A oposição conquistou, ontem, uma vitória ao conseguir postergar para agosto a retomada da discussão e da votação, na Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA), do PL nº 1.459/2022, o chamado PL do Veneno. Motivo de embate com a base governista, a proposta é apontada por movimentos sociais como o mecanismo para permitir o registro de agrotóxicos com características que podem causar câncer, distúrbios hormonais e danos ao aparelho reprodutor.
A expectativa era de que o PL fosse aprovado na comissão ainda neste ano. Apresentado pelo então senador Blairo Maggi, em 2002, o texto representou um triunfo de bolsonaristas e da bancada ruralista quando de sua aprovação na Câmara, em fevereiro último.
Os defensores dizem que o projeto permite a modernização da agricultura, enquanto críticos condenam a flexibilização de regras que liberam a comercialização, no mercado nacional, de substâncias atualmente proibidas. Em especial, há imensa preocupação quanto à lei dos agrotóxicos (Lei 7.802 de 11/7/1989).
A tramitação da matéria ganhou mais um capítulo, ontem, com a aprovação de requerimento apresentado pelo senador Paulo Rocha (PT-PA) na CRA do Senado, para a realização de audiência pública destinada a debater o projeto com representantes do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), órgãos responsáveis pela liberação de agrotóxicos no país, além de representantes da Organização das Nações Unidas (ONU).
Com isso, a realização do evento foi marcada para a próxima sessão, em agosto, o que retarda a aprovação da matéria na própria comissão. "Não poderíamos deixar aprovar, na véspera do recesso, o Pacote do Veneno. O debate está sendo atropelado, sem discutir seu impacto ambiental, na Comissão de Meio Ambiente, além dos seus impactos à saúde humana, na Comissão de Assuntos Sociais. Vamos articular para que esses colegiados também sejam consultados. A sociedade brasileira é contra esse projeto", enfatizou Rocha.
A oposição aponta que a bancada governista, formada em grande parte por ruralistas, quer aprovar a matéria ainda neste ano, de modo que possa ser sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), favorável à matéria.
O presidente da CRA e relator do PL, Acir Gurgacz (PDT-RO), disse que os parlamentares da oposição estão errados. "Faremos essa audiência e quantas outras forem propostas e aprovadas pela Comissão de Agricultura", frisou. Na avaliação dele, há urgência, sim, no projeto. "É uma proposta de modernização dos procedimentos, que não exclui nenhum dos órgãos atuais, mas que estabelece prazos para que as avaliações de agrotóxicos sejam concluídas."
De acordo com Gurgacz, o relatório deverá manter a Anvisa e o Ibama como membros técnicos do processo de liberação de agrotóxicos, mas que o Mapa terá maior papel na organização desses procedimentos, embora o ministério já seja responsável por conceder o registro. Além disso, ele destacou que o prazo deverá ser de até dois anos para que esses órgãos liberem ou não a entrada de novos produtos na agricultura nacional.
Atualmente, a cadeia de liberação seja os seguintes passos: o Mapa analisa o produto segundo sua eficácia e segurança agronômica, a Anvisa avalia a questão de saúde pública, e o Ibama estuda o impacto ambiental.
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Embates
De acordo com lideranças da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA), a aprovação do projeto promete alterar, e muito, tanto o método quanto os tipos de produtos que atualmente podem ser usados em plantações no Brasil e que impactam diretamente na alimentação do brasileiro. "Nosso instrumento é a denúncia de que a bancada ruralista vem atropelando o rito para tentar aprovar esse projeto ainda neste governo", destacou Fran Paula, engenheira agrônoma, mestre em saúde pública e representante da ANA na Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e pela Vida.
A ANA sustenta que mais de 1,6 mil novos agrotóxicos foram liberados entre 2019 e 2022, enquanto o Mapa diz que foram 1.006. "O nosso cálculo é baseado nas publicações do Diário Oficial da União desde que Bolsonaro tomou posse. Isso dá, exatamente, 1.682 produtos agrotóxicos", explicou a advogada Naiara Bittencourt, ligada à ANA.
Os números do Mapa incluem agrotóxicos químicos (748) e biológicos (258), contando aí os aprovados para a agricultura orgânica (124).
O procurador do trabalho, Leomar Daroncho, que representa o Ministério Público do Trabalho (MPT) no Senado, afirmou que o tema preocupa, visto que o uso de agrotóxicos no Brasil significa expor agricultores e consumidores a produtos notadamente nocivos à saúde. "O PL nº 1.459/2022 não é uma boa ideia e precisa ser mais debatida. O projeto traz a real possibilidade de agravar o quadro", alertou.
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