Tribunal de Haia

CPI mira caso de filipino para levar Bolsonaro a Haia

Na prática, o Tribunal de Haia atua quando as cortes nacionais não conseguem ou não desejam realizar processos criminais. Sendo assim, a formação desse foro internacional geralmente se justifica como um último recurso e só atua se o processo não estiver sendo julgado por outro Estado

Agência Estado
postado em 02/10/2021 21:04 / atualizado em 02/10/2021 21:05
 (crédito: Alan Santos/PR))
(crédito: Alan Santos/PR))

A cúpula da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid no Senado tem consultado juristas para evitar que a denúncia contra o presidente Jair Bolsonaro que pretendem levar ao Tribunal Penal Internacional (TPI), em Haia, nos Países Baixos, não tenha o mesmo destino de outras que já foram apresentadas, mas até agora não foram analisadas. Nas conversas, senadores ouviram que a abertura de investigação contra o presidente das Filipinas, Rodrigo Duterte, pode servir de precedente para uma ação contra o brasileiro, mas, para isso, é preciso que os crimes estejam muito bem fundamentados.

O TPI costuma aceitar apenas o julgamento de crimes internacionais considerados muito graves, incluindo genocídio, crimes de guerra e contra a humanidade. Seu tratado, o Estatuto de Roma, foi adotado a partir de julho de 1998 por mais de cem países, incluindo o Brasil.

Na prática, o Tribunal de Haia atua quando as cortes nacionais não conseguem ou não desejam realizar processos criminais. Sendo assim, a formação desse foro internacional geralmente se justifica como um último recurso e só atua se o processo não estiver sendo julgado por outro Estado.

Desde 2019, a corte internacional recebeu três comunicações contra Bolsonaro. Uma delas já foi arquivada. Outra está em análise preliminar e uma terceira ainda não teve resposta.

O Estadão apurou que já há um entendimento no "G7" - grupo majoritário de senadores da CPI - para que o relatório final seja encaminhado a Haia assim que a comissão finalizar os trabalhos, o que está previsto para novembro. Para isso, os senadores tiveram duas rodadas de conversas nas últimas semanas com juristas especializados em diversas áreas do Direito, como Internacional e Sanitário.

Em entrevista ao Estadão, Sylvia Steiner, única juíza brasileira que já atuou na Corte (2003-2016), disse acreditar que há "prova abundante" contra o chefe do Executivo. "Falava-se de incompetência, de um problema administrativo, de pessoas incompetentes que estavam gerindo mal uma crise sem precedentes", disse. "Ficou demonstrado que o problema não era de má gestão. Porque má gestão e ignorância, infelizmente, não são crimes", completou ela. A ex-juíza assina o relatório de juristas coordenado por Miguel Reale Jr. que aponta sete crimes cometidos por Bolsonaro na pandemia, incluindo contra a humanidade.

"O desafio é fazer o tribunal olhar para um país que tem instituições democráticas, ainda que estejam sob ataque, como no atual momento", disse a advogada Eloísa Machado, professora da Fundação Getúlio Vargas.

Na avaliação dos juristas consultados, além da decisão sobre Duterte, a abertura de investigação sobre a atuação de tropas americanas e britânicas no Afeganistão, por crimes de guerra e contra a humanidade, no ano passado, também pode dar força à denúncia da CPI.

Ainda no encontro com a CPI, a jurista Deisy Ventura, da Universidade de São Paulo (USP), disse que a investigação sobre o presidente das Filipinas "é um recado importante a governantes populistas extremistas que estão causando tanto dano à humanidade".

Além do TPI, o relatório final da CPI deverá ser enviado à Procuradoria-Geral da República e a unidades do Ministério Público Federal para apuração de investigados sem prerrogativa de foro. Apesar de terem poder para investigar e decretar quebras de sigilo, CPIs não podem punir, lembrou o advogado criminalista Sérgio Rosenthal. "A efetiva punição de eventuais culpados cabe exclusivamente ao Poder Judiciário, após o devido processo", afirmou. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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