Sob pressão política no país, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu recorrer a observadores internacionais para aplacar ataques à lisura das eleições deste ano. A Corte disparou ofícios com convites para autoridades e organizações do exterior acompanharem a disputa pelo Planalto. A estratégia ocorre em meio a discursos do presidente Jair Bolsonaro (PL) que questionam, de forma antecipada, o resultado das urnas. As respostas aos chamamentos da Justiça Eleitoral devem começar a chegar no fim deste mês.
Entre os convidados notórios estão a União Europeia, a Organização dos Estados Americanos (OEA) e o Carter Center, organização fundada pelo ex-presidente dos Estados Unidos Jimmy Carter na área dos direitos humanos.
A reação foi imediata. Em nota, o Ministério das Relações Exteriores disse, na quarta-feira, que o eventual convite à comunidade europeia destoa do modo de funcionamento convencional das missões de observação.
No comunicado, o Itamaraty disse “não ser da tradição do Brasil ser avaliado por organização internacional da qual não faz parte”. Ainda cita, por exemplo, o fato de que a União Europeia “não envia missões eleitorais a seus próprios estados membros”. No TSE, porém, prevalece o interesse de poder contar com grandes organizações internacionais.
Diferentemente dos observadores comuns, as Missões de Observação Eleitoral (MOE) têm como objetivo “contribuir para o aperfeiçoamento do processo eleitoral, ampliar a transparência e a integridade, bem como fortalecer a confiança pública nas eleições”. Esses grupos também celebram acordos com o compromisso de produzir relatórios, em até um ano, com as conclusões e eventuais recomendações à Justiça Eleitoral brasileira.
A OEA atuou como missão observadora nas eleições presidenciais de 2018 no Brasil. Na ocasião, parabenizou os esforços do tribunal contra as fake news. Foi um gesto de cortesia. Naquele ano, a Justiça Eleitoral brasileira foi criticada por não tomar iniciativas concretas contra a proliferação de notícias falsas. O Conselho Consultivo sobre Internet e Eleições, instalado pelo TSE naquela ocasião, sequer se reuniu presencialmente durante a disputa.
Outros convidados de destaque foram o Parlamento do Mercosul (Parlasul), a União Interamericana de Organismo Eleitorais (Uniore), a Fundação Internacional para Sistemas Eleitorais (IFES) e a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) — este último confirmou em reunião com o presidente do TSE, Edson Fachin, que enviará uma missão de observação ao Brasil.
O TSE também tem se colocado à disposição de outros países para reforçar o intercâmbio observador, como já fez em anos anteriores. A Corte deve ter um de seus ministros efetivos escalado para acompanhar as eleições presidenciais da França, cujo segundo turno será disputado em 24 de abril.
Coordenadora-geral da Transparência Eleitoral Brasil, Ana Cláudia Santano ponderou que não é função dos observadores eleitorais “validar resultados”. “Caso aconteça a contestação do resultado das eleições, existe um universo de medidas, mas quem tem que validar o placar é a autoridade eleitoral”, afirmou ela, que tem experiência como observadora no exterior. “Não cabe aos convidados internacionais fiscalizar e defender resultados. Os observadores não emitem opinião. Cabe a eles reunir elementos sobre o processo.”
Saiba Mais
Queda gradativa
Com o passar dos anos, o número de observadores internacionais nas eleições brasileiras caiu. Levantamento feito pelo TSE mostra que, nos pleitos municipais de 2020, apenas seis convidados estrangeiros, de quatro países da América Latina, estiveram no Brasil para acompanhar a qualidade do processo eleitoral. Na eleição de 2018, vieram para cá 36 convidados e quatro organizações de 14 países diferentes — a maioria africanos e latino-americanos em situação democrática menos consolidada do que a do Brasil; as exceções foram Portugal e Coreia do Sul. Os números, porém, nem se comparam com as votações de 2014 e 2010, quando mais de 50 autoridades de 20 nacionalidades diferentes fiscalizaram o sistema eleitoral brasileiro.