As críticas do presidente Jair Bolsonaro contra o sistema eleitoral não preocupam apenas instituições do país. A maior potência do mundo também está de olho em eventuais ameaças à democracia brasileira. Durante entrevista, ontem, na Casa Branca, o porta-voz do Departamento de Estado americano, Ned Price, ressaltou que o governo dos Estados Unidos "confiam muito nas instituições democráticas do Brasil" e que "o país tem um histórico sólido de eleições livres e justas, com transparência e altos níveis de participação dos eleitores".
"É importante que os brasileiros, enquanto aguardam suas eleições no fim do ano, confiem em seus sistemas eleitorais e que o Brasil, mais uma vez, esteja em condições de mostrar ao mundo, por meio dessas eleições, a solidez duradoura da democracia brasileira", destacou o porta-voz.
As declarações de Price foram em resposta a questionamento sobre uma suposta recomendação que o diretor da Agência Central de Inteligência dos Estados Unidos (CIA), William Burns, teria feito a integrantes do governo para que Bolsonaro parasse de colocar em dúvida a lisura do processo eleitoral brasileiro.
De acordo com reportagem da Agência Reuters, Burns veio ao Brasil em julho do ano passado, seis meses após apoiadores do ex-presidente Donald Trump terem invadido o Capitólio, nos Estados Unidos, contestando o resultado das eleições americanas vencidas por Joe Biden. O diretor da CIA se encontrou com Bolsonaro; com o ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno; e com o então diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Alexandre Ramagem. Os alertas do norte-americano teriam ocorrido em um jantar na casa do embaixador Todd Chapman. Segundo a reportagem, ele deixou claro a Heleno e ao ministro da Secretaria-Geral da Presidência, general Luiz Eduardo Ramos, "que as eleições não são um tópico com o qual devessem brincar" e que Bolsonaro deveria cessar as críticas ao sistema brasileiro. A Reuters destacou não ser comum a CIA enviar recados a políticos, mas Biden teria mandado o diretor como porta-voz da Casa Branca.
A visita de Burns não constava da agenda oficial dele. O diretor da CIA foi a única autoridade americana a se encontrar com Bolsonaro desde que Biden assumiu o governo dos EUA.
Desde que assumiu o governo, em 2019, Bolsonaro passou a levantar dúvidas sobre a segurança das urnas eletrônicas, mas nunca apresentou provas de fraude. Ele também defendeu o voto impresso, e um projeto para implantar o sistema chegou a tramitar na Câmara, mas foi derrubado no plenário da Casa.
Em live, ontem, Bolsonaro negou qualquer sugestão do diretor da CIA. O chefe do Executivo comentou sobre o assunto ao lado de Heleno. "O que houve aqui? Uma imprensa de fora, Reuters, sobre narrativas, eleições, ou seja, estão plantando narrativas fora do Brasil? O que aconteceu?", questionou.
Heleno acrescentou que a conversa "jamais ocorreu" e que se trata de uma notícia falsa. "Lógico que as conversas sobre a área de inteligência que tivemos foram extremamente produtivas e muito interessantes. Essa conversa sobre eleições jamais aconteceu", disse. "Não sei de onde ele buscou essa narrativa. Isso jamais aconteceu, não houve nenhuma troca de ideias sobre eleições nem nos EUA nem aqui. Então essa foi uma notícia falsa", concluiu. (Cristiane Noberto, Ingrid Soares e Taísa Medeiros)