eleições

Reação à 'censura' em festival

Decisão de ministro do TSE de proibir manifestações contra Bolsonaro no Lollapalooza é criticada e estimula novos protestos no evento

Artistas e entidades reagiram contra a decisão do ministro Raul Araújo, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), de proibir manifestações políticas no Festival Lollapalooza, em atendimento a ação do PL, partido do presidente Jair Bolsonaro. Além de ser alvo de críticas, a determinação do magistrado acabou incentivando novos protestos no evento.

O pedido do PL ocorreu após a cantora Pabllo Vittar expor, no show de sexta-feira, bandeira com imagem do rosto do ex-presidente Luiz Inácio da Silva. Ela também puxou o coro de "fora Bolsonaro", acompanhada do público.

No entendimento de Araújo, as manifestações políticas de artistas no Lollapalooza são propaganda eleitoral antecipada, por apresentarem Lula como supostamente "mais apto" que Bolsonaro. O magistrado estipulou, ainda, multa de R$ 50 mil para novos casos, mas como o evento não foi intimado, os artistas que resolveram protestar após a liminar não serão punidos.

Pelas redes sociais a cantora Anitta criticou a decisão. "50 mil? Poxa... menos uma bolsa. Fora, Bolsonaro! Essa lei vale fora do país? Porque meus festivais são só internacionais", ironizou.

O rapper Marcelo D2 entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) para derrubar, no Supremo Tribunal Federal (STF), a liminar do TSE. A representação foi feita por meio de uma procuração para o advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, conhecido como Kakay, intermediada pelo deputado federal e pré-candidato ao governo do Rio de Janeiro Marcelo Freixo (PSB-RJ).

Em nota, Kakay ressaltou a mobilização dos artistas para questionar a decisão e disse que o entendimento histórico do TSE "prestigia a liberdade de expressão". Segundo ele, a decisão proferida pelo ministro representa "um violento ataque às livres manifestações".

"Essa ilegal decisão proferida por um dos ministros do TSE não deve macular a imagem desse Superior Tribunal que, nos últimos anos, colocou-se de forma favorável à liberdade de expressão, de modo glorioso", sustentou, em nota. "Essa é uma decisão singular que não representa, necessariamente, o posicionamento do tribunal. Nestes tempos de obscurantismo, o Judiciário tem sido um guardião da Constituição e das garantias individuais."

O youtuber Felipe Neto se comprometeu a ajudar artistas que protestaram a pagar a multa. "Muitos não podem lidar com perseguição do governo. Caso sejam perseguidos por se posicionarem, nosso movimento Cala Boca Já Morreu se dispõe a ajudá-los com a defesa. Se alguém for condenado e precisar, eu ajudo a pagar essa multa ilegal. Enfrentem!", postou nas redes sociais.

"Incompatível"

A cantora Daniela Mercury, que não participou do festival, afirmou, em nota: "A Constituição não assegura liberdade de expressão ao eleitor? A democracia é incompatível com censura prévia ao eleitor. O plenário do TSE precisa dizer aos eleitores, mesmo os que são artistas, se podem ser proibidos de manifestar espontaneamente sua preferência e sua crítica, a qualquer tempo".

Na avaliação da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional de São Paulo, a decisão fere "a manifestação espontânea e gratuita de ideias" e o fomento de debate público sobre as eleições.

"Os artigos 36 e 36-A da Lei das Eleições tratam da matéria trazendo regras bastante específicas quanto ao pedido de votos em período da pré-campanha eleitoral, que não se confundem com a manifestação pública de cidadão sobre suas preferências políticas", sustenta a entidade. "Silenciar a voz de cidadãos com multa em valor superior à pena no caso da ocorrência da conduta, pode tolher o exercício da cidadania, limitar a difusão de ideias e empobrecer a qualidade e variedade do debate público nas mais diversas arenas da sociedade civil", acrescentou.

A decisão do ministro acabou impulsionando os protestos ontem, último dia do Lollapalooza. Emicida, Djonga, Marina Sena, Marcelo D2, a banda Fresno e Lulu Santos foram alguns dos que se manifestaram contra o chefe do Executivo. Fresno projetou uma mensagem de "Fora Bolsonaro" no megatelão exposto no palco, e Lulu aproveitou sua participação no show da banda para protestar contra a "censura".

Ao longo do festival houve, também, incentivo para que jovens tirem o título de eleitor. "Vamos votar, que é o único jeito de a gente mudar alguma coisa", conclamou Marina Sena.