Grupo conhecido por não ter amarras ideológicas e transitar entre diferentes núcleos políticos, o Centrão foi o maior beneficiado no Orçamento deste ano, sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro (PL). Os partidos PP, PL e Republicanos controlarão mais de R$ 149,6 bilhões. O montante é maior do que o orçamento estimado para os ministérios da Defesa (R$ 116,3 bilhões) e da Educação (R$ 137 bilhões). É a primeira vez que um volume tão grande de recursos fica nas mãos de apenas três legendas.
Economista e integrante do Conselho Regional de Economia (Corecon-DF), Guidborgongne Nunes definiu como "irracional, desintegrada e desorganizada" a delegação das verbas às siglas. "Prevaleceram lógicas particulares diante do interesse público. Cortaram recursos do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) e da educação para garantir emendas particulares. Um Orçamento federal, nesse contexto, não está vinculado a políticas de desenvolvimento", reprovou. Ele ainda criticou a falta de rigor da peça. "É uma irracionalidade se orçar R$ 140 bilhões com base em emendas parlamentares."
O professor de ciências políticas do Ibmec Brasília Rodolfo Tamanaha destacou que Bolsonaro se rendeu ao Centrão, mas não tem a segurança de contar com o grupo político caso corra o risco de perder as eleições. "O Centrão é reconhecido como um conjunto de partidos que não é muito fiel. Exatamente porque não existe uma adesão ideológica, o ponto de vista deles é muito mais pragmático", disse. Por isso, Tamanaha acredita que, caso chegue o período eleitoral e Bolsonaro esteja mal nas pesquisas, é provável que haja dispersão.
Para Melillo Dinis, analista político do portal Inteligência Política, "o Centrão cresce por conta do fracasso do governo em estabelecer qualquer tipo de governança". "A fatura do controle da pauta do impeachment está sendo cobrada em parcelas", afirmou, em relação à série de pedidos de impedimento contra Bolsonaro protocolados na Câmara.
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Fragilidade
O cientista político e professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) Ricardo Ismael também mencionou os pedidos de impeachment contra o chefe do Executivo. "O bloco percebeu a fragilidade do presidente e tem colocado as cartas na mesa, exigindo cada vez mais recursos fundamentais nesse processo de reeleição de deputados federais, senadores. O Orçamento reflete esse poder, que é consequência dessa procura por blindagem no Congresso."
Ele também avaliou que, a se manter essa queda de popularidade do presidente, o grupo político o abandonará. "O Centrão não tem vocação para pular no abismo. O presidente pode ser ainda competitivo no segundo turno, mas, lá chegando, tem poucas chances, se forem mantidas as condições atuais", disse. "O Centrão vai seguir sua tradição: vai sugar o máximo possível de recursos do governo e, mais para a frente, decidirá qual candidatura é mais competitiva no primeiro turno."
Duas perguntas para...
Pela primeira vez, um montante dessa magnitude, de R$ 149,6 bilhões, está na mão de apenas três partidos, da base do Centrão. O que isso traduz, em termos de momento econômico e político que o Brasil vive?
Vejo isso como reflexo da eleição de 2018, na qual a classe política sofreu um terremoto com essa onda de descontentamento contra partidos políticos, contra o sistema, e levou a uma taxa de renovação histórica no Senado e na Câmara. Então, nos últimos três anos, a gente está vendo a reação dessa classe política que se sentiu muito insegura com a sua posição e seu potencial de reeleição. E isso foi expressado por meio de um movimento do Congresso se apropriando de um controle maior do Orçamento, do aumento no volume de emendas parlamentares e do fundo eleitoral. Eles chegaram à conclusão de que a quantidade de recursos que tinham não era suficiente para garantir a reeleição.
Que impacto esse domínio do Centrão no Orçamento deve exercer na política brasileira?
Acho que vai impactar no índice de reeleição de parlamentares. Por duas razões: não só porque deputados e senadores terão mais recursos para contemplar suas bases, mas porque o que vai guiar a eleição, agora, é a preocupação com emprego e renda.
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