O Congresso Nacional tem um desafio para 2022: cumprir o papel de legislar em um ano eleitoral. Enquanto o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), considera importante o Legislativo avançar na deliberação de temas importantes para o país, parlamentares convidados para o Desafios 2022 preveem dificuldades. Além da eleição, que forçosamente afeta o trabalho de deputados e senadores, há um outro obstáculo: a inabilidade do governo em articular a aprovação de matérias relevantes.
Rodrigo Pacheco deixou claro que o debate eleitoral não é sua prioridade no momento. Ele ressaltou que, antes de falar de questões de fundo, é importante tentar resolver problemas emergenciais. “Urge no Brasil a solução imediata de problemas como a PEC dos Precatórios e o Auxílio Brasil”. Pacheco defendeu que a PEC “foi a solução possível para solucionar o precatório e o respeito ao teto de gastos” e considerou a etapa como vencida. “Nossa principal preocupação era dar sustentação a essas famílias”, relata.
Apesar de não querer se aprofundar no debate eleitoral, Pacheco destacou a necessidade de, durante a corrida presidencial, haver compreensão das pautas de interesse comum, que devem ser priorizadas. Citou, por exemplo, o combate à fome e à miséria. “O melhor programa social de uma nação civilizada é a geração de emprego, que se dá com o estímulo ao empresariado, através de um sistema tributário que seja adequado, com todos os projetos possíveis de desburocratização”, disse o presidente do Senado. Dentre os principais caminhos para solucionar as questões do país, estão, na opinião do parlamentar, as reformas administrativa e tributária.
Pacheco destacou a importância de uma liderança na condução desses processos de mudança. “Essa liderança passa, necessariamente, por uma boa relação institucional. Um líder nacional precisa ter, de fato, uma boa interlocução com os poderes da república, especialmente com o Congresso Nacional”, disse.
Acordo imoral
Pré-candidata do MDB à Presidência da República, a senadora Simone Tebet (MS) demonstrou ceticismo em relação aos trabalhos legislativos. Disse não acreditar que o governo aprove reformas em 2022, após o “desastre”, na avaliação dela, com a votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos Precatórios, promulgada na última quarta-feira.
Segundo a parlamentar, a promulgação da PEC dos Precatórios foi “imoral”. “Nunca vi acordos não serem cumpridos”, lamentou. Para ela, depois desse episódio, não existe a possibilidade de o governo aprovar projetos no ano que vem. “Não estou pronta para votar nenhum projeto do governo, porque vai sair pior do que entrou, na sanha de apresentar qualquer coisa e fazer qualquer negócio visando a reeleição”, afirmou.
A senadora também não poupou críticas às polêmicas emendas do relator, as RP9, que foram mantidas. No ano que vem, elas somam mais de R$ 16 bilhões em recursos, que ficarão na mão de um único parlamentar em um orçamento bastante restrito para gastos não obrigatórios. “Uma única pessoa tem na mão mais do que os recursos do presidente da República”, comparou Tebet.
“O que estamos vendo com a RP9 foge a tudo e qualquer lógica no quantitativo e na forma”, alertou. Para ela, há dois “pontos nefastos” para a manutenção dessas emendas: garantir lobbies ilegítimos e permitir que alguns políticos possam se sobressair no processo eleitoral de 2022.
A senadora criticou ainda o espaço fiscal, de R$ 62 bilhões, criado com a aprovação da PEC dos Precatórios, de forma fatiada, sem nenhuma vinculação. “Seria para matar a fome das pessoas, e para a saúde pública e para a Previdência”, afirmou a senadora, ao lado do vice-presidente da Câmara, o deputado Marcelo Ramos. “A batata quente está na sua mão”, ironizou, em referência ao pedaço restante da PEC que não foi promulgado.
A parlamentar reforçou que os projetos do governo enviados ao Congresso estão sendo aprovados piores do que chegam. Citou como exemplo o caso da MP da privatização da Eletrobras. Ela ainda defendeu a privatização de estatais de forma mais seletiva e afirmou que é contra a privatização dos Correios, prometida pelo governo para 2022.
“Somos contra a privatização dos Correios. Tem que começar com as (estatais) que dão deficit e fazer uma modulação por categoria, e se (elas) precisam ou se são necessárias para a soberania nacional”, afirmou.
A pré-candidata do MDB não poupou críticas ao presidente Jair Bolsonaro (PL). Ela lamentou o fato de que o Brasil não deverá crescer no ano que vem porque o atual governo está tomando “medidas equivocadas”.
“Temos um governo que desconhece o país e que não tem responsabilidade social. Temos um governo que não conhece as nossas mazelas, não conhece o tamanho da nossa desigualdade e a nossa diversidade”, disse.
A senadora apontou como uma das principais qualidades do Brasil a sua diversidade. Segundo ela, a diversidade “é a liberdade de todos serem o que quiser e acreditarem no que quiser, dentro das regras constitucionais”.
Críticas à antiagenda
O ano eleitoral irá travar a votação de qualquer reforma administrativa e tributária no Congresso Nacional. A avaliação é do vice-presidente da Câmara dos Deputados, Marcelo Ramos (PL-AM), durante o Desafios 2022. De acordo com o parlamentar, a tendência é a Casa tratar de temas menos polêmicos.
Na avaliação do deputado, não há “ambiente” para a aprovação de reformas, pois governo federal, Congresso e sociedade estão com agendas distintas. “Quando você vê o parlamento com uma agenda, o Executivo com outra agenda, a sociedade com outra agenda, tem tudo para não sair nada”, comparou.
Ele citou como exemplo a PEC 32. “A reforma administrativa: primeiro o texto é muito ruim. Segundo, o presidente não tem nenhum compromisso, e por um motivo simples: um elefante não vira um gato se você for no cartório e registrar com nome de gato. Ele continua sendo um elefante. Alguém que tem 28 anos de vida pública, comprometido com as pautas corporativas mais atrasadas do país, não vira um liberal só porque vestiu uma capa de liberal para disputar a eleição”, criticou.
Marcelo Ramos se disse cético em relação a projeções econômicas. “O mercado financeiro projeta para ganhar. Começa o ano bombando. Mas tem um lastro que é o resultado das empresas reais e vai cheg ando o final do ano e vão ajustando os números”, comparou o deputado.
“Não acho que esse governo tem a capacidade de reduzir o risco de confirmação de um crescimento ínfimo no ano que vem, os investidores irão se recolher até a definição do próximo presidente”, frisou.
Ramos criticou a política econômica do governo Bolsonaro. “O governo tem uma antiagenda econômica; tem uma agenda absolutamente contraditória com o que precisa ser feito. Reduzir a inflação impedindo as pessoas de comer é muito fácil. Não precisa fazer um curso de economia para isso. É uma lógica nefasta, pois leva à fome, à miséria e ao desemprego.” (CN)
*Estagiária sob a supervisão de Carlos Alexandre de Souza