O ministro da Educação, Milton Ribeiro, pediu desculpas por ter dito que "alunos com deficiência atrapalham o aprendizado de outras crianças sem a mesma condição", em sua participação no programa Roda Viva, da TV Cultura, em agosto. Em uma audiência a portas fechadas, na Câmara dos Deputados, nesta quarta-feira, ele também assumiu ter "pouco conhecimento" sobre as causas das pessoas com deficiência, conforme confirmaram, ao Correio, deputados presentes ao encontro. E garantiu que vai se informar melhor sobre os estudantes especiais para que o Ministério da Educação possa adotar políticas que os integrem e os favoreçam.
"O ministro pediu muitas desculpas, disse que sua fala foi muito equivocada e assumiu sua responsabilidade. Ele ouviu a todos e foi muito receptivo. Apesar de declarações infelizes, essa questão mostrou a necessidade do debate e da defesa de um sistema inclusivo, além de investimento para as escolas receberem os deficientes. O ministro foi muito humilde e disse que essa é uma área que pouco domina", afirmou u o deputado Eduardo Barbosa (PSDB-MG).
A presidente da Comissão de Educação, Professora Dorinha (DEM-TO), também confirmou o arrependimento do ministro e disse que, após as exposições dos deputados, ele reconheceu o erro.
Mas, segundo a deputada Erika Kokay (PT-DF), mesmo que Ribeiro tenha pedido desculpas, as atitudes falam mais que palavras. "Só isso não basta. É preciso que tenham ações efetivas que priorizem a educação inclusiva. A postura institucional também deve ser mudada para que não sejam endossados discursos segregacionistas e preconceituosos. Os inúmeros pedidos de desculpas são insuficientes, é preciso ter uma postura concreta da defesa das pessoas com deficiência", criticou.
De acordo com a presidente da Comissão dos Direitos das Pessoas com Deficiência (CPD), Rejane Dias (PT-PI), a reunião, que durou 3 horas, também abriu espaço para a discussão sobre o Decreto 10.502/ 2020, que instituiu a Política Nacional de Educação Especial, e foi suspenso pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em 2020.
"O ministro pretende redigir de forma diferente a educação especial no decreto. Serão corrigidas as distorções para que possa ser efetivamente cumprido. Deixamos claro ao ministro que nossa luta é para a inclusão, e não ao contrário, como ele havia dito", destacou.
A reunião suprapartidária contou com a presença de 15 deputados federais e foi realizada com o apoio de três comissões permanentes: Direitos das Pessoas com Deficiência (CPD), Educação e Direitos Humanos. Ribeiro estava acompanhado de três especialistas da equipe técnica do MEC, responsáveis pela área de educação para PCD. A pedido da pasta, a reunião foi de caráter técnico, e não houve transmissão ao vivo.
Bullying
As declarações do ministro em nada contribuem para a inclusão. Eduarda Silva Oliveira, 21 anos, é surda-muda. A mãe da jovem, Lucimar Duarte Silva, contou que a filha sempre estudou em escolas públicas de educação mista, aquelas que colocam alunos com necessidades especiais para aprender junto aos demais.
Contudo, quando a família se mudou de Formosa (GO) para Brasília, há quatro anos, o ensino se tornou um obstáculo para Eduarda. "Nós a matriculamos numa escola de ensino fundamental e achamos que seria tranquilo. Porém, em pouco tempo, os estudantes começaram a discriminar minha filha, fazendo piadas e bullying. Fomos à escola, a diretora chamou os pais dos alunos, e eles pediram desculpas a ela. Mas, com esse episódio, ela não quis mais voltar", relatou.
Eduarda disse que a situação foi muito triste para ela. A jovem, que sempre gostou de estudar, mesmo em meio a dificuldades no aprendizado, se sentiu solitária e excluída. Agora, não tem vontade de voltar a frequentar as aulas, por medo de acontecer de novo. "Não consegui fazer amigos. Ninguém me entendia. Esse preconceito não me ajuda. Só vejo as pessoas conversando, mas não comigo. Quando eles me chamam é para me xingar e rir de mim. Eu não consigo aprender dessa forma, eu sofro", lamentou.
Dados do Censo Escolar 2020 do MEC mostram que existem cerca de 1.308.900 estudantes com deficiência matriculados do ensino infantil ao ensino técnico no Brasil.
A professora aposentada Luciana Reis Pereira afirmou que educação inclusiva influencia toda a sociedade. "Com a inclusão de PCDs nas salas, acontece uma espécie de ganha-ganha. O aluno especial amplia os horizontes, e o aluno sem deficiência aprende a conviver com a diferença. A partir daí, começamos a ter uma sociedade mais justa e respeitosa", sustentou.
LBI garante a educação
A Lei nº 13.146/2015 institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (LBI - Estatuto da Pessoa com Deficiência). Nela, estão previstos diversos direitos da pessoa com deficiência, inclusive contemplando a educação.
A advogada Andrea Costa, sócia da Loureiro Costa e Sousa Advocacia, explicou que, pela lei, "o portador de deficiência tem 'direito às adaptações necessárias para garantir um aprendizado em condições de igualdade de forma que promova sua autonomia'. Contudo, somente em alguns casos ele deve ser auxiliado, se assim quiser, para que o estudante possa ampliar suas habilidades funcionais".