Após a convenção nacional de quinta-feira, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é oficialmente candidato à Presidência da República. O ex-governador Geraldo Alckmin também foi referendado por PT, PV e PCdoB, mas ainda precisa ser oficializado candidato a vice-presidente pelo seu partido, o PSB, em convenção na próxima sexta-feira. Com a finalização do plano de governo, nas próximas semanas, ficará mais claro qual será realmente o discurso que o petista adotará até outubro. Especialistas, porém, não esperam um Lula diferente do de 2002.
O ex-presidente deixou de lado sua própria convenção para manter a agenda de dois dias em Pernambuco, seu estado natal. O gesto é representativo da estratégia dele, que acredita ser o momento de estar junto ao povo — e articulando os palanques problemáticos que ainda restam — em vez de cumprir ritos protocolares junto aos partidos que já o apoiam.
Apesar da pré-campanha feita desde o início do ano, as próximas semanas devem trazer uma consolidação maior do que esperar em relação a Lula. Na última quinta, mesmo dia da convenção, foi prazo final para inserir sugestões na plataforma colaborativa do plano de governo do ex-presidente. Agora, os sete partidos coligados — PT, PV, PCdoB, PSB, PSol, Rede e Solidariedade — têm até 15 de agosto para finalizar o plano de governo e entregá-lo ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) junto com o registro da candidatura.
"A coleta das sugestões populares é a primeira etapa do processo. Com o fim do prazo de contribuições, todas as propostas serão sistematizadas e entregues à Comissão de Redação do Programa de Governo do Movimento Vamos Juntos Pelo Brasil. Por fim, elas serão organizadas e entregues às equipes de transição e dos futuros ministérios", diz nota divulgada pela campanha presidencial.
Após a consolidação do programa, será possível entender realmente o discurso de Lula daqui até as eleições de outubro. Até agora, há uma divergência entre o que ele prega em suas falas públicas e o que é conversado pela equipe do plano de governo. Em público, o petista defende fervorosamente medidas como a revogação da reforma trabalhista, o que provoca críticas.
Na quinta-feira, no primeiro ato público como candidato, em Olinda (PE), Lula voltou ao tema: "'Ah, vamos acabar com a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho). Vamos fazer uma reforma trabalhista que vai ter muito mais emprego, porque se não tiver carteira assinada vai ter muito mais emprego'. Que emprego? Emprego intermitente? Emprego sem registro em carteira?", criticou.
Moderação
Nos bastidores, porém, a articulação é moderada. O grupo responsável por criar o plano de governo é formado por dois representantes de cada um dos sete partidos da coligação e é liderado pelo petista Aloizio Mercadante. Porém, os partidos mais ao centro, especialmente o PSB e o Solidariedade, pressionam para que a reforma não seja revogada. A mesma coisa ocorre com o teto de gastos, frequentemente atacado nos discursos petistas.
Internamente, Lula já admitiu abrandar seu plano de governo. O meio-termo é alterar a reforma sem destruí-la por completo, regulamentando, por exemplo, trabalhadores por aplicativo.
De forma resumida, o programa que será finalizado nas próximas semanas deve ser muito mais moderado do que as medidas defendidas em público pelo ex-presidente. Representantes dos partidos aliados à chapa foram, inclusive, surpreendidos pela disposição do PT em negociar. Até o momento, pelo menos, eles se dizem satisfeitos com as pautas que incluíram nas diretrizes iniciais do plano.
Na avaliação do cientista político André Rosa, a finalização do plano de governo trará uma clareza melhor do que ele promete na realidade, em vez de apenas nos seus discursos. Para o especialista, radicalizar o discurso com medidas controversas, caso da reforma trabalhista, pode ser negativo.
"De fato, no campo econômico, houve muitos avanços com o governo (Michel) Temer e (Jair) Bolsonaro. Hoje, é muito mais fácil abrir empresa, conseguir crédito, e isso facilitou para o pequeno empresário, que é a maior parte do PIB (Produto Interno Bruto)", destacou. "Falar que vai revogar a reforma trabalhista é meio complicado. Se revoga a reforma, volta a burocracia. Não se tem na opinião pública algo que traga esse debate para a agenda. Ele está falando muito mais para a área ideológica do que para a própria massa de eleitores."
Na avaliação de Luciana Santana, professora de ciência política da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), o ex-presidente não fará uma repaginada. "Engana-se quem acha que Lula vai ser diferente, mais do que em 2002, quando se aliou a José Alencar, do PL — ironicamente, o partido de Bolsonaro agora —, sinalizando um pacto entre as elites. Ele faz o mesmo pacto agora, mas com uma roupagem diferente, com Alckmin, mais moderado", disse. "Para vencer as eleições, ele precisa convencer um eleitorado mais amplo, por isso adota estratégias, às vezes, controversas. Para ele decidir qual posição vai tomar, depende das composições, das alianças que vai formar no Legislativo. Hoje, as condições de governabilidade são mais difíceis do que em 2003. Ele vai ter dificuldade, caso seja eleito, de reverter isso."
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