Enquanto os moradores de Cuiabá dormem em fila para receber doações de “ossinhos”, a Câmara Municipal da cidade decidiu dedicar a última sessão da Casa a aprovar, entre outros, um projeto de caráter conservador. O projeto de lei que cria o Dia do Orgulho Hétero foi aprovado em primeiro turno pelos vereadores, nesta terça-feira (1/12). Se passar pelo 2º turno, os moradores do município poderão “celebrar” o dia todo terceiro domingo de dezembro.
Dos 16 parlamentares presentes, 15 foram favoráveis ao PL — oito não estavam na Casa na hora da votação. Eles apoiaram a justificativa do autor do projeto, o vereador bolsonarista tenente coronel Marcos Paccola (Cidadania), que afirma que a legislação evitará “ataques” de grupos de “ativismo homossexual”, que trazem “uma clara obrigatoriedade para que jovens e crianças tenham um comportamento bissexual”.
“O que me fez propor essa lei foi uma conversa que tive com meu filho e sobrinhos, e fui revelado a algo que eu achei realmente assustador, de que na escola, para participar de determinados grupos, eles tinham que beijar meninos e meninas”, declarou ao defender o projeto no plenário da Câmara.
Foi quando o vereador percebeu que era preciso se opor à essa “desestruturação” do modelo tradicional de família. “Falamos sobre o Dia do Orgulho Gay e não da existência do orgulho hétero. Então acabamos assistindo uma desestruturação que é algo que sabemos que faz parte de um marxismo cultural e do modelo tradicional de família”, pontuou. Apesar disso, ele afirma que tem amigos gays e que os direitos deles devem ser respeitados.
A votação final — 2º turno — seria feita nesta quinta-feira (23/12), mas foi adiada para o próximo ano, após o recesso dos parlamentares.
Prioridade?
A votação ocorreu no mesmo dia em que uma TV local veiculou a notícia de que um grupo de pessoas dormiu em uma fila, em frente a um açougue, para receber ossos de doação. Uma moradora que “frequenta” desde julho a doação, disse que agora o joelho chega a doer porque a quantidade de pessoas na fila aumentou.
Dois dias depois, nesta quinta-feira (23/12), o G1 mostrou que as filas do açougue dobraram quarteirões. De acordo com o jornal, a fila cresceu mais de 60% e se estendia por cerca de cinco quarteirões.
Única parlamentar contrária ao PL
A vereadora Edna Sampaio (PT-MT) foi a única a votar contra o projeto de lei. A parlamentar criticou a prioridade dos colegas ao aprovar uma legislação conservadora enquanto a população da cidade passa por uma severa crise financeira.
“Cuiabá sendo conhecida nacionalmente como a capital da fila do ossinho e adivinha qual o projeto que a Câmara Municipal aprova? O Dia do Orgulho Hétero”, disse.
“Quem sofre violência por sua orientação sexual? É a pessoa heterossexual? Quem é expulso de casa? Quem pode ser abordado com violência na rua e até morto se encontrar uma pessoa que odeia LGBTQIA+? Não são os hetéros. A nossa sociedade é violenta com esse grupo”, pontuou.
Edna também afirma que o projeto é uma forma de “sobrevalorizar quem já é valorizado, quem não tem problema nenhum de ser aceito e de se organizar no mundo”.
“Nós tivemos a capacidade de aprovar o Dia do Orgulho Hétero. O dia do orgulho daqueles que deveriam ter responsabilidade sobre os corpos daqueles que são vitimados por ser LGBTQIA+. Não é só feio, é vergonhoso. Eu não posso dizer que tenho orgulho de ser hetero quando as pessoas que não são estão sendo mortas justamente pelo fato de não serem”, declarou.
Saiba Mais
- Política Senador Fabiano Contarato e filho são vítimas de ataque nas redes sociais
- Brasil A cada 10 assassinatos de pessoas trans no mundo, quatro ocorreram no Brasil
- Brasil Janaína Dutra: quem foi pioneira da luta LGBT e primeira travesti a ter carteira da OAB
- Brasil Casal lésbico tem pedido cancelado após trocarem um selinho em bar
Notícias pelo celular
Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.
Dê a sua opinião
O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.