O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes revogou, na tarde de ontem, a decisão que determinava o bloqueio do Telegram em todo o país. Segundo Moraes, a decisão ocorreu porque o aplicativo cumpriu as determinações judiciais que estavam pendentes, as mesmas que levaram o ministro a definir a suspensão do mensageiro.
"Diante do exposto, considerado o atendimento integral das decisões proferidas em 17/3/2022 e 19/3/2022, revogo a decisão de completa e integral suspensão do funcionamento do Telegram no Brasil, proferida em 17/3/2022, devendo ser intimado, inclusive por meios digitais, o presidente da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), Wilson Diniz Wellisch, para que adote imediatamente todas as providências necessárias para a revogação da medida, comunicando-se essa Corte, no máximo em 24 horas", despachou Moraes.
No sábado, o ministro do STF recebeu um comunicado oficial e um pedido de desculpas do fundador do Telegram, Pavel Durov, que também apresentou meios de contatos oficiais e admitiu que a gestão do aplicativo foi "negligente" com a Justiça brasileira.
A partir daí, Moraes definiu prazo de 24 horas para que a plataforma cumprisse cinco pontos ainda pendentes de decisões judiciais anteriores, entre elas, a apresentação de um representante legal.
Na decisão de ontem, Moraes afirma que o prazo foi atendido. O Telegram foi notificado às 16h44 do sábado e, às 14h45 deste domingo, informou ao STF que tinha concluído as "tarefas" da lista.
Após o pedido de suspensão ocorrida na sexta-feira, o presidente Jair Bolsonaro (PL) começou a defender a liberação e o uso do aplicativo. Uma das medidas impostas ao Telegram era a exclusão de uma publicação feita por Bolsonaro, que divulgou inquérito sigiloso para atacar o sistema eletrônico de votação, e ainda de um canal citado no inquérito das fake news.
Recurso da AGU
No sábado, a Advocacia-Geral da União (AGU) entrou com um pedido de medida cautelar no STF contra a ordem de bloqueio do Telegram. A ação da AGU seguia a linha presidencial, ao dizer que a medida de Moraes pela suspensão feria o direito dos demais cidadãos do uso da internet, ferindo a Constituição e o Marco Civil da Internet.
O advogado-geral da União, Bruno Bianco, protocolou uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI). "O AGU (Advogado-Geral da União), com fundamento no artigo 103, inciso I, da Constituição, bem como na Lei nº 9.868, de 10 de novembro de 1999, vem, perante essa Suprema Corte, requerer medida cautelar incidental, a fim de que se confira interpretação conforme ao art. 12, III e IV, da Lei nº 12.965/2014, para assentar que as penalidades neles previstas não podem ser decretadas em caso de desatendimento de ordem judicial", diz.
No pedido, a AGU aponta que, segundo a legislação que estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da Internet no Brasil — o Marco Civil da Internet —, aplicativos de internet podem sofrer sanções se desrespeitarem o sigilo das comunicações ou se usarem indevidamente dados pessoais, mas não por descumprirem uma ordem judicial.
O órgão também defende que uma "eventual conduta antijurídica que se imputa aos investigados, não pode reverberar automática e indistintamente em punição/banimento de todos os demais usuários do serviço".
Para Gabriel Quintanilha, doutor em direito e professor da Fundação Getulio Vargas (FGV), a ação da AGU não ultrapassa as funções do órgão governamental. "A função da AGU é funcionar como uma instituição de defesa do Estado e, nesse caso, a ação da advocacia foi no tocante do que atingia o Marco Civil. Não vejo, nesse caso, um desvio da função da AGU. Ela não defendeu o aplicativo, mas a interpretação da norma."
Para o professor, a decisão de Moraes e seus efeitos reacenderam o debate sobre democracia, internet e, mais especificamente, redes sociais. "É fundamental que o Telegram, assim como os demais aplicativos e cidadãos, se sujeitem à legislação. No entanto, é sempre importante estarmos atentos à censura".