As manifestações convocadas para hoje em favor do governo são um teste decisivo para o futuro do presidente Jair Bolsonaro. Com a popularidade em baixa, refém do Centrão no Congresso Nacional e pressionado pelo fraco desempenho da economia, o capitão reformado tentará mostrar que tem respaldo popular para manter as críticas ao Judiciário e defender o que bolsonaristas entendem por liberdade de expressão. Na véspera do Sete de Setembro, os partidários do presidente anteciparam o apoio ao chefe, a ponto de a Polícia Militar do Distrito Federal liberar a circulação dos manifestantes na noite de ontem.
O apoio das ruas é a cartada de Bolsonaro para virar o jogo e mostrar que ainda tem força política. Mas são grandes os obstáculos que se acumulam à frente do chefe do Planalto. Ainda que tenha o respaldo de apoiadores para uma guinada mais radical, Bolsonaro não conta com o aval das Forças Armadas para aventuras autoritárias. E corre o risco de ver aliados importantes abandonarem o barco se insistir no confronto institucional.
As manifestações ocorrem no momento em que vários fatores têm empurrado para baixo os índices de aprovação do presidente. Além do seu comportamento errático no comando do país, contribuem para isso os altos índices de desemprego, a escalada inflacionária e o fracasso da resposta do governo federal à pandemia da covid-19. São mazelas que ameaçam diretamente o projeto de reeleição de Bolsonaro e favorecem adversários, como o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), apontado pelas pesquisas como favorito para a disputa presidencial do ano que vem. Nesse contexto, os protestos belicosos de hoje são uma oportunidade para o chefe do Executivo tentar manter, pelo menos, o apoio dos eleitores mais fiéis.
A principal dúvida no meio político é sobre se Bolsonaro sairá mais forte ou fraco politicamente do 7 de setembro. Nos atos de que participará na Esplanada dos Ministérios e na Avenida Paulista, o presidente deve repetir a frase “Eu só posso fazer alguma coisa se vocês assim o desejarem”, dita nas últimas semanas para insuflar apoiadores contra o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Pelo menos até agora, entretanto, as duas Cortes não deram qualquer sinal de que se sentem intimidadas com as investidas do chefe de governo, que as acusa de violar o direito à liberdade de expressão. O ministro Alexandre de Moraes, do STF, por exemplo, continua a decretar a prisão de bolsonaristas que propagam discursos de ódio nas redes sociais. Já o também ministro do Supremo Luís Roberto Barroso, atual presidente do TSE, se mantém firme na defesa do processo eleitoral e na rejeição ao voto impresso, defendido por Bolsonaro.
Para quem acompanha o dia a dia da política em Brasília, as manifestações pró-governo não devem pôr um fim na crise entre o Executivo e o Judiciário, podendo até aprofundá-la. O presidente, que passou a responder a inquéritos no STF e no TSE depois de dizer que não haverá eleições em 2022 sem o voto impresso, pode ser alvo de novas investigações caso os protestos de hoje descambem para ameaças e atos violentos contra instituições públicas. Um inquérito administrativo já aberto pela Corte Eleitoral para apurar os ataques de Bolsonaro às eleições, dependendo dos desdobramentos, pode até torná-lo inelegível no ano que vem, como já admitiram alguns ministros reservadamente.
Centrão pragmático
No Congresso, o discurso do presidente contra as eleições enfrenta ampla rejeição, vinda até mesmo de parlamentares do bloco de partidos conhecido como Centrão, que dá sustentação ao governo. Para o cientista político André Pereira César, da Hold Assessoria Legislativa, deputados e senadores vivem de votos e, segundo ele, dificilmente apoiariam um retrocesso democrático.
Quanto ao Centrão, o analista diz que, fiel ao seu perfil pragmático, o grupo já começou a ensaiar um desembarque do governo, em meio aos sinais de que as chances de reeleição de Bolsonaro ficam cada vez mais distantes. “O Centrão, como diz o gaúcho, está costeando o alambrado, saltando fora. O Centrão é pragmático ao extremo, e quando o Bolsonaro ameaça jogar fora das quatro linhas da Constituição, o Centrão joga dentro das regras do jogo, mas de maneira pragmática, o time que entra para ganhar os três pontos", disse César.
O deputado Carlos Jordy (PSL-RJ), por sua vez, considera que o presidente sairá mais forte dos atos do 7 de setembro. “A meu ver ele vai sair muito fortalecido, porque essas serão as maiores manifestações da história e, sem dúvida, uma das maiores em apoio ao presidente Bolsonaro. Isso vai demonstrar que o povo, a população continua firme com o presidente. Vai demonstrar a grande força que ele ainda tem de apoio popular e que boa parte das pesquisas tem mentido descaradamente sobre o apoio e a possível reeleição no ano que vem”, disse o parlamentar.
Jordy, que participará das manifestações na Avenida Paulista, afirmou que os protestos vão credenciar o presidente a adotar medidas em reação aos posicionamentos da cúpula do Judiciário. “Com o povo do lado do presidente, isso mostra que a vontade popular, o poder está sendo realmente exercido pelo presidente da República. Nós temos também que avaliar que nós estamos lidando com um STF que, através de dois ministros, tem tido um comportamento diferente do que seria usual. Não sei qual será a resposta do STF às manifestações, mas o presidente Bolsonaro sairá fortalecido”, disse o deputado.
Para o professor Paulo Calmon, do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB), a grande dúvida é se o Judiciário vai ceder às pressões de Bolsonaro. Na visão do docente, “o país será diferente após o dia 7 de setembro de 2021”. “O Brasil estará mergulhado num clima de instabilidade, confusão e de muita revolta de ambos os lados. Nesse contexto, não há como imaginar que o presidente saia mais forte. Afinal de contas, ele é o principal protagonista de toda essa mobilização”, afirmou.
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