Selado o isolamento do ex-governador paulista João Doria pela cúpula do PSDB — que não pretende dar sustentação ao pré-candidato do partido na corrida presidencial — e com apoio explícito dos dirigentes da sigla e de emedebistas à senadora Simone Tebet (MDB-MS), a terceira via tenta não misturar a briga no ninho tucano com as articulações em torno do nome que representará o autodenominado centro democrático. Nos bastidores da tríplice aliança (que inclui o Cidadania, federado ao PSDB), Doria é considerado um problema interno da legenda tucana e que deve ser resolvido entre eles.
Os presidentes dos partidos divulgaram, ontem, a posição oficial do consórcio. Por meio de nota, lembraram que MDB, PSDB e Cidadania têm histórico de unidade no trato de questões importantes da vida nacional, tanto no Legislativo quanto nos processos eleitorais. E que a união para a disputa ao Planalto está sendo discutida desde o fim do ano passado, com o aval, inclusive, de Tebet e de Doria — o União Brasil, de Luciano Bivar, deixou o grupo para se lançar em candidatura solo. No fim, a nota reafirma que "o Brasil terá uma nova candidatura, competitiva, para vencer, que será oficializada em breve".
A difícil montagem de uma chapa unificada que reúna o centro do espectro político é acompanhada a distância por observadores ligados aos dois candidatos que lideram a corrida ao Planalto. Poucos acreditam que a terceira via seja capaz de alterar o quadro bipolar entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o presidente Jair Bolsonaro (PL), mas, por precaução, a torcida é para que essa aliança não prospere.
"Para ambos (Lula e Bolsonaro) é bom que os dois estejam no segundo turno. Qualquer outro candidato com rejeição menor teria melhor chance de romper isso (a polarização)", avaliou o doutor em ciência política Leandro Gabiati, da Dominium Consultoria. "Não interessa a nenhum dos dois enfrentar um candidato com menos rejeição."
Com a antecipação extraoficial do calendário eleitoral, deflagrada pela agenda de Bolsonaro e pelo fim da inelegibilidade de Lula — decorrente dos processos que enfrentou e superou no âmbito da Operação Lava-Jato —, muitos tentaram assumir algum protagonismo fora dos trilhos do bolsonarismo ou do lulismo, mas todos foram abatidos em suas pretensões ou desistiram diante da barreira quase intransponível erguida pela dupla para conquistar eleitores. Nomes como o do apresentador de tevê Luciano Hulk, do ex-juiz Sergio Moro, do ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta e do ex-governador gaúcho Eduardo Leite foram sendo rifados ao longo do processo.
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Sem consenso
Mesmo dentro dos partidos da terceira via falta unidade. No MDB, o nome de Tebet não é consensual. A ala nordestina da legenda já assumiu o apoio a Lula e considera o debate sobre a pré-candidatura da senadora sul-mato-grossense "estéril". "No Nordeste, não existe nem Simone nem Doria, existe Lula. Cúpula não decide eleição", disse um interlocutor do grupo ligado ao senador Renan Calheiros (AL) e ao ex-senador Eunício Oliveira (CE).
De forma semelhante, porém mais discreta, há um forte apoio não só no MDB, mas também no PSDB à reeleição de Bolsonaro, articulada, principalmente, pelos diretórios dos estados do Centro-Sul do país. Um candidato da terceira via é visto como um anteparo à debandada para os palanques favoritos. No entorno político do presidente, a terceira via paira como uma miragem, que não se materializará em votos. Segundo uma fonte do Planalto, a preocupação é só em evitar que um terceiro nome "roube votos" que hoje seriam dados ao atual chefe do Executivo. Ela considera Tebet mais viável para atingir o eleitor que não quer Lula nem Bolsonaro e com mais condições políticas de fustigar a candidatura do petista. "A senadora pode bater no governo Dilma, por exemplo, o que não é ruim", avaliou.
"No MDB, é visível a simpatia pró-Bolsonaro. Em Minas Gerais e na Região Sul, o PSDB é claramente antipetista. Uma candidatura unificada evitaria essa divisão evidente", disse Leandro Gabiati. Mas ele não acredita que o imbróglio se definirá na semana que vem, quando as comissões executivas dos três partidos voltam a se reunir para bater o martelo em relação ao nome de Tebet. Na avaliação do especialista, Doria ainda tem condições de levar esse debate para mais perto das convenções, no fim de julho. A dúvida é em que condição o ex-governador chegaria lá. "Doria talvez tenha de aceitar uma derrota humilhante na convenção. Se ele prosseguir, corre o risco de ir sozinho, sem estrutura, sem palanque. É quase um beco sem saída", destacou o cientista político. "Mas o PSDB precisa de uma saída honrosa não só para Doria, mas para o próprio partido, que sempre foi referência na política brasileira. É uma questão de sobrevivência."