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Guedes: explicações em plenário

Câmara dos Deputados aprova, por ampla maioria, convocação do titular da Economia para esclarecer investimento de US$ 9,55 milhões em paraíso fiscal. Sessão deve ser marcada para a próxima semana. Senado também quer ouvir o ministro

O ministro da Economia, Paulo Guedes, terá que comparecer ao plenário da Câmara para explicar porque mantém uma empresa offshore num paraíso fiscal do Caribe, com patrimônio de, pelo menos, US$ 9,55 milhões (cerca de R$ 51 milhões). A convocação foi aprovada ontem por 310 votos contra 142. A sessão para ouvir o ministro ainda não tem data marcada, mas, segundo nota publicada no site da Câmara, poderá ser realizada na próxima semana.

Guedes já havia sido convocado por duas comissões da Casa: a de Trabalho, Administração e Serviço Público; e a de Fiscalização Financeira e Controle. Com o depoimento em plenário, é possível que elas abram mão do depoimento do ministro. No Senado, a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) também já manifestou querer ouvir o ministro da Economia e o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, também apontado como dono de empresas em paraíso fiscal.

Segundo a advogada Estela Nunes, coordenadora da área empresarial e societária do Kolbe Advogados, dois campos merecem ser abordados: o ético e o jurídico. “Quem desenvolve uma atividade pública precisa fazê-lo sob os mantos da ética, transparência e probidade, para revestir sua atuação de respaldo”, esclareceu.

A advogada lembra que o Código de Conduta da Alta Administração Federal diz que “é vedado o investimento em bens cujo valor ou cotação possa ser afetado por decisão ou política governamental a respeito da qual a autoridade pública tenha informações privilegiadas, em razão do cargo ou função”. Também há, portanto, questões jurídicas que precisam ser respondidas.

O deputado Júlio Delgado (PSB-MG) relacionou duas iniciativas de Paulo Guedes com impacto direto em operações offshores: o aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) e a defesa de proposta com tributação mais vantajosa na reforma do Imposto de Renda. “Ele fez o aumento do IOF como ministro da Economia, mas ele não vai pagar. E ainda não quer prestar satisfação ao parlamento”, afirmou.

A deputada Caroline de Toni (PSL-SC) saiu em defesa do ministro, argumentando que os recursos de Guedes foram declarados à Receita e que as contas não teriam sido movimentadas nos últimos anos. “Esse requerimento é um factoide, uma vez que a grande mídia já explorou bastante a questão do vírus chinês no Brasil, e agora quer explorar uma situação que não tem nada a ver”, declarou.

Na segunda-feira, o procurador-geral da República, Augusto Aras, abriu investigação a respeito dos investimentos no exterior de Guedes e Campos Neto. O Ministério Público Federal (MPF) em Brasília também abriu Procedimento Investigatório Criminal (PIC) para investigar o ministro.

Improbidade: projeto vai a sanção

A Câmara dos Deputados concluiu, ontem, a votação do projeto que altera a Lei de Improbidade Administrativa. A proposta, agora, segue para sanção presidencial. Conforme o texto, passa a ser necessária a comprovação de dolo para que agentes públicos sejam responsabilizados pelo crime de improbidade.

O PL nº 2505/21 foi aprovado em junho pela Câmara. No entanto, após alterações do Senado, voltou para a análise dos deputados. De acordo com o projeto aprovado, para que um servidor público seja punido por atos de improbidade, deverá ficar comprovado que ele teve a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito. Desse modo, não basta a voluntariedade do agente ou o mero exercício da função. Também não poderá ser punida a ação ou a omissão decorrente de divergências no entendimento da lei.

Além disso, foi alterado o rol das condutas consideradas como improbidade. Outro ponto é o rito processual, com a possibilidade de o Ministério Público celebrar acordos, e ao juiz, de converter sanções em multas.

Para vários especialistas, as mudanças vão prejudicar o combate à corrupção. Mas, o relator do projeto, deputado Carlos Zaratini (PT-SP), diz que elas vão facilitar a tomada de decisões na administração pública. Segundo ele, muitos servidores evitavam adotar medidas com receio de serem enquadrados na lei de improbidade.

Os atos de improbidade administrativa são regidos, atualmente, pela lei nº 8.429/92. O dispositivo estabelece “as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego ou função na administração pública direta, indireta ou fundacional e dá outras providências”.

A lei em vigor categoriza como improbidade administrativa “qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que cause lesão ao erário, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres”.

Nepotismo
Na sessão de ontem, parlamentares rejeitaram a emenda incluída pelos senadores, na qual o nepotismo foi caracterizado como exceção à regra que exige dolo com finalidade ilícita para caracterizar nomeações como improbidade.

“A emenda que trata do nepotismo é inoportuna, na medida em que não contribui para a clareza, precisão e ordem lógica na interpretação do texto. Julgamos que o texto original aprovado nesta Casa, mais direto e claro, é o que melhor resguarda o interesse público, atenua a possibilidade de interpretações ambíguas da norma”, disse Zaratini. “O nepotismo, no Artigo 11 do projeto, já é caracterizado como improbidade administrativa de forma muito límpida.”

*Estagiário sob supervisão de Odail Figueiredo