A batalha dos servidores públicos contra o Palácio do Planalto, após a inclusão de um reajuste salarial de R$ 1,7 bilhão para policiais federais no Orçamento de 2022, terá mais um capítulo hoje. Nesta quarta-feira, a elite do funcionalismo se reúne para discutir uma greve geral. A intenção é pressionar por um aumento salarial para outras categorias. Os servidores do Banco Central, por sua vez, se preparam para apresentar um pedido geral de exoneração dos cargos comissionados. Eles pretendem repetir o movimento de protesto que ocorreu na Receita Federal na semana passada. Auditores fiscais abriram mão de mais de 700 cargos de chefia, com impacto nos serviços alfandegários do país.
De acordo com Rudinei Marques, presidente do Fórum Nacional das Carreiras de Estado (Fonacate), o Orçamento Público aprovado pelo Congresso Nacional apresenta graves distorções, que precisam ser corrigidas. Ele cita as emendas de relator (RP9) e o Fundão Eleitoral. Nas contas de Marques, ao somar os dois valores, seria possível "uma recomposição salarial linear para os servidores civis na ordem de 10%".
O Fonacate concentra 37 associações e sindicatos de carreira de Estado, das quais 30 são a nata do funcionalismo, como diplomatas e peritos, bem como servidores do Tesouro Nacional, Controladoria Geral da União e da Receita Federal. As entidades reúnem mais de 200 mil servidores públicos associados.
O chefe da entidade considera a greve geral um instrumento para pressionar o governo. "Nossa mobilização vai questionar esse acréscimo de mais de R$ 16 bilhões para o Orçamento secreto (por meio de emendas parlamentares) e mais de R$ 4 bilhões para o Fundo Eleitoral. Erros como o governo federal está repetindo fizeram com que a rubrica de precatórios atingisse R$ 89 bilhões. Algumas entidades já pensam em cobrar na Justiça a recomposição salarial anual prevista na Constituição Federal", afirmou Marques.
Os servidores do Judiciário compõem uma das categorias que avaliam levar à questão aos tribunais. Costa Neto, coordenador-geral do Sindjus-DF, afirmou que a possibilidade de acionar o Supremo Tribunal Federal (STF) é iminente. "Já está deliberado no sentido que deveremos atuar, sim, por meio de judicialização, e vamos levar à categoria a proposta que sair amanhã com o Fonacate", disse.
De acordo com Costa Neto, as perdas salariais dos servidores já ultrapassam 50% em relação aos reajustes conquistados. A falta de previsão para a categoria no Orçamento gerou descontentamento geral. "É uma medida injusta e não condiz com a realidade, pois todos os servidores públicos, neste momento, estão com seus salários defasados em função da inflação galopante que estamos vivenciando no nosso país", afirmou.
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Debandada
Os servidores do Banco Central, representados pelo Sinal, pretendem aderir à debandada de cargos de chefia tal qual fez a Receita Federal na semana passada. De acordo com Fábio Faiad, presidente da entidade, independentemente da paralisação — que será definida na reunião de hoje — os cargos de chefia serão entregues. "A ideia é sinalizar ao governo que não dá para continuar administrando o banco assim, pois a disparidade salarial é grande, e o pessoal está desmotivado", afirma o sindicalista.
"Os concursos para delegado e perito da Polícia Federal estarão muito mais atrativos, já a partir do ano que vem. Assim, os servidores do Banco Central ficarão mais desmotivados e vão fazer outro concurso e sair [do BC]. Vamos fazer uma lista de entrega [de cargos], vamos abrir mão de ajudar a administrar o banco, pois, dessa forma, não dá", frisou.
Segundo Faiad, a insatisfação entre os servidores pode comprometer 500 cargos de comissão gerencial. O presidente da entidade também considera possível uma judicialização, porém, uma batalha nos tribunais só deve ocorrer após esgotadas as tentativas de diálogo. "No último caso [vamos judicializar], porque a gente quer pressionar para que o reajuste seja para mais carreiras, a fim de atender a todas as pessoas. Esta é uma solução política", disse.
As paralisações nos órgãos federais afetam diretamente a máquina pública. No caso da Receita Federal, a mobilização dos servidores atinge alfândegas, portos, aeroportos e pontos de fronteira do país, gerando maior lentidão nas importações e exportações. Em nota divulgada ontem, o Sindifisco prevê maior demora no fluxo do comércio exterior do país. "Os auditores também concordaram em não participar de operações nem reuniões externas de trabalho. Além disso, serão suspensas as reuniões da Comissão Local de Facilitação do Comércio Exterior (Colfac), com integrantes de vários órgãos governamentais e intervenientes do comércio exterior", informa o sindicato. "Em conjunto com as demais aduanas do país, que também estarão em operação-padrão, poderá ocorrer a lentidão na liberação de mercadorias e o desabastecimento no mercado", detalha a nota divulgada.
A revolta do funcionalismo começou após a aprovação do Orçamento de 2022, que direciona R$ 1,7 bilhão para reajuste dos salários de policiais federais, civis e da polícia penal. A proposta é uma tentativa do presidente Jair Bolsonaro (PL) em manter o voto da categoria nas próximas eleições.
Procurados pela reportagem, o Ministério da Economia e a Receita Federal informaram que não irão comentar sobre o assunto de reajuste dos servidores.
*Colaborou Jéssica Andrade