BRASIL VISTO DO EXTERIOR

É do azedo limão que vem a doce limonada. Sentimentos enganam; entenda

"Tristeza não tem fim; felicidade, sim". Por que a lição de Vinicius e Jobim não é de todo ruim, avalia Ricardo Kertzman

Em 2019, parti sozinho rumo a uma jornada de reencontro com minhas raízes e comigo mesmo. Muita gente considera o que se chama "período sabático" como algo espiritual. Eu, ao contrário, já que creio muito pouco ou quase nada no que não seja físico e material, penso que se trata do pleno exercício das faculdades mentais, o que enseja autoconhecimento e profunda análise das emoções.

Meti-me em um fiorde norueguês a quilômetros de distância da civilização. Comigo, além de música e birita, retratos e lembranças de dias recentes, vividos diante da morte de antepassados distantes e da vida em família — não sem antes ter visitado o berço de minha existência. Eu e eu tivemos muito tempo para acertar nossas contas e, juntos, desfrutamos das mais belas paisagens naturais deste planeta.

Um dos autores atuais de que mais gosto é Luiz Felipe Pondé; é dele essa maravilha: "O amadurecimento é, muitas vezes, uma forma de tristeza a ser transformada em companheira do percurso adulto. Todo autoconhecimento verdadeiro se inicia com alguma forma de tristeza. Esse fator é essencial, e o debate infantil sobre felicidade raramente compreende". Raramente ou nunca?

Quase três anos depois, me encontro em outra jornada — como é o termo da moda? — disruptiva. Primeiro em família; agora só. Nada de isolamento; pelo contrário. Paisagens deslumbrantes? Inúmeras; moldadas pela genialidade humana e não pela não menos genial natureza (se bem que… bobagem! Humanidade e natureza são partes do todo). E o mesmo propósito de 2019.

Já escrevi que observar o Brasil a partir do exterior tem sido fascinante. Bem como igualmente fascinante tem sido observar a mim mesmo fora do Brasil. A minha leveza e o estado de espírito, mais elevados que o preço do dólar, vão de encontro à ‘tristeza’ do autoconhecimento citada acima pelo Pondé, e, apesar de vencerem de goleada, saem marcadas (e demarcadas!) pelo bom combate.

É triste sentir saudade. É triste sentir angústia. É triste sentir raiva - sentimentos humanos e próprios da vida. Mas, triste mesmo, talvez seja não sentir a tristeza; viver em uma bolha imaginária, em uma realidade paralela ou em um mundo de fantasias. Estar só me lembra a alegria de ter quem me ama, e a quem eu amar. Lembrei de Descartes: "Sinto, logo existo" (em tempo: eu sei que é "penso").

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