O presidente Jair Bolsonaro se antecipou à decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) e se colocou, ontem, à disposição para prestar depoimento presencialmente no inquérito que apura suposta interferência política dele na Polícia Federal (PF). Segundo um interlocutor palaciano, o aceno está alinhado com o discurso de trégua com o Poder Judiciário depois do 7 de Setembro, quando assumiu uma postura de não buscar confronto com os membros da Corte. Anteriormente, Bolsonaro pleiteava que a manifestação ocorresse por escrito, embora a decisão do ministro aposentado Celso de Mello fosse para que o presidente seja ouvido presencialmente.
A mudança de estratégia foi anunciada no começo da sessão do Supremo Tribunal Federal (STF) que decidiria o formato do depoimento de Bolsonaro. O ministro Alexandre de Moraes, que herdou o processo de Celso de Mello, suspendeu a votação para analisar a proposta de oitiva presencial. A Advocacia-Geral da União (AGU) solicitou que o presidente tivesse a possibilidade de depor em local, dia e hora previamente ajustados, em aplicação ao que prevê o Código de Processo Penal.
A tendência no STF era de que fosse mantido o entendimento de Celso de Mello. Dois meses depois, Bolsonaro disse à Corte que “declinava do meio de defesa”. A indefinição travou o inquérito por um ano. Em julho, Moraes determinou que a PF retomasse as investigações.
O depoimento de Bolsonaro é a única etapa que falta para a conclusão do inquérito. Assim que for finalizado, o relatório da PF será encaminhado à Procuradoria-Geral da República (PGR), a quem cabe decidir se há ou não base para a apresentação de uma denúncia.
Colaboração
O documento assinado pelo advogado-geral Bruno Bianco afirma que o presidente tem “o intuito de total colaboração com a Corte”. Bolsonaro está na condição de investigado no caso e uma das evidências de interferência na PF é o vídeo da reunião ministerial de 22 de abril de 2020, no Palácio do Planalto. No encontro, ele disse que iria “intervir” na superintendência da corporação no Rio de Janeiro para supostamente beneficiar familiares.
“Vai trocar! Se não puder trocar, troca o chefe dele! Não pode trocar o chefe dele? Troca o ministro! E ponto final! Não estamos aqui para brincadeira”, disse o presidente na reunião. A ameaça seria o estopim para a saída de Sergio Moro do Ministério da Justiça e Segurança Pública, que, ao deixar o cargo, acusou Bolsonaro de querer controlar a PF.
Os dois, aliás, vinham em rota de colisão, pois o ex-juiz da Operação da Lava-Jato tentava manter o delegado Maurício Valeixo no comando das ações no Rio e o presidente pretendia colocar no lugar o delegado Alexandre Ramagem, hoje à frente da Agência Brasileira de Inteligência (Abin).
Segundo a defesa de Moro, ao protocolar uma petição em que Bolsonaro concorda com o interrogatório presencial, a AGU “tentou esvaziar o teor do agravo regimental interposto na Corte”. “Os advogados de defesa de Sérgio Moro reforçam que esse posicionamento somente confirma a procedência da tese defendida, desde o início da discussão do caso. A partir de agora, aguardamos a designação da data para a realização do ato procedimental de oitiva do investigado”, salientou.
Campanha por quatro anos
Ao receber atletas olímpicos e paralímpicos que representaram o Brasil nos Jogos de Tóquio 2021, o presidente Jair Bolsonaro comparou a carreira atlética com a política. Disse que o caminho do sucesso no atletismo começa anos antes, assim como quando um candidato pretende se reeleger. E disse que “a campanha eleitoral é feita ao longo dos quatro anos de mandato”, pois “depois dos quatro anos de mandato, você não precisa gastar dinheiro com campanha”. Na semana passada Bolsonaro fez várias viagens pelo país em celebração aos 1.000 dias de governo.
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Supremo alinhado
O presidente Jair Bolsonaro projeta ter uma bancada alinhada dentro do Supremo Tribunal Federal (STF). Em reunião, ontem, com a bancada da Frente Parlamentar da Agricultura (FPA), no Palácio do Planalto, lembrou que indicou Kássio Nunes Marques e, agora, o ex-advogado-geral da União, André Mendonça — que ainda precisa ser sabatinado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Mas projeta pôr na Corte mais ministros alinhados com ele.
“Quem se eleger presidente no ano que vem, no primeiro semestre do ano que vem, indica mais dois ministros do STF. Se for alinhado conosco, ficam quatro garantidos lá dentro. Além de outros que votam com a gente. Não é que votam com a gente, votam com as pautas que têm que ser votadas do nosso lado. Ninguém está pedindo voto, nem se lançando candidato. Mas uma pessoa alinhada a nós tem que estar sentada naquela cadeira a partir de 2023”, disse.
Bolsonaro acredita que Mendonça, caso seja aprovado pela CCJ, votaria bem favor do marco temporal para a demarcação de terras indígenas, em discussão no STF. “Essas pautas da agroindústria, o marco temporal. O André Mendonça, uma vez aprovado pelo Senado, vai na mesma linha”, salientou.
Na última terça-feira, no Simpósio Cidadania Cristã, Bolsonaro foi cobrado por pastores sobre a indicação de Mendonça, mas esclareceu que, agora, tudo depende do Senado. Mendonça, aliás, também participou do evento — disse a indicação ao Supremo é obra divina. (IS)