Com a escalada da inflação e seus impactos, principalmente, nos preços dos combustíveis e dos alimentos, a pauta econômica se tornou protagonista nos discursos dos pré-candidatos ao Palácio do Planalto.
Na sabatina do Correio, realizada nesta semana, presidenciáveis foram contundentes nas declarações sobre a grave crise econômica na qual está mergulhada o país. A alta taxa de desemprego e o aumento das desigualdades foram destacados.
Pré-candidato do PDT, o ex-governador Ciro Gomes disse que o Brasil vive sua "mais grave crise". No que chamou de "terapia" para tal diagnóstico, ele apresentou o livro no qual discorre sobre o Plano Nacional de Desenvolvimento (PND), elaborado por sua equipe.
"Em vez de o Brasil ter uma meta de inflação — que a gente vai perseguir aquela que seja a melhor possível —, temos de ter uma meta de crescimento econômico", destacou o terceiro colocado nas pesquisas de intenção de voto. Segundo ele, haveria um plano de longo prazo, com duração de 30 anos. Até lá, ocorreriam metas intermediárias, de cinco em cinco anos.
A senadora Simone Tebet (MS), pré-candidata pelo MDB, enfatizou o elevado preço dos combustíveis. Um problema que o governo não consegue resolver e fez com que o presidente Jair Bolsonaro (PL) promovesse trocas em série no comando da Petrobras, sem sucesso até agora. O chefe do Executivo critica a política de preços da estatal, atrelada ao mercado internacional.
Para Tebet, porém, acabar com a Paridade Internacional de Preços (PPI) adotada pela Petrobras traria mais problemas do que soluções. Segundo ela, é possível tomar ações com efeito imediato para reduzir os valores cobrados nas bombas, como a criação de "créditos extraordinários".
Tebet também comentou sobre privatizações. Ela se disse a favor da desestatização da Eletrobras, mas votou contra o texto, em tramitação no Congresso, porque não concordou inteiramente com o teor. A senadora o definiu como "um jabuti dos mais perversos".
"Nós só não conseguimos derrubar porque estávamos numa pandemia, em que tivemos de votar no virtual. O Senado quase derrubou, porque, no meio das regras da Eletrobras, o projeto estava, a princípio, bom. Veio um jabuti da Câmara e que vai fazer com que vocês que estão nos acompanhando pague uma conta de energia mais cara ainda", continuou, se referindo aos internautas, que puderam acompanhar a sabatina ao vivo por meio do site e das redes sociais do jornal. Segundo a parlamentar, o projeto vai beneficiar apenas "meia dúzia de lobistas", com a construção de termelétricas e de um gasoduto no Nordeste.
Já o pré-candidato do Pros, Pablo Marçal, afirmou que nem todas as estatais precisam ser privatizadas, mas deveria haver uma análise do Tribunal de Contas da União (TCU), e "toda empresa que cheira a mofo, que tem cartel, monopólio, que tem ferrado a nação do Brasil" tinha de ser vendida.
Marçal se disse defensor das privatizações, inclusive no caso da Petrobras. "A gente precisa fragmentar a Petrobras em pequenas e médias empresas. Não precisa vender para capital estrangeiro, mas a gente precisa quebrar esse monopólio", ressaltou.
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Desperdício
Defensor de uma menor participação do Estado na economia, Felipe D'Avila, pré-candidato do Novo, criticou o que chamou de "desperdício de dinheiro público" no Brasil: os fundos eleitoral e partidário.
"É tudo verba eleitoreira. Isso é rasgar dinheiro público. Aliás, o maior desperdício de dinheiro público são os R$ 5 bilhões do fundo eleitoral para financiar campanha política num ano em que o Brasil precisa de dinheiro em outras áreas para ajudar, inclusive pessoas com problemas gravíssimos, como no Recife, por causa das chuvas; por mais dinheiro para hospitais e saúde pública", argumentou.
Pré-candidata do PCB, Sofia Manzano apresentou as propostas do partido para o âmbito do funcionalismo público. "Nós defendemos que os serviços essenciais sejam exercidos por servidores públicos e não por terceirizados nem apadrinhados, pois são formas de desvio de recursos públicos", destacou.
Socióloga e postulante ao Planalto pelo PSTU, Vera Lúcia Salgado defendeu a revogação das reformas trabalhista e previdenciária e o teto de gastos. "A revogação imediata de todas as reformas feitas contra a classe trabalhadora. Nós vamos estatizar as 100 maiores empresas deste país e vamos colocar sob o controle da classe trabalhadora organizada", ressaltou.
Retorno
Para o cientista político do Insper Leandro Consentino, a economia costuma ser central no decorrer das campanhas, mas havia perdido o posto nas eleições de 2018, quando o debate girou em torno do combate à corrupção.
"A questão é menos como a população compreende as filigranas do debate macroeconômico. E isso, de fato, a população não entende, mas a gente tem o "como" isso chega para o eleitorado. É com base nisso que ele vai decidir", destacou. "Temos quatro meses para as eleições, e, provavelmente, as narrativas serão mais importantes do que o próprio conhecimento factual da economia."
A deterioração da percepção de bem-estar social, no pós-pandemia, lança a agenda econômica para a centralidade do debate eleitoral, observou o mestre em ciência política e professor do Ibmec-DF Danilo Morais. Conforme destacou, o eleitor mediano costuma ser essencialmente pragmático. "A complexidade da engenharia econômica demanda soluções igualmente sofisticadas, mas que, dificilmente, serão assimiladas pelo eleitor mediano. Ele espera, simplesmente, a solução para o impasse, dando importância secundária aos meios", explicou.
Morais destacou que o mal-estar sentido pelo eleitor é uma combinação da observação da inflação, da precarização do trabalho, da queda real dos salários e da alta dos juros.