A CPI da Covid intensificou a ofensiva contra apoiadores do presidente Jair Bolsonaro e decidiu derrubar sigilos de pessoas próximas ao chefe do Executivo. Um dos alvos é o deputado Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo na Câmara. Depois de ter sido incluído na lista de investigados do colegiado, o parlamentar teve o seu sigilo fiscal quebrado.
Outro atingido pela decisão foi o advogado Frederick Wassef, que defende Bolsonaro e outros membros da família do presidente, como o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) e Jair Renan Bolsonaro, filhos do chefe do Executivo. Apesar de ele não estar na condição de investigado pela comissão, o relator da CPI, Renan Calheiros (MDB-AL), apresentou indícios de que Wassef teria algum tipo de relação com a Precisa Medicamentos, empresa que intermediou a compra, pelo Ministério da Saúde, de 20 milhões de doses da vacina indiana Covaxin, do laboratório Bharat Biotech