem um sistema eleitoral transparente. Pregam o tempo todo que, imediatamente após anunciar o resultado das eleições, os respectivos chefes de estado dos senhores devem reconhecer imediatamente o resultado das eleições."
Bolsonaro também disse acreditar que as eleições municipais de 2020 não poderiam ter sido realizadas. "A PF concluiu pela total falta de colaboração do TSE para com a apuração do que os hackers tinham feito ou não de 2018. E, repito, até hoje esse inquérito não foi concluído. Entendo que não poderíamos ter tido eleições em 2020 sem apuração", acrescentou.
O presidente deu a entender que a reunião foi uma "resposta" a Fachin. Recentemente, a Corte Eleitoral promoveu um encontro com representantes das embaixadas para mostrar como funcionam as urnas eletrônicas.
Convidado para a reunião de ontem com diplomatas, Fachin declinou, pelo "dever de imparcialidade", por conta do cargo que ocupa. Em ofício da Corte, é citado que a instituição "julga a legalidade das acoes dos pre-candidatos ou candidatos durante o pleito deste ano".
Chefes dos tribunais superiores também recusaram o convite, à exceção do general do Exército Lúcio Mário de Barros Góes, presidente do Superior Tribunal Militar (STM).