Após a aprovação da PEC dos Precatórios no Senado, ontem, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), detalhou como será a nova tramitação da matéria entre os deputados. Ele afirmou que os pontos do texto que forem consenso nas duas Casas poderão ser desmembrados e promulgados ainda neste mês pelo Congresso. As demais partes, explicou, deverão tramitar normalmente pelas comissões antes de irem ao plenário da Câmara.
A PEC dos Precatórios é a aposta do governo para viabilizar o Auxílio Brasil de R$ 400, em substituição ao Bolsa Família. Segundo estimativas do Ministério da Economia, a proposta poderá abrir um espaço fiscal de R$ 106 bilhões no Orçamento de 2022. Para isso, o texto muda o cálculo do teto de gastos e adia o pagamento de parte dos R$ 89 bilhões que estão previstos para serem quitados no ano que vem na forma de precatórios — dívidas da União reconhecidas pela Justiça.
A PEC foi aprovada, ontem, em dois turnos no Senado, com placares folgados. No primeiro, foram 64 votos a 13; no segundo, 60 a 10. Esse resultado foi alcançado depois que o relator da proposta, senador Fernando Bezerra (MDB-PE), líder do governo na Casa, promoveu alterações no parecer, a pedido de vários partidos.
Em uma das mudanças, o relator deu caráter permanente ao Auxílio Brasil, que tinha vigência apenas até dezembro de 2022, conforme previa o texto originalmente aprovado pela Câmara. Bezerra também concordou em vincular todo o espaço fiscal aberto pela PEC ao pagamento do novo programa e das despesas da Seguridade Social — Saúde, Previdência Social e assistência social. Entre outras mudanças, o senador antecipou, de 2036 para 2026, a revisão do subteto para pagamento de precatórios. Em razão dessas alterações, a matéria retorna para nova análise da Câmara.
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Comissões
Lira comentou sobre os próximos passos da tramitação da PEC. "Qualquer alteração muito substancial, nós não temos a condição legislativa de trazer para o plenário. Então, vamos ver o texto comum das duas Casas. Esse texto comum deve ser promulgado pelas duas Mesas, e o que sobrar terá de ir para a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), terá de ter admissibilidade, ir para a comissão especial para voltar ao plenário por duas votações", listou. Ele acrescentou não crer "que, este ano, o que não for comum possa ser votado".
O deputado assegurou "o máximo esforço para que o texto comum das duas Casas seja promulgado o mais rapidamente possível, para permitir que mais de 20 milhões de famílias brasileiras recebam o auxílio, para permitir que o orçamento do governo federal não seja totalmente utilizado pelos precatórios no ano de 2022".
O presidente da Câmara ressaltou ser comum o desmembramento de propostas de emenda à Constituição. "É muito normal, já aconteceu diversas vezes, que textos comuns entre as duas Casas possam ser, logicamente, promulgados, e o que não for possível nem entendido como emenda de redação tem de ter uma avaliação. O fato de aprovar ou não é uma questão superveniente", declarou.
Ele assegurou, ainda, que não há qualquer tipo de supremacia entre as duas Casas do Congresso. "Nós deixamos o Senado legislar, como é regimental, e vamos agora fazer o máximo de esforço possível para conhecer quais são as alterações — porque, definitivamente, nós não conhecemos — para analisarmos juntos", frisou Lira, que ontem tinha agendada uma reunião sobre o assunto com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
Preocupação
No Senado, é grande a preocupação com a possibilidade de os deputados retomarem o texto original da PEC. Para o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), a expectativa é de que a Câmara aproveite o trabalho feito pelo Senado em parceria com o governo. "Temos convicção de que o texto melhorou e, mesmo discordando no mérito, na forma escolhida pelo governo para viabilizar o Auxílio Brasil, foi possível construir um bom texto, com votos suficientes a favor. Não dá para prever mais gastos fora do teto", sustentou Vieira.
Segundo o parlamentar, vincular qualquer sobra de orçamento, até 2026, para as famílias carentes garante que não tenha espaço para "manobras eleitoreiras". "Não tem nenhum tipo de privilégio, benefício setorial, emendas parlamentares. O que precisamos é nos concentrar no momento que a gente vive, na fome das pessoas. O texto preenche bem isso e gera conforto para os deputados votarem também", enfatizou.
Na avaliação de Juliana Damasceno, economista da Tendências e pesquisadora associada do FGV IBRE (Instituto Brasileiro de Economia), houve uma mudança de percepção sobre a PEC. "No início, a proposta foi recebida com bastante desconfiança por parte do mercado, porque oficializou o rompimento do teto (de gastos). Aprovação de medidas especialmente em caráter eleitoral, falta de explicações do governo de como ia manter o Auxílio, mesmo sem recursos, ou procurar algum tipo de brecha para viabilizar, tudo gerou insegurança", destacou. "Com a PEC dos Precatórios, o rombo era conhecido e, aí, passou a ser recebida com relativo otimismo, porque com ela já tem expectativas mais ancoradas, mesmo que não tivesse plano B."