A ausência dos dois principais candidatos ao pleito de outubro deste ano nas sabatinas acendeu um alerta em analistas e demais candidatos à Presidência da República. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o atual chefe do Executivo, Jair Bolsonaro (PL), pré-candidato à reeleição, não compareceram à sabatina promovida pelo Correio, no último dia 31 de maio, nem às demais, anunciadas por outros veículos da imprensa. O questionamento que surge, então, é se essa será uma estratégia dos líderes das pesquisas de intenção de voto para as eleições de 2022, evitando assim, o desgaste de imagem.
Apesar de estarem em lados opostos na polarização, o petista e o atual presidente acabam utilizando estratégias semelhantes para manterem-se com boa performance nas pesquisas. A tática não é nova: em 1989, Fernando Collor de Mello não participou dos debates no primeiro turno. Em 1998, o então candidato Fernando Henrique Cardoso também se ausentou. Em 2006, o próprio presidente Lula, candidato à reeleição, não registrou presença nos debates do primeiro turno. E, mais recentemente, o então deputado Jair Bolsonaro ausentou-se dos debates no segundo turno, em 2018, sob a desculpa de que estava se recuperando da facada que levara durante a campanha, no interior de Minas Gerais. Foi a primeira vez na história que não houve debate entre os candidatos que disputaram o segundo turno.
Segundo fonte próxima a Bolsonaro no Palácio do Planalto, estar presente nos debates e sabatinas em 2022 não passa nem perto das preocupações do presidente no momento. Hoje, a menos de quatro meses das eleições, o chefe do Executivo tem em mente quatro temas: combustível, inflação, economia e rejeição. "A participação nos debates só entrará no radar de preocupação (do presidente) quando a campanha estiver em curso", disse à fonte ao Correio. Por ainda ser pré-candidato, não há compromisso oficial com a participação nos debates, e isso será usado a favor para postergar a avaliação da necessidade de comparecer ou não. Bolsonaro já chegou a declarar que sua ida aos debates do primeiro turno só ocorrerá se Lula também marcar presença.
"Talvez eu compareça. Vamos esperar. Eu fecho agora, se o Lula for, vou junto com ele", disse Bolsonaro, no início de junho. Em outra ocasião, também afirmou que iria nos debates caso chegasse ao segundo turno. No que tange ao primeiro turno, contudo, não informou. "No segundo turno, vou participar. Se eu for para o segundo turno, devo ir, né, vou participar. No primeiro, a gente pensa."
Nos bastidores da campanha de Lula, há o entendimento de que não é vantajoso participar de debates sem que Bolsonaro esteja presente. Do contrário, seria apenas dar oportunidade para que os demais candidatos — que estão abaixo dos dois dígitos nas intenções de voto — ataquem o ex-presidente e ganhem espaço.
Os partidos que compõem a chapa de Lula e de Geraldo Alckmin — PT, PSB, PSol, PCdoB, PV, Rede e Solidariedade — enviaram uma carta à Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) e à Associação Nacional de Jornais (ANJ) propondo que os debates presidenciais nas eleições de 2022 sejam limitados a três eventos e feitos em um modelo de "pool", ou seja, com organização conjunta por diversos veículos de comunicação. O modelo é utilizado, por exemplo, nos Estados Unidos. No Brasil, historicamente, os debates são organizados um a um por diversos veículos de comunicação.
Na carta, os partidos argumentaram ainda que os 45 dias de campanha eleitoral previstos na legislação para este ano são curtos demais para comportar os 10 debates propostos até o momento, e que a rotina seria "incompatível com a agenda política e a realização de atos públicos de campanha".
Questionado se a falta de participação de Lula nas sabatinas não prejudicaria o processo eleitoral, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), que é um dos coordenadores da campanha do petista, disse à reportagem que "se o processo eleitoral está sendo prejudicado de alguma forma é por parte do atual governo, que tenta manipular o eleitor ao questionar a segurança das urnas e do sistema pelo o qual ele foi eleito". Ele defendeu que as propostas já são conhecidas pela população, e que serão "detalhadas ainda mais" durante a campanha.
Eleitor prejudicado
Para Marco Antônio Teixeira, cientista político da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV EAESP), é preciso entender o contexto em que Lula se absteve do debate em 2006. Visando a reeleição, o petista enfrentava o auge do escândalo do mensalão, um esquema de compra de votos de parlamentares em troca de apoio no Congresso. "Apesar disso, Lula até estava numa posição confortável, o que, de certa forma, não justifica sua ausência no debate. Democracia supõe debate de ideias, supõe que os candidatos coloquem publicamente suas diferenças. Não adianta, depois, o político reclamar que não houve espaço para debater suas ideias."
O professor avalia que se os dois principais candidatos não comparecem, o debate perde boa parte do seu atrativo e apelo. "Isso é ruim também para os outros candidatos, porque a população vai olhar com menos interesse. Ainda mais num momento como este, de polarização", avalia. Entretanto, Teixeira destaca que quem perde mais é a democracia e o povo brasileiro.
"A ausência, sobretudo de candidatos competitivos e que têm diferenças de ideias, não contribui para a democracia. Mostra, na verdade, uma falta de compromisso com a democracia. Acredito que vai haver debate, seria até um descaso do candidato Lula, porque ele sempre defendeu uma ideia muito clara da importância do debate."
O cientista político e professor da Universidade Federal Fluminense (UFF) Marcus Ianoni reforça a ideia de que o não comparecimento prejudica os eleitores. Mas, por outro lado, devido ao contexto, acredita que a ausência pode ser, sim, uma estratégia. "Pode ser importante para suas estratégias eleitorais eles evitarem dar a cara para bater. Já Ciro Gomes (PDT) necessita dos debates para atacar os dois, sobretudo Lula, para se colocar como candidato contra a extrema-direita. Dado o enfraquecimento da chamada terceira via, os demais candidatos têm mais necessidade de debater do que os dois primeiros colocados nas pesquisas eleitorais. Mas o eleitor precisa entender o que está em jogo", afirma.
Oposição
As ausências nas sabatinas da imprensa foram criticadas pelo presidente do PDT, Carlos Lupi. Em vídeo divulgado pelo partido, Lupi questionou: "Onde está o respeito à opinião alheia? Onde está a vontade de esclarecer a opinião pública sobre cada candidato? Está ficando tudo muito parecido. O grupo do Bolsonaro com o grupo do Lula, é tudo muito igual", apontou.
Lupi ressaltou ser preciso "furar a bolha" da polarização, e reiterou que Ciro quer debater. "Só um debate permanente, claro, transparente, esclarece a população. PT, venha para o debate, não fuja como o Bolsonaro. Vocês estão se parecendo muito."
A senadora Simone Tebet, pré-candidata pelo MDB, PSDB e Cidadania, também faz questão de participar dos embates. Segundo membros de sua campanha, a equipe tem participado de todas as reuniões para organizar debates e sabatinas com os veículos de imprensa. Já a equipe de Lula esteve presente em algumas das reuniões; a de Bolsonaro, em nenhuma.
"Estou de prontidão para debater o Brasil onde quer que seja, e os debates dos veículos de imprensa são uma excelente oportunidade. Está mais do que na hora de falar menos em Lula e Bolsonaro e mais de Brasil", disse Tebet ao Correio.
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