A exatamente um ano da próxima disputa presidencial, o Brasil já vive o clima de campanha, ao mesmo tempo em que as articulações políticas seguem a todo vapor. Uma das movimentações mais intensas está entre as forças que correm para lançar candidatos alternativos à polarização entre os dois principais nomes, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O atual cenário de inaugurações públicas, fusão de siglas, debates e trocas de farpas agita a corrida ao Planalto, uma das mais antecipadas da história do país.
Em 2 de outubro de 2022, os brasileiros voltarão às urnas para escolher o presidente, governadores, deputados federais e senadores. Com um ano de antecedência, o tema da recuperação econômica no período pós-pandemia da covid-19 tem pautado os discursos da maioria dos pré-candidatos, da mesma forma que cobranças sobre a atuação dos governantes durante a crise sanitária.
Com o projeto de reeleição em vista desde que tomou posse, Bolsonaro intensifica as viagens pelo país para inaugurações de obras e lançamento de programas, no momento em que amarga os piores índices de popularidade como presidente. Em outra frente, o governo corre contra o tempo para lançar um novo programa social em substituição ao Bolsa Família e com o aumento dos recursos transferidos a famílias em situação de pobreza. Os últimos depósitos do auxílio emergencial estão previstos para este mês.
Bolsonaro também tem reforçado o discurso polarizado contra a esquerda, o mesmo que embalou sua vitória em 2018. A estratégia busca manter mobilizados os bolsonaristas radicais — cerca de 30% do eleitorado — e explorar o antipetismo, numa tentativa de reverter o favoritismo atribuído a Lula pelas pesquisas de opinião.
Uma das sondagens mais recentes, do XP/Ipespe, divulgada na última quinta-feira, mostra que o petista teve um crescimento de três pontos percentuais em comparação com o levantamento de agosto. Chegou a 43% das intenções de voto, 15 pontos à frente de Bolsonaro, que tem 28%.
A pesquisa mostra também que a tendência de queda da popularidade do presidente está diretamente relacionada ao fraco desempenho da economia e seus reflexos, como desemprego recorde, inflação em alta e aumento da pobreza e da fome. Segundo o levantamento, 64% dos entrevistados reprovam a atuação do governo nessa área. Além disso, 55% consideram o governo “ruim” ou “péssimo”, maior índice da série histórica. Essa avaliação é também um ponto percentual maior que a do último mês de agosto, e 24 pontos acima do registrado em outubro de 2020.
Em meio às dificuldades econômicas, há pendências políticas a resolver. O presidente ainda não conseguiu definir a legenda à qual irá se filiar para ter a estrutura partidária necessária à campanha à reeleição. PP, PL e Republicanos estão no radar. Na semana passada, o ministro da Casa Civil e presidente licenciado do PP, Ciro Nogueira, disse que o chefe do governo está mais perto de se filiar ao partido. Mas o PTB, de Roberto Jefferson, também se movimenta.
Conversas de Lula
Em outra raia da corrida presidencial, Lula segue em viagens pelo país, de olho também nos governos estaduais e no Congresso. O ex-presidente tem pregado uma “reconstrução do Parlamento” e criticado, do ponto de vista ideológico, as atuais composições da Câmara e do Senado, as piores “desses últimos 100 anos”, segundo ele. O objetivo é construir uma maioria orgânica de apoio, o que livraria um eventual governo petista de reviver barganhas políticas que causaram, entre outros desgastes profundos na imagem do partido, o escândalo do mensalão.
Nesta semana, Lula desembarca em Brasília para uma agenda de reuniões políticas, inclusive com aliados de Bolsonaro, como o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB). Os dois se encontrarão na quarta-feira, durante um jantar na casa do ex-senador Eunício Oliveira (MDB-CE). O compromisso, marcado a pedido do petista, terá a presença de outras lideranças.
Lula deve ficar até quinta-feira em Brasília. Além de manter encontros com representantes da oposição, se reunirá com integrantes do Centrão, bloco de partidos com o qual governou no passado e que agora comanda a articulação política de Bolsonaro.
“O aumento do número de postulantes é sintoma de que teria crescido o espaço para uma terceira via competitiva. Mas, paradoxalmente, com a aglomeração (de candidatos), também se torna menos provável um deles sobressair nas pesquisas”
Antonio Lavareda,
cientista político
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Cálculos da terceira via
A um ano da eleição, o relógio está correndo para a terceira via. Para despertar o interesse no eleitor, partidos e pré-candidatos se empenham para criticar os dois protagonistas da disputa neste momento. “A chamada terceira via não tem apenas Bolsonaro como alvo. Favoritos por ora na disputa, Lula e o PT igualmente estão no radar das legendas mais ao centro e centro-direita”, avalia o cientista político André Pereira César, da Hold Assessoria Legislativa. “Não por acaso, os dois principais postulantes nas prévias do PSDB, Doria e Leite, têm concentrado parte dos ataques no petismo. Outros pré-candidatos com perfil semelhante ao dos tucanos adotarão a mesma postura. Trata-se de um embate que tende a ganhar corpo ao longo dos próximos meses”, acrescenta o analista.
