Em artigo publicado nesta quarta-feira (5/1) no jornal Folha de S. Paulo, o ex-ministro da economia, Guido Mantega, apresentou ideia do direcionamento que Lula pretende dar ao plano econômico de sua campanha no ano que vem. Primeiro, Mantega atacou a campanha de Bolsonaro, a classificando como um “enterro”, que será assistido nas eleições. Em sua opinião, a economia bolsonarista está “estagnada” e se manterá assim.
“Se for feita uma autópsia no cadáver do bolsonarismo, serão descobertos fortes indícios de um neoliberalismo anacrônico, que não é mais praticado em nenhum país importante do mundo”, escreveu.
Para o ex-ministro, esse ano será de permanência do desemprego alto, aumento da fome, da pobreza e o avanço da pandemia que afetará diretamente as exportações brasileiras, contribuindo para o escape de investimentos estrangeiros e uma inflação que poderá paralisar a economia.
“Em vez de colocar o Estado em campo para socorrer as vítimas da crise e estimular a retomada do investimento, como fizeram os países do G20, o governo Bolsonaro reduziu o auxílio emergencial de 2020 para 2021, e vem diminuindo o investimento público desde o início do seu governo. Essa situação dramática, produzida pela política econômica do ministro Guedes, contrasta com o desempenho da política econômica social desenvolvimentista dos governos Lula e Dilma”, continuou.
Respostas
A opinião causou repercussão entre os adversários. Ciro Gomes e Sérgio Moro, principalmente, se manifestaram em suas redes sociais pontuando omissões feitas por Mantega em seu texto, principalmente ao que se refere a sua própria gestão.
“Impressão minha ou Pós-Itália nega ou omite que a nova matriz econômica (agora será a novíssima?!) gerou a grande recessão de 2014-2016 durante o Governo do PT?”, indagou Moro, pelo Twitter.
Citando os governos em que o PT esteve à frente, Ciro questionou a ausência de um "mea culpa" por parte do ex-ministro ao comentar sobre a crise econômica estrutural pela qual o país passa. Chamou a opinião de Mantega de “hipócrita e ambígua”.
“Se o Brasil depender destes senhores para sair do atoleiro, vamos afundar de vez. A questão central – mudança do modelo econômico – vira uma pergunta minúscula e covarde. Esconde vergonhosamente Dilma, manipula números e transfere toda culpa para o execrável e igualmente culpado Bolsonaro. Ou seja, fugindo das suas culpas que são imensas, o lulismo já reedita o famoso álibi da "herança maldita", agora com sinal invertido e duplicado. Quem temia que a proposta econômica do petismo fosse o "mais do mesmo" ficou ainda mais frustrado: é o "menos do mesmo"”, disse.
Especialistas
No artigo, Guido Mantega faz uma crítica ao neoliberalismo, defendido por Paulo Guedes, e defende o social desenvolvimentismo, que começou a ser praticado no fim do segundo mandato de Lula e seguiu no governo Dilma - porém, não a cita em seu texto. Em um trecho, comentou que “os governos Lula foram marcados pela elevação dos investimentos e por uma política fiscal responsável”.
“Os governos neoliberais reverteram parte desses avanços sociais e econômicos. O governo Temer fez a reforma trabalhista que reduziu direitos e salários, e ainda aprovou a lei do teto de gastos, que produziu inúmeras distorções na gestão orçamentária. As gestões fiscais dos governos Temer e Bolsonaro foram um desastre que, desde 2016, só acumulou déficits primários”, detalhou.
Antônio Carlos Alves, professor de economia PUC São Paulo, explica que existe uma divisão e embate dentro da lógica desenvolvimentista. Eles são separados entre novo e social - esse último é usado pelo PT. O novo dá uma importância grande à parte fiscal, mas não à social. O outro é o contrário. Para o especialista, o que Ciro defendeu em sua crítica foi a separação entre essas duas ideologias econômicas.
“O Guido não reconheceu que a crise começou no governo Dilma, mas não é só ele que não reconhece. Se pegar os trabalhos do campo [social desenvolvimentista] eles não reconhecem. O erro dele [Mantega] foi em defender o social desenvolvimentismo. O grupo com o Ciro está preocupado em mostrar que são responsáveis pela matéria fiscal”, apontou Alves.
Professor do departamento de economia da Universidade de Brasília (UnB), José Luís Oreiro, acredita que a opinião do ex-ministro segue os mesmos erros que foram praticados nos antigos governos.
“A ideia de que basta acabar com o governo Bolsonaro pra que a economia volte a crescer é sem sentido. Isso não é verdade. Como também não era verdade o discurso criado no impeachment de Dilma, de que o país voltaria ao normal. Também não aconteceu. Isso é um posicionamento político e não técnico. Você precisa de um programa de governo, projeto de país que até agora o PT não apresentou. O que vi no artigo foram os mesmos erros que eles cometeram no passado”, argumentou.
Para Alves, a omissão sobre as falhas no governo Dilma são naturais ao se olhar o aspecto da defesa política. No seu ponto de vista, Lula colocou o Guido para ser criticado, porque estrategicamente é melhor um assessor econômico receber a repercussão negativa que o próprio candidato.
Em sua opinião, o mais urgente para o próximo presidente é se preocupar em ter uma equipe econômica que dialogue com o mercado. “O próximo presidente tem um desafio enorme que é colocar a casa em ordem e isso requer colocar alguém que tenha facilidade de dialogar com o mercado. O mercado não tem apreço pelos desenvolvimentistas. Na visão de boa parte dos economistas, não têm dado suficiência à responsabilidade fiscal, tomam como exemplo o governo Dilma. O que se formou no pós-Dilma é a resposta da seguinte pergunta: como você vai financiar os gastos sociais? Se não tiver essa resposta vai se criar dívida pública para as gerações futuras”, detalhou.
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