O cantor e compositor Caetano Veloso entregou, na tarde desta quarta-feira (9/3), um documento assinado por artistas que pede ao Poder Legislativo "responsabilidade de impedir mudanças legislativas irreversíveis" contra projetos de lei que poderão corroborar com a destruição do meio ambiente, como facilitações para aumentar o desmatamento, o garimpo, o uso indiscriminado de agrotóxicos e que poderão enfraquecer a soberania de territórios indígenas do Brasil.
"O Senado tem o poder e a responsabilidade de impedir mudanças legislativas irreversíveis", alertou Caetano no discurso que fez ao entregar o manifesto. O artista está em Brasília com outros cantores e ativistas como parte do movimento Ato pela Terra, organizado por ele, em frente ao Congresso Nacional.
"O país vive hoje, sua maior encruzilhada ambiental desde a democratização. O desmatamento na amazônia saiu do controle. As proteções sociais e ambientais construídas nos últimos 40 anos vêm sendo solapadas. A nossa credibilidade internacional está arrasada. O prejuízo é de todos nós. Uma serie de projetos de lei, ora em pauta neste Congresso Nacional", pontuou.
"O dia de hoje marca uma mobilização inédita, que une um número expressivo de artistas e mais de duas centenas de organizações da sociedade civil e movimentos sociais em torno da causa ambiental", declara.
De acordo com os artistas, essas são propostas que "trazem um retrocesso tão grande que talvez não poderá mais fazer com que o ambiente volte a ser o que era antes". "Se aprovadas, essas proposições podem facilitar o desmatamento, permitir o garimpo em terras indígenas e desproteger a floresta contra a grilagem e os criminosos", acrescenta.
Caetano lembra o resultado das ações para o meio ambiente: desastres ambientais. Recebido pelo presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), o cantor lembrou ao político sobre as tragédias que ocorreram no estado que Pacheco representa, Minas Gerais. “Como mineiro, o senhor sabe bem a quantidade de sofrimento humano provocado por tragédias climáticas e ambientais. Não nos esqueçamos de Mariana e Brumadinho onde a população até hoje chora seus mortos e suas perdas”, citou.
Em seguida, lembrou de outro desastres que atingiram a Bahia e o Rio de Janeiro. “Neste ano, a minha Bahia ficou debaixo d'água e o Rio de Janeiro, estado que me acolheu, ainda recolhe o destroço da catástrofe de Petrópolis”, lembrou.
Por fim, Caetano pediu que o Senado não ceda a interesses que possam destruir "o futuro do país" e pediu que o Poder Legislativo "desperte". "[Os PLs] cedem a interesses localizados e empurram uma conta imensa à sociedade e comprometem o futuro do país. Com todo respeito e na esperança de que o Poder Legislativo desperte para o seu possível papel de levar o Brasil a iluminar o mundo, deixo em suas mãos esse documento", finalizou.
O conjunto de projetos repudiados pelo movimento foi denominado por ativistas como Pacote da destruição. Entre eles, está o Projeto de lei (PL) 191/2020 que modifica a atual legislação e legaliza a exploração mineral de terras indígenas na Amazônia.
Além de Caetano, os artistas Nando Reis, Seu Jorge, Daniela Mercury e a atriz Mariana Ximenes eram alguns dos outros integrantes do grupo presentes no Congresso Nacional no momento de entrega. Está previsto uma manifestação com a apresentação dos artistas Baco Exu do Blues, Criolo, Maria Gadú e Seu Jorge, em um trio localizado em frente ao Congresso Nacional, em Brasília.
Confira a íntegra do discurso de Caetano:
Postura pró-meio ambiente não se trata apenas de política, diz Caetano
No discurso, Caetano frisou o papel dos artistas na causa ambiental. Diferente do citado em redes sociais, ele disse, o artista deve se posicionar não para cumprir uma agenda ou uma visão do "lado político" que pertence, mas por entender a "natureza abrangente e sublime da questão ideológica".
"Como parte da sociedade civil, os artistas, em grande numero, decidiram vir até esta Casa, juntamente com membros de entidades não governamentais e especialistas em questões climáticas, para expressar sua desaprovação a esses projetos", inicia.
"A razão porque um compositor de canções dirige a palavra a vossas excelências é a notável identificação que os artistas têm com o tema do meio ambiente. Muitos artistas, que não se veem agindo por motivação explicitamente politica, se reconhecem na causa ambiental", afirmou. "Ouso dizer que isso se deve à natureza abrangente e mesmo sublime da questão ecológica. Nela, os artistas veem a busca de harmonia, a decisão sobre o sentido do humano no mundo, a luz da salvação, os poemas e quadros, as canções, tudo não se trata de outra coisa", detalha.
Caetano, porém, deixa claro que sempre se viu à esquerda do espectro político, por acreditar que "novas formas institucionais e de engrandecimento da vida em sociedade sempre pareceu coisa essencial". Mesmo com diferenças políticas, o cantor afirma que os artistas "veem na causa ambiental a totalização da inspiração e a responsabilidade do equilíbrio, como nas formas das artes".