O presidente Jair Bolsonaro (PL) sancionou o Orçamento de 2022 vetando R$ 3,18 bilhões de despesas discricionárias e emendas de comissões, mas mantendo gastos eleitoreiros, em um claro sinal, segundo analistas, de que está disposto a tudo para se reeleger. Isso ficou claro no atendimento às demandas do Centrão, cujo principal líder, o ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, é quem agora dá a palavra final sobre a peça orçamentária.
Conforme os dados da Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2022, publicada, ontem, no Diário Oficial da União (DOU), Bolsonaro manteve intacta a verba de R$ 16,5 bilhões das emendas do relator — jabuticaba criada pelo atual governo e utilizada como margem de manobra para agradar a base parlamentar, o chamado "orçamento secreto". Além disso, não mexeu nos R$ 4,9 bilhões do fundão eleitoral que, inicialmente, era para ser de R$ 2 bilhões. Ele também manteve a reserva de R$ 1,7 bilhão prevista para o reajuste de policiais, que insuflou o movimento de diversas categorias de servidores por recomposição salarial. O Ministério da Economia havia recomendado um corte de R$ 9 bilhões para ajustes orçamentários. Procurada, a pasta não comentou o assunto.
Nas últimas eleições gerais, em 2018, o orçamento para o fundo eleitoral foi de R$ 1,7 bilhão, menos da metade dos quase R$ 5 bilhões previstos para este ano para os partidos financiarem seus candidatos. Enquanto isso, despesas com pesquisas tecnológicas, educação básica, preservação do meio ambiente, prevenção a incêndios florestais e combate à violência contra mulheres foram reduzidas.
"O corte no Orçamento ficou abaixo do que era recomendado pela equipe econômica para recompor receitas superestimadas. Isso mostra que haverá necessidade de cortar mais despesas ao longo do ano, porque, como a economia não deverá crescer, será preciso usar recursos além da margem que os técnicos costumam reservar para as manobras", disse Juliana Damasceno, da Tendências Consultoria, citando as despesas de ministérios que acabam não sendo executadas, os chamados empoçamentos.
Blindagem
Na avaliação da economista, o Orçamento mostra a falta de planejamento dos gastos públicos, apesar da margem de manobra reduzida, uma vez que 93% das despesas são obrigatórias. "Houve uma blindagem para os gastos eleitoreiros. Certamente a questão eleitoral passou à frente de outras agendas que deveriam ser prioritárias, porque importantes para garantir um crescimento mais sustentável do país, como a educação básica. Os gastos para fundo eleitoral e emendas do relator são de curto prazo e não devem ter impacto na atividade", lamentou Juliana Damasceno.
O especialista em contas públicas Felipe Salto, diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI), do Senado Federal, ressaltou que o espaço aberto para o reajuste de policiais deixado por Bolsonaro no Orçamento, assim como os cortes de quase R$ 3,2 bilhões, podem ser usados para correções salariais. "Como isso será usado ainda é uma incógnita, mas provavelmente, em gasto com pessoal", afirmou. Para Salto, do ponto de vista macrofiscal, "a preocupação é com os reajustes que serão engendrados e o que podem incentivar a partir de 2023".
O Ministério da Economia também evitou comentar a possibilidade de o presidente conceder o aumento salarial prometido aos policiais que, de acordo com analistas, precisaria ser confirmado até março, a fim de respeitar a lei eleitoral. Juliana Damasceno, da Tendências, lembrou que, de acordo com a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), Bolsonaro não poderá conceder nenhum aumento de gasto com salários neste ano, mesmo se vencer as eleições. "Existe uma trava na LRF, que os governantes de autorizar reajuste no último ano de mandato. Logo, se conceder reajuste vai criar uma instabilidade tanto do ponto de vista institucional, porque as demais categorias vão reivindicar também um aumento, quanto do ponto de vista fiscal", alertou. De acordo com a analista, o R$ 1,7 bilhão reservado para os policiais não é suficiente para recompor as perdas inflacionárias da categoria.
Vale lembrar que muitos servidores estão sem reajuste desde 2017, e a defasagem chega a 28,15%, segundo cálculos de sindicatos. Considerando que cada 1% de aumento para todos os servidores implica R$ 3 bilhões ao ano de despesas adicionais, o custo do reajuste integral desse percentual para todo o funcionalismo seria superior a R$ 80 bilhões.
O Orçamento deste ano é o maior da história, pois prevê R$ 4,730 trilhões em despesas, incluindo o refinanciamento da dívida pública. Entre os gastos previstos, estão R$ 89,1 bilhões destinados ao Auxílio Brasil, programa que tomou o lugar do Bolsa Família. A previsão de deficit primário ficou em R$ 79,3 bilhões, abaixo da meta determinada pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que permite rombo de até R$ 170,5 bilhões nas contas do governo federal.