A intenção do presidente Jair Bolsonaro de contratar uma empresa para auditar os votos das eleições foi alvo de críticas, também, de especialistas. O cientista político André César, da Hold Assessoria Legislativa, destacou que, apesar de pedido de auditoria ser comum, num cenário polarizado e de discursos inflados do chefe do Executivo contra o Poder Judiciário, pode gerar uma crise ainda maior. "No contexto que estamos vivendo, em que o Bolsonaro está operando, é mais uma forma dele de ameaçar. E isso vai continuar, faz parte da prática dele", afirmou.
Na avaliação do cientista político Leonardo Queiroz Leite — doutor em administração pública e governo pela Fundação Getulio Vargas (FGV-SP) —, as declarações de Bolsonaro servem apenas para "alimentar seus seguidores fiéis e fanáticos, que precisam desse tipo de informação". "Eles, na verdade, vivem numa estrutura paralela de informações. Não se alimentam de informações da mídia tradicional e não dão crédito às declarações das autoridades, dos ministros, dos especialistas", observou.
Leite disse temer uma postura extrema do chefe do Executivo em caso de revés nas urnas. "Vejo com preocupação no sentido do impacto que isso pode ter na eleição numa eventual derrota de Bolsonaro, de, lá na frente, ele vir a questionar os resultados. Isso gera instabilidade e é péssimo para a imagem do país."
Auditorias passadas
Caso a pretensão de Bolsonaro se concretize, não será a primeira vez que um partido pedirá auditoria externa das urnas eletrônicas. Em 2015, poucos meses depois do ex-presidenciável Aécio Neves (PSDB) ser derrotado nas urnas por Dilma Rousseff (PT), a legenda tucana contratou uma empresa para fazer a contagem de votos das eleições de 2014. O processo levou seis meses e concluiu que não houve fraude no processo eleitoral.
Em 2018, o PSL, partido pelo qual Bolsonaro se elegeu à Presidência da República, também fez auditoria externa. A sigla pediu ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a recontagem dos votos por acreditar que o presidente foi eleito no primeiro turno.
"A fala de Bolsonaro em relação à credibilidade do sistema eleitoral acaba sendo mote de campanha que ativa seus militantes, mas ela já tem um respaldo. Não é uma novidade. Temos esse fato inaugural de Aécio Neves, que não reconheceu a derrota e questionou a lisura do pleito, patrocinado pelo PSDB. Essas questões ficam pairando, e há uma memória curta em relação a isso", sustentou o cientista político Paulo Baía, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Após o anúncio de Bolsonaro, o TSE reiterou que as siglas têm direito de auditar votos: "Os partidos políticos podem fazer suas próprias auditorias pelo Registro Digital do Voto (RDV). Lembramos, ainda, que qualquer cidadão pode fazer sua própria auditoria por meio do Boletim de Urna, emitido pelo mesário ao fim da votação e divulgado nas seções eleitorais e no site do TSE".