Líderes da Câmara dos Deputados discutiram, ontem, em reunião, a votação do projeto de lei (PL) 191/2020, que libera a mineração em terras indígenas. O líder do governo na Casa, Ricardo Barros (PP-PR), já colheu assinaturas para o requerimento de urgência e afirmou que a proposta será avaliada pelos líderes e pelas bancadas nesta semana. Por ser uma PL, o governo precisa apenas de maioria simples. A deputada Celina Leão (PP-DF), que também participou do encontro, disse que os parlamentares precisam de tempo para discutir o assunto.
No mesmo dia, um grupo de oito deputados de vários partidos apresentou um pedido a Lira para que suspenda a tramitação do projeto. O requerimento é assinado por Joenia Wapichana (Rede-RR), André Figueiredo (PDT-CE), Reginaldo Lopes (PT-MG), Alencar Santana Braga (PT-SP), Renildo Calheiros (PCdoB-PE), Sâmia Bomfim (PSol-SP), Bira do Pindaré (PSB-MA) e Wolney Queiroz (PDT-PE).
Nos bastidores, o deputado Rodrigo Agostinho (PSB-SP) afirmou ao Correio que, para costurar o projeto, o presidente da Câmara se reuniu com líderes na residência oficial. "Tirou a discussão de dentro do Congresso e levou para a casa dele. Quando o colégio de líderes é aqui (Câmara), todos entramos no colégio de líderes. Lá, não", apontou. Ainda de acordo com o parlamentar, Lira manteve a votação remota. "Esvaziou o plenário. Os deputados votam de casa e recebem o alinhamento 'o governo quer que vote assim'. Assim, eles têm maioria. Assim que funciona", reclamou.
O deputado Nilto Tatto (PT-SP) explicou que ainda há uma pressão do governo pela aprovação do projeto de lei. "Empresas de mineração estrangeiras e nacionais querem abrir o precedente. Esse é um PL inconstitucional. Bolsonaro fala em potássio utilizando a crise da Ucrânia, o que é mentira", criticou. Do jeito como está desenhado, se aprovado, o Estatuto do Índio de 1973 deve perder o artigo que restringe aos indígenas a exploração de riquezas em suas terras. (Art 2°. Parágrafo IX).
Aos jornalistas, o deputado André Fufuca (PP-MA) disse que estava na Câmara para saber como andava a "situação" das bancadas. De acordo com Agostinho, a pauta do que seria votado no plenário contemplava o Dia Internacional das Mulher, algo que ele não discorda, mas observou: "Lira pode incluir, a qualquer momento, a votação da urgência do projeto (da mineração em terras indígenas) e, posteriormente, pode colocar para votar o mérito do projeto. Se aprovada a urgência, não precisa passar por comissão nenhuma. A oposição está unida contra o tema, mas não temos mais que 150 votos contra a matéria. Do outro lado, difícil achar quem vote contra".
O PL foi enviado em 2020 pelo então ministro da Justiça, Sergio Moro, e por Bento Albuquerque, chefe da pasta de Minas e Energia. Na época, a Câmara era presidida por Rodrigo Maia, que não pautou a matéria. Agora, sob a presidência de Lira, o texto volta à mesa para negociação. Ele já afirmou que os deputados precisam de coragem para debater o assunto.
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Inconstitucional
No documento assinado pelo grupo de parlamentares contrários ao projeto, eles afirmam que o PL "apresenta problemas evidentes de inconstitucionalidade e injuridicidade, como o disposto no art. 37 e afronta o Regimento Interno da Câmara". Segundo os deputados, a proposta do Executivo desconsiderou a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, do qual o Brasil é signatário, com relação à consulta tornada obrigatória pela referida Convenção, portanto, que não abrange apenas os processos administrativos decorrentes da legislação, incluem também as "medidas legislativas".
"Não houve consulta formal às comunidades indígenas ou seus representantes para a elaboração do PL nº 191/2020, conflitando com os compromissos internacionais firmados pelo Brasil. Igualmente, não se considerou o artigo 19 da Declaração das Nações Unidas para os Direitos dos Povos Indígenas", alegam.
Potássio
Em linha com o conflito na Europa, a escassez de fertilizantes pode atrapalhar a produtividade no agronegócio. O potássio (cloreto de potássio) pode ser usado como fertilizante e este tem sido o discurso para a tramitação do PL. O jornal O Estado de S.Paulo, a partir de um levantamento feito por dados da Agência Nacional de Mineração (ANM), mostrou que a maioria das minas de potássio estão localizadas fora das áreas indígenas. O presidente Jair Bolsonaro (PL) tem defendido a exploração das terras para atenuar a dependência brasileira dos defensivos agrícolas russos.
"O solo brasileiro é pobre quando se trata de potássio e ele é importante para a produtividade de soja, o que interessa ao agronegócio. "O escândalo é que conseguimos mostrar que o potássio, que está sendo usado como motivo para pautar o texto, não está nas terras indígenas", finalizou Rodrigo Agostinho.
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