O futuro da candidatura do ex-governador João Doria ao Planalto pelo PSDB começa a ser decidido hoje, na reunião da Comissão Executiva do partido, em Brasília, convocada pelo presidente da sigla, Bruno Araújo. Não será um encontro tranquilo. Ao contrário, o ninho tucano está em guerra aberta desde que o ex-gestor paulista decidiu enviar, no sábado, uma carta de sete páginas à direção da legenda com a clara intenção de enfrentar a ala que o quer ver fora da disputa eleitoral, incluindo Araújo. Além de dirigentes nacionais e estaduais, o encontro contará com a presença dos deputados e senadores da bancada.
A reunião também apontará o destino da chamada terceira via de centro, articulada pelos presidentes do PSDB, do Cidadania (Roberto Freire) e do MDB (Baleia Rossi). No fim de semana, tucanos ilustres, ligados à ala histórica do partido, se mostraram contrários à aliança com o MDB e defenderam candidatura própria e respeito às prévias que chancelaram a pré-candidatura de Doria. Entre eles, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) e o deputado Aécio Neves (PSDB-MG). Ontem, o tucanato passou o dia em reuniões e articulações para o previsível embate de hoje, entre quem apoia (ou admite apoiar) o nome de Doria e quem quer se livrar dele.
Apesar da tensão do momento, o ex-governador não virá a Brasília, mas terá representantes de expressão no partido para defender sua candidatura, como a ex-governadora do Rio Grande do Sul Yeda Crusius e o presidente do PSDB em São Paulo e coordenador da pré-campanha, Marco Vinholi. A linha de argumentação também está definida e não se limita à legitimidade conferida pelas prévias. Segundo o Correio apurou, os defensores de Doria vão apresentar, pelo menos, mais três argumentos para convencer o partido (leia quadro).
No campo objetivo, serão expostas as últimas pesquisas de intenção de votos para a Presidência, em que Doria aparece com o triplo da preferência em relação à pré-candidata do MDB, senadora Simone Tebet — 3% contra 1%, na média, respectivamente. Também vão questionar a pesquisa qualitativa contratada pelos partidos, feita no fim de semana, com grupos limitados de pessoas, que favoreceria Tebet pela baixa rejeição e pelo desconhecimento do eleitor. Os apoiadores da parlamentar defendem a tese de que ela tem mais condições de escalar as pesquisas a partir do momento em que passar a ser mais conhecida.
Os bons resultados à frente do governo paulista, com destaque para a vacinação contra a covid-19, fecham a lista dos principais argumentos da defesa de Doria.
Os aliados do ex-governador também vão apelar para o "instinto de sobrevivência" e a "unidade" do PSDB, que, por sua importância política e histórica, não pode se imiscuir da responsabilidade de apresentar ao eleitorado um nome que represente a bandeira da social-democracia. Para reforçar esse argumento, levarão à Executiva a posição de FHC, que, por meio de sua rede social, declarou no domingo que o pré-candidato "agiu bem" ao defender o direito de disputar a eleição, ressaltando que "o resultado das prévias deve ser respeitado". Esse mesmo argumento foi usado por caciques que fazem oposição a Doria, como Tasso Jereissati e Aécio Neves.
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Defesa
A direção nacional do PSDB, por sua vez, representada por Bruno Araújo, vai tentar circunscrever os debates à análise dos critérios acordados para a formação da terceira via com o MDB — o Cidadania está federado com os tucanos e seguirá a decisão do aliado. Araújo passou o dia de ontem no Recife, acompanhando a agenda da pré-candidata tucana ao governo de Pernambuco, Raquel Lyra. Ele rebateu as declarações de Aécio Neves à Folha de S.Paulo de que estaria "advogando" em favor do postulante do partido ao governo paulista, Rodrigo Garcia, em detrimento da candidatura à Presidência, cujo mau desempenho poderia comprometer a hegemonia de mais de duas décadas do PSDB no estado mais importante do país e berço da legenda.
"Ele (Aécio) tem razão. Eu sou advogado de Rodrigo Garcia em São Paulo, mas faltou uma vírgula. Eu sou advogado dele em São Paulo; de Raquel Lyra em Pernambuco; de Pedro Cunha Lima, pré-candidato a governador da Paraíba; de Eduardo Riedel, pré-candidato em Mato Grosso do Sul; do candidato de Eduardo Leite no Rio Grande do Sul; do senador Alessandro Vieira (pré-candidato em Sergipe). Sou presidente do partido e advogado dos interesses do partido nos estados em que esteja disputando", declarou Araújo.
Rejeição
Objetivamente, a estratégia do presidente do PSDB é confrontar a pretensão de Doria com os elevados índices de rejeição a ele apontados pelas pesquisas e defender institucionalmente o acordo feito com MDB e Cidadania. O comando do partido preparou, inclusive, uma lista com mais de 10 declarações feitas pelo ex-governador — registradas pela imprensa — a favor da união de centro.
O problema é que o apoio a uma chapa unificada começou a perder força a partir do momento em que lideranças históricas passaram a defender candidatura própria — "certa ou errada", como disse Jereissati — e respeito às prévias. A posição de Tebet de não aceitar ser vice em uma chapa encabeçada por Doria também é vista por tucanos consultados pelo Correio como um entrave ao acordo.
Expectativa
Em São Paulo, Tebet reafirmou, ontem, que manterá sua candidatura ao Planalto se for escolhida como a cabeça de chapa da terceira via, na reunião de amanhã com os presidentes das três legendas, independentemente da determinação de Doria. O ex-governador afirmou, na carta enviada a Araújo, no sábado, que não desistirá de sua candidatura e usará "todas" as suas "forças" para fazer valer o resultado das prévias do PSDB.
"Nós aceitamos as regras do jogo e (amanhã) teremos o resultado (da pesquisa contratada pelas legendas). O resultado há de ser cumprido", disse Tebet, em sabatina organizada pela Associação Comercial de São Paulo. "Com ou sem frente democrática, se meu nome for escolhido e outros resolverem, 'ah, não aceito as regras do jogo', tentar judicializar, é um direito que lhes assiste. Eu continuo pronta para falar para o Brasil", avisou, ao comentar a possibilidade de Doria questionar na Justiça qualquer decisão que contrarie as prévias.
A senadora assegurou, porém, que respeitará a decisão dos três partidos caso não seja ela a escolhida para encabeçar a terceira via. "Obviamente que eu tenho de ceder e observar as regras", declarou. "Eu estou pronta para aceitar o resultado. E aceitei as regras do jogo, deixei ao presidente do meu partido o poder de decidir. Não sei o que está sendo feito, não conheço a pesquisa, não sei os critérios dela e não me interessa."
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