O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria, nesta sexta-feira (1°/4), em favor da decisão do ministro Alexandre de Moraes sobre a imposição do uso da tornozeleira no deputado federal Daniel Silveira (União Brasil-RJ). Sete dos 11 ministros já haviam votado: Dias Toffoli, Carmen Lúcia, Edson Fachin, Rosa Weber, Gilmar Mendes e Luis Roberto Barroso. Os outros ainda não votaram. A votação ocorre no plenário virtual.
Em fevereiro de 2021, o deputado atacou o STF e acabou tornando-se réu no inquérito dos atos antidemocráticos que o ministro Alexandre de Moraes é relator após ameaçar o Supremo e os ministros. Silveira foi preso e passou por regime domiciliar, sendo solto novamente mediante as cautelares, mas ele voltou a fazer ataques e descumpriu as decisões da corte.
Ao pedir a aplicação da tornozeleira, o Ministério Público afirmou que, mesmo investigado, Silveira continuou fazendo ataques às instituições e à democracia. O parlamentar dormiu no gabinete dele na Câmara dos Deputados, no último dia 30, para não ser preso, alegando que aquele era um ambiente inviolável. O presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), emitiu uma nota à imprensa, afirmando que ordens judiciais devem ser cumpridas, mas que a Câmara é um ambiente inviolável.
Depois de pernoitar no Congresso e ir à um evento no Palácio do Planalto na manhã de 31 de março, o deputado concordou com o uso do monitoramento eletrônico após o magistrado instaurar um inquérito por desobediência, com pagamento de multa de R$ 15 mil por dia pelo descumprimento da ordem judicial e o congelamento dos bens do deputado.
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Reação do Congresso
No dia em que Silveira se escondeu no gabinete alegando "que aquele ambiente era inviolável", o Correio ouviu deputados governistas e de oposição. O líder da bancada evangélica, Sóstenes Cavalvante (PL-RJ), disse que o judiciário desafia o legislativo. "Nunca se viu essa afronta de um poder ao outro, ainda mais neste caso em especial. Pelas garantias constitucionais do parlamento brasileiro, e no caso, em tese, do deputado Daniel Silveira. Entendo que a decisão do ministro Alexandre de Morais é antidemocrática e sem respaldo legal, um processo cheio de vícios, fragilizando nossa democracia”, disse. Sóstenes ainda criticou Lira. “O que me assusta é a incapacidade da presidência da Câmara na figura do seu presidente. A nota do Lira não resolve o problema e precisa autorizar seu vice-presidente, já que não está essa semana em Brasília, pautar o requerimento no plenário", afirmou.
O líder do PT na Câmara, Reginaldo Lopes (MG), apontou que o problema é a falta de funcionamento do Conselho de Ética para resolver o imbróglio. “Eu tenho defendido que o Conselho de Ética tem que voltar a funcionar. Tem que voltar aos trabalhos presenciais. No caso do Daniel, o Conselho de Ética tem que julgar o processo dele e não cabe levar ao plenário se confirma ou não o que o Supremo está propondo. Já autorizamos o Supremo e ele descumpriu a execução penal. O presidente Lira foi correto na nota, mas precisa botar a Comissão de Ética para funcionar”, disse Lopes.
Rui Falcão (PT-SP) endossou o líder petista. “Há uma decisão do conselho de ética. Há um retardo na decisão no Conselho de Ética como a suspensão de seis meses do mandato e por isso ele está aqui. O judiciário tem o papel dele e a casa não tem a ver com ele. Para livrar-se dessa decisão, suspende o mandato”, disse.
Especialistas
Carlos Abrão, advogado e professor de direito constitucional e internacional, explicou que o mandato parlamentar é inviolável, pois um congressista precisa ter a liberdade de atacar e defender governos e decisões. “Isso não é absoluto. A liberdade de expressão dos parlamentares é restrita à Constituição”, disse. “Isso vale para partidos que precisam ter em seu estatuto a defesa do estado democrático de direito. Ou seja, defender o AI-5 é vedado pela Constituição”, explicou.
O professor deixa claro que Silveira não teceu críticas ao Supremo, mas ultrapassou limites. “O STF foi vítima de ataques ou seja, a Corte então, não poderia ser relatora deste inquérito?”, questionou. Abrão argumenta que a maioria no Supremo hoje em endosso a decisão de Morais é um ato de defesa ao poder judiciário.
O professor de direito constitucional da Universidade de São Paulo (USP), Elival Ramos, já havia explicado ao Correio que não há previsão para um deputado se hospedar no plenário da Câmara. “O deputado disse em entrevista que o plenário é um reduto de soberania e isso não existe no estado democrático de direito. Imagina um crime sob flagrante a polícia competente não poder entrar no plenário para prender alguém que cometeu um crime porque é parlamentar? Não há áreas inexpugnáveis na República”, disse.