O Supremo Tribunal Federal (STF) postergou para a quinta-feira (2/9) as votações dos ministros no julgamento sobre a validade da tese do "marco temporal" para demarcações de terras indígenas.
O julgamento foi retomado às 14h desta quarta-feira, mas foi encerrado quatro horas depois sem que os ministros se manifestassem.
A sessão da quarta foi ocupada por falas de advogados das partes e de organizações que figuram na ação como amice curiae (expressão em latim que significa "amigos da corte" e designa grupos que apresentam argumentos para tentar influenciar os votos dos ministros).
O julgamento será retomado na quinta-feira e tem repercussões para vários povos indígenas que pleiteiam a demarcação de territórios.
Ao analisar uma demanda do povo indígena xokleng, de Santa Catarina, a corte avaliará a validade do conceito do chamado "marco temporal".
Segundo defensores desse conceito, só podem reivindicar a demarcação de terras indígenas as comunidades que as ocupavam na data da promulgação da Constituição: 5 de outubro de 1988.
A tese vem sendo adotada formalmente pelo governo federal desde a gestão Michel Temer.
Na prática, a postura paralisou novas demarcações, já que grande parte dos processos pendentes trata de casos em que as comunidades dizem ter sido expulsas dos territórios antes de 1988.
O governo Jair Bolsonaro e seus aliados ruralistas defendem que o conceito seja validado pela corte.
Já indígenas afirmam que o conceito não está previsto na Constituição e que sua validação pelo STF privaria muitas comunidades de seu direito à terra, o que comprometeria sua capacidade de manter modos de vida e tradições.
Os indígenas afirmam ainda que muitas comunidades foram expulsas de seus territórios antes de 1988 e que definir essa data como marco para demarcações chancelaria a violência que sofreram no passado.
O caso xokleng
No julgamento em questão, o STF vai avaliar se a Terra Indígena Ibirama La-Klãnõ — habitada pelos xokleng e por outros dois povos, os kaingang e os guarani — deve incorporar ou não áreas pleiteadas pelo governo de Santa Catarina e pelos ocupantes de propriedades rurais.
A área em disputa se tornou formalmente parte da terra indígena em 2003, mas está parcialmente ocupada por plantações de fumo.
O governo de Santa Catarina diz que essa terra era pública e foi vendida a proprietários rurais no fim do século 19 — a área não estava, portanto, ocupada por indígenas em 1988.
Já indígenas afirmam que aquele território era usado pela comunidade para a caça, pesca e coleta de frutos, mas que décadas de perseguições e matanças forçaram o grupo a deixar a área.
Os xokleng foram um dos povos mais impactados pela ação de bugreiros — milícias contratadas até a década de 1930 para expulsar indígenas de territórios entregues a imigrantes europeus na região Sul.
O caso ganhou importância porque o STF determinou que a decisão sobre os xokleng terá repercussão geral.
Ou seja, se reconhecer que a demanda do grupo é legítima, haverá margem para que outras comunidades reivindiquem territórios dos quais dizem ter sido expulsas antes de 1988.
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O julgamento já foi adiado e interrompido repetidas vezes — e é possível que volte a ser postergado mais uma vez.
Isso acontecerá se algum ministro pedir vista do processo, solicitando mais tempo para analisar o tema. Nesse caso, não haveria prazo para a retomada do julgamento.
Indígenas acampados em Brasília pressionam para que o caso seja julgado antes que a Câmara dos Deputados vote o Projeto de Lei 490, que está em fase final de tramitação.
Entre outros pontos, o projeto estabelece 1988 como marco temporal para a demarcação de terras indígenas.
Se o STF invalidar a tese do marco temporal no julgamento, porém, é provável que a Câmara tenha de alterar ou descartar o projeto.
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