Outros nomes, de diferentes legendas, também estão no páreo da corrida presidencial, como o ex-ministro Ciro Gomes (PDT), os senadores Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e Simone Tebet (MDB) e o ex-juiz Sergio Moro (sem partido).
O cientista político e escritor Antonio Lavareda comenta que as últimas pesquisas de intenção de voto incluíram novos nomes de postulantes à disputa presidencial. Para ele, isso demonstra que o aumento da polarização entre Bolsonaro e Lula ampliou o espaço para a participação da terceira via.
“Nos últimos levantamentos, foram incluídos novos nomes na condição de representantes do autodenominado centro democrático. Há outros que ficaram de fora. Esse aumento do número de postulantes é sintoma de uma avaliação pelos políticos de que teria crescido o espaço para uma terceira via competitiva. Pode ser verdade. Mas, paradoxalmente, com a aglomeração (de candidatos), também se torna menos provável um deles sobressair nas pesquisas. E, sem isso, será mais difícil o trabalho posterior de articulação de uma coalizão em torno desse candidato”, analisa Lavareda. (JV)
Nova legenda para "um país unido"
Enquanto os dois principais adversários mantêm alta a temperatura para a disputa ao Palácio do Planalto, outras forças políticas se organizam para o pleito de 2022. Na próxima quarta-feira, haverá uma convenção conjunta do DEM e do PSL. As duas legendas devem oficializar uma fusão que dará origem a uma nova sigla, a União Brasil, que será identificada pelo número 44. Além de lançar um candidato da terceira via para a disputa presidencial, os caciques dos dois partidos planejam ter a maior bancada no Congresso, com 81 deputados e sete senadores. Segundo o presidente do DEM, ACM neto, a escolha do nome do nome da futura legenda se deve ao fato de que a “população quer um país unido”, com respeito às diferenças e convivência pacífica de diversas ideologias.
Nessa costura política, a tendência é que o candidato a ser escolhido para concorrer ao Planalto pelo União Brasil saia dos quadros das duas siglas. Os mais cotados, até o momento, são o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta (DEM); o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG); e o apresentador José Luiz Datena (PSL). E a briga entre eles já começou, antes mesmo da fusão dos dois partidos. Datena, por exemplo, tem disparado ataques contra Mandetta, afirmando que o médico não conta com potencial nem para uma quarta via.
Pacheco, que tem se afirmado como a voz da moderação no Congresso, estava, até pouco tempo, com um pé no PSD, atraído pelo presidente do partido, de Gilberto Kassab, que o quer como candidato ao Planalto. Agora, porém, com a fusão entre o DEM e o PSL, surge a possibilidade de ele ficar no União Brasil — o senador votou a favor da união das duas legendas, na reunião da Executiva Nacional.
Debandada
Apesar do otimismo dos caciques, é possível que haja uma debandada de vários de parlamentares do PSL que rejeitam a fusão com o DEM, segundo relatou à reportagem o deputado bolsonarista Bibo Nunes (PSL-RS). Pelas suas estimativas, o partido, que tem a maior bancada da Câmara, com 54 representantes, deve perder mais de 25 deles. “Eu serei o primeiro a sair, porque esse partido (União Brasil) não será favorável a Bolsonaro. É um partido que terá muito tempo de televisão, muito dinheiro, mas não terá votos. O PSL está calculando que vai perder 25 (deputados). Eu garanto que vai perder mais do que eles imaginam. Eles vão se surpreender com o número de pessoas que vão sair”, disse Bibo Nunes.
O deputado afirmou que não teme perder o mandato com sua eventual saída do PSL. A legislação eleitoral prevê que só com uma justa causa um ocupante de cargo proporcional pode deixar o partido e manter o mandato. "Mas justa causa tem de sobra. Até o estatuto do partido vai ser mudado, vai mudar tudo. Justa causa tem de sobra, só tenho que ver o momento certo (para sair)", afirmou Nunes.
Em novembro, o PSDB realizará prévias para escolher o candidato presidencial. Estão no páreo os governadores de São Paulo, João Doria; e do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, além do ex-senador e ex-prefeito de Manaus (AM) Arthur Virgílio. Nos últimos dias, o partido tem dado demonstrações de que vai investir no antipetismo na tentativa de reverter o favoritismo de Lula. (JV)