A candidatura do governador de São Paulo, João Doria (PSDB), à Presidência continua sangrando. O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, está costeando o alambrado para deixar o PSDB e se lançar candidato ao Palácio do Planalto por outra legenda. Na segunda-feira, a sua conversa com o ex-prefeito de São Paulo Gilberto Kassab, presidente do PSD, foi nessa direção.
Não é uma decisão fácil, por duas razões: 1) Leite participou das prévias, apesar do jogo bruto de Doria; e 2) desde pica-paus e maragatos, a tradição gaúcha recomenda não mudar de lado. Entretanto, o governador é um político que rompeu muitos paradigmas da tradição política gaúcha.
Kassab é um líder político em busca de um candidato para chamar de seu. Construiu com muito êxito um dos partidos mais importantes do país. Como a candidatura presidencial do senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG) não decolou, busca uma alternativa. Uma hipótese aventada por Kassab seria o apoio ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) já no primeiro turno, mas essa alternativa encontra resistência nas bancadas da Câmara e do Senado.
Além disso, Lula praticamente consolidou o nome do ex-governador Geraldo Alckmin (sem partido) como vice. A única possibilidade de acordo com o PT seria a filiação de Alckmin ao PSD, mas isso aprofundaria as divergências do PT com o PSB, que já havia convidado o ex-governador paulista e foi protagonista de sua aproximação com Lula.
Kassab conseguiu construir um partido com 35 deputados e 11 senadores, mas avalia que a única forma de mantê-lo unido seria com uma candidatura própria. Nessa caminhada, já consolidou a filiação do ex-governador do Espírito Santo Paulo Hartung, ele próprio uma opção de pré-candidatura.
Ontem, Eduardo Leite esteve com o político capixaba, que manifestou disposição de compor a chapa como vice e classificou o governador como o "melhor dessa geração". Kassab considera a dobradinha Leite-Hartung uma grande chapa. Entretanto, para que o gaúcho se torne o candidato do PSD, é preciso garantir que sua candidatura será mantida até as eleições.
Para Doria, a saída de Leite pode ser um golpe de morte. O tucano ganhou as prévias no jogo bruto, surpreendendo a velha guarda do partido, que preferia o governador gaúcho. Tucanos históricos como Tasso Jereissati (CE), José Aníbal (SP), Aécio Neves (MG) e Aloysio Nunes Ferreira (SP) já desembarcaram de sua candidatura.
A permanência de Leite funcionaria como um muro de contenção da debandada tucana. Mas, para isso, precisaria ser candidato à reeleição, como chegou a ser noticiado — mas não é essa a decisão do gaúcho.
Saiba Mais
Federações
Para compensar as dificuldades internas, Doria trabalha intensamente para ampliar suas alianças, por meio de uma federação. Apesar de contar com a simpatia do presidente do Cidadania, Roberto Freire, a federação com a legenda enfrenta muitas dificuldades, porque tem uma engenharia muito complexa, e há resistências. Com o MDB a situação é a mesma. Além disso, os dois partidos mantêm candidatos, Alessandro Vieira (SE) e Simone Tebet (MS), respectivamente, ambos em empate técnico com Doria nas pesquisas de intenções de votos.
Nada disso, porém, fará o governador de São Paulo jogar a toalha. Doria trabalha intensamente para reduzir sua rejeição junto ao eleitor paulista, a partir de um grande volume de entrega de obras e serviços. Por razões que alguns atribuem à superexposição durante a pandemia, outros à imagem consolidada do Butantã como produtor de vacinas, a intensa atuação de Doria na pandemia não teve o impacto eleitoral que o político paulista gostaria. Ao contrário, desgastou sua imagem.
Nenhum candidato paulista tem chances reais de vitória sem alavancar sua candidatura no próprio estado. Doria sempre venceu as eleições largando em grande desvantagem nas pesquisas, mas com um amplo arco de alianças. Aposta, ainda, numa candidatura de terceira via, que unifique o centro, embora esteja em grande desvantagem em relação ao ex-ministro da Justiça, Sergio Moro (Podemos), e ao ex-governador Ciro Gomes (PDT).
De um modo geral, a formação de federações é um processo complexo. O peso da política regional e as características dos partidos dificultam os acordos nos estados, além do fato de que engessam as alianças por quatro anos, com eleições municipais no meio desse processo. Os partidos tentam estabelecer regras de jogo que garantam um justo equilíbrio entre eles, mas isso também restringe as possibilidades de renovação, favorecendo os detentores de mandato.
Um outro fator é a existência do fundo eleitoral, que induz à federação, porque reduz o número de candidatos e garante mais possibilidades de reeleição para seus parlamentares.