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O desdém do presidente do STM

General Luiz Carlos Gomes Mattos chama de tendenciosas as notícias sobre gravações que apontam tortura na ditadura militar, diz que objetivo é atingir as Forças Armadas e faz pouco caso: "Não estragou a Páscoa de ninguém"

Michelle Portela
postado em 20/04/2022 00:01
 (crédito: Odair Freire/Flickr)
(crédito: Odair Freire/Flickr)

O presidente do Superior Tribunal Militar (STM), Luiz Carlos Gomes Mattos, disse que a Corte não tem "resposta nenhuma para dar" sobre os áudios que citam prática de tortura na ditadura militar. Segundo ele, o conteúdo divulgado no último domingo "não estragou a Páscoa de ninguém". "A minha não estragou", enfatizou, durante sessão de julgamento, ontem.

Gomes Mattos chamou as gravações de "tendenciosas" e ressaltou que a divulgação teria como objetivo influenciar a opinião pública contra as Forças Armadas.

"A gente já sabe os motivos, do porquê isso vem acontecendo agora, nesses últimos dias, seguidamente, por várias direções, querendo atingir as Forças Armadas, o Exército, a Marinha, a Aeronáutica", afirmou. "E, sem dúvida, nós somos quem cuida da disciplina, da hierarquia, que são os nossos pilares das nossas Forças Armadas. Nós não temos resposta nenhuma para dar. Simplesmente ignoramos uma notícia tendenciosa daquela, que nós sabemos o motivo, né?."

O ministro admitiu, no entanto, que esse "vira e mexe" incomoda. "Não têm nada para buscar hoje, vão buscar no passado, rebuscar o passado. Só varrem um lado, não varrem o outro. É sempre assim. Nós estamos acostumados com isso. Então, deixa para lá", acrescentou.

Os áudios de ministros do STM durante a ditadura militar referem-se a atos de tortura no regime de exceção e foram publicados pela jornalista Míriam Leitão no jornal O Globo.

As 10 mil horas de gravações são de sessões que ocorreram entre 1975 e 1985. O material foi obtido pelo pesquisador Fernando Fernandes e pelo historiador Carlos Fico, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Uma das partes transcritas é de 24 de junho de 1977. Na ocasião, o general Rodrigo Octávio Jordão Ramos diz: "Fato mais grave suscita exame, quando alguns réus trazem aos autos acusações referentes a tortura e sevícias das mais requintadas, inclusive provocando que uma das acusadas, Nádia Lúcia do Nascimento, abortasse após sofrer castigos físicos no Doi-Codi". Nádia estava com três meses de gravidez e teria perdido o bebê devido a sucessivos "choques elétricos em seu aparelho genital".

Mattos seguiu a linha de deboche adotada pelo vice-presidente Hamilton Mourão (Republicanos) sobre o caso. Na segunda-feira, ao ser questionado se haveria investigação, ele ironizou. "Apurar o quê? Os caras já morreram tudo, pô. Vai trazer os caras do túmulo de volta?", riu.

Mourão frisou que o assunto é "passado". "A História, ela sempre tem dois lados ao ser contada. Então, vamos lembrar: aqui houve uma luta, dentro do país, contra o Estado brasileiro, por organizações que queriam implantar a ditadura do proletariado aqui. (...) Houve excessos? Houve excesso de parte a parte", defendeu.

 

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