A um ano das eleições de 2022, a polarização que marcou as últimas disputas ainda é predominante, com o espaço político dominado por Jair Bolsonaro e Luiz Inácio Lula da Silva. Os protestos realizados no último sábado contra o governo mostraram que a mobilização popular de oposição, por enquanto, está restrita em boa medida a partidos de esquerda. Nesse cenário, Lula e Bolsonaro permanecem como os nomes mais fortes na preferência do eleitorado, de modo a dificultar a chegada de uma terceira via no cenário.
Embora remota, a possibilidade de romper a polarização ainda existe, segundo especialistas ouvidos pelo Correio. O elemento surpresa tem caracterizado as eleições brasileiras desde 2018. Resultados em pleitos estaduais, como as escolhas de Wilson Witzel, no Rio de Janeiro — com apoio de Bolsonaro —, Ibaneis Rocha, no Distrito Federal, e Romeu Zema, em Minas Gerais, mostram que alguns candidatos podem conseguir uma arrancada de última hora.
Para o cientista político André Rosa, com relação à terceira via, a população sequer foi apresentada aos possíveis concorrentes. “O eleitor ainda não conhece essa terceira via. Um candidato não é escolhido pela população, ele é trabalhado internamente e apresentado à população como alguém presidenciável”, explica o especialista em psicologia política. Como Lula e Bolsonaro são nomes famosos que detêm não só eleitores, mas ‘fã clubes’, eles acabam sendo colocados como nomes fortes antes do período eleitoral.
No entanto, alguns fatores trapalham a terceira via, entre eles, a quantidade de candidatos. A cerca de um ano para o pleito, Alessandro Vieira (Cidadania/SE) e Ciro Gomes (PDT) já se colocam como pré-candidatos. No PSDB, os governadores João Doria (SP) e Eduardo Leite (RS) travam uma queda de braço nas prévias do partido para saber quem será o candidato tucano em 2022. O presidente do senado, Rodrigo Pacheco (DEM/MG) surge como a opção preferida do presidente do PSD, Gilberto Kassab. Corre nos bastidores do Senado que Pacheco tem o desejo de disputar o pleito e chegou a dizer que tinha o PSD “no coração” em um evento no Congresso Nacional.
Divergências
“É muito difícil você ter um único nome. Há muitos espectros ideológicos e interesses divergentes dentro desse processo, desde a centro-direita até a esquerda. São muitas composições para se unirem em um único nome”, explica o professor e mestre em ciência política Valdir Pucci.
Em maior ou menor grau, a divisão atinge todos os possíveis candidatos da terceira via. Um dos exemplos mais recentes das rivalidades internas ocorreu no último sábado. Ao discursar, em São Paulo, durante os protestos contra o governo Bolsonaro no último sábado, Ciro Gomes foi confrontado com vaias e até lançamento de latas, promovido por grupos ligados ao PT. O episódio mostrou a falta de coesão das legendas progressistas.
Ontem, em entrevista ao Uol, Ciro Gomes propôs uma trégua com as correntes de esquerda. E reafirmou a vontade de romper a polarização. “Eu vou continuar estabelecendo, com muita clareza, as diferenças que eu tenho com Bolsonaro e com o lulopetismo”. Um dia após as vaias na Paulista, o candidato pedetista recebeu apoio de parlamentares progressistas. “Nada justifica as agressões a Ciro Gomes”, escreveu a deputada Sâmia Bonfim (PSol-SP), em uma rede social.
Enquanto tenta pacificar as forças progressistas, Ciro Gomes também busca os votos dissidentes de Jair Bolsonaro. Trata-se de um movimento necessário para chegar ao segundo turno. Uma aliança com o ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, nesse sentido, poderia ajudar na captação desses votos.
O presidente Nacional do PDT, Carlos Lupi, acredita que o candidato de seu partido pode virar o jogo se chegar a 18% nas intenções de voto até o fim do carnaval. Atualmente, Ciro está com, aproximadamente, 12% da preferência do eleitorado. Para Lupi, o foco deve ser o eleitor arrependido de Bolsonaro. “Esse eleitor do centro que votou em Bolsonaro, votou pelo antipetismo, não porque morria de amores pelo Bolsonaro. Esses votos podem fazer a diferença para que o Ciro consiga chegar a um segundo turno. Acredito que com 18% até o fim do carnaval, o Ciro consegue viabilizar sua campanha rumo ao segundo turno”, avaliou.
No campo do centro-direita, também existem fissuras. Uma das disputas mais notórias ocorre dentro do PSDB, onde os governadores Joao Doria (SP) e Eduardo Leite (RS) medem força. No mapa das prévias do partido, marcadas para 21 de novembro, Doria fechou o apoio dos diretórios de São Paulo, Distrito Federal, Acre, Pará e Tocantins. Leite, por sua vez, conta com Ceará, Minas Gerais, Alagoas e Rio Grande do Sul. Nas próximas semanas, Doria espera selar a adesão dos diretórios deEspírito Santo, Rio Grande do Norte, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul.
O senador Tasso Jereissati (CE) desistiu da disputa para apoiar Leite. Além dos governadores paulista e gaúcho, o ex-prefeito de Manaus Arthur Virgílio também está inscrito na disputa interna.
Muita gente, pouco voto
Um problema comum a todos os possíveis candidatos a uma terceira via é o baixo interesse do eleitor. Veja a situação de cada um dos nomes mais citados na disputa para 2022.
Ciro Gomes
Terceiro colocado nas últimas pesquisas eleitorais, Ciro se credencia como um candidato de centro-esquerda. Durante as manifestações de 12 de setembro, Ciro foi aplaudido por um público majoritariamente de direita ou centro-direita, eleitores que o pedetista precisa captar para chegar ao segundo turno. Para o cientista político André Rosa, Ciro pode conseguir dissidentes tanto da esquerda dissidente de Lula, quanto da direita dissidente de Bolsonaro.
João Doria
O governador de São Paulo foi apontado como um dos principais adversários políticos de Bolsonaro desde que o governo federal no episódio da vacina Coronavac, acabou perdendo espaço com a recuperação dos direitos políticos de Luiz Inácio Lula da Silva. Seu status como presidenciável se tornou dúvida. O destino do candidato do PSDB será definido nas prévias do partido.
Alessandro Vieira
O senador da República ganhou espaço por sua atuação na CPI da Covid-19 e foi selecionado como pré-candidato do Cidadania à presidência. Apoiador de Bolsonaro em 2018, o delegado da polícia civil se tornou crítico e marca forte oposição ao governo. Candidato da direita, Vieira quer se encaixar como opção à terceira via.
Sergio Moro
O ex-juiz que se tornou celebridade com a Operação Lava-Jato avalia a possibilidade de se apresentar um candidato da terceira via, possivelmente pelo Podemos. Mas ele tem vários obstáculos a transpor. Parcialidade nos julgamentos da Lava-Jato, passado bolsonarista e resistência da classe política são algumas das dificuldades à frente de uma candidatura.
Luiz Henrique Mandetta
Apesar de ter ganho simpatia de parte da população por sua batalha contra os negacionismos de Bolsonaro (sem partido), o ex-ministro da Saúde, demitido por não amenizar o discurso dentro das recomendações das autoridades científicas, Luiz Henrique Mandetta (DEM) não possui cancha suficiente para chegar ao segundo turno. No entanto, uma aliança para ser o vice de Ciro pode ser o casamento perfeito para a dupla, uma vez que a chapa abarcaria setores da esquerda até a direita. Há cerca de um mês o namoro da dupla parecia estar se intensificando, mas a possível fusão entre DEM e PSL esfriou um pouco os planos da parceria, pelo menos até o momento.
Eduardo Leite
O governador do Rio Grande do Sul é o principal adversário de João Doria nas prévias do PSDB. Apesar de não possuir um trunfo tão forte como tem o paulista com a vacina, Leite conta com apoio dentro do partido e recebeu, inclusive de Pedro Tobias e Antonio Carlos Pannunzio, ex-presidentes da sigla. Segundo os tucanos, Eduardo Leite possui condições de "unir o país”.
Rodrigo Pacheco
De perfil moderado, o presidente do Senado é apontado por especialistas como um nome que pode se colocar como um nome de maior serenidade em meio às tensões vividas no país. Pacheco vem assumindo o papel de “apaziguador”, mas segundo os bastidores políticos, ele possui interesse em se colocar como terceira via. Ele é desejo do presidente do PSD, Gilberto Kassab, para disputar o pleito em 2022. Pacheco possui mandato no Senado até 2026 e pode usar as próximas eleições como um propulsor para a sua popularidade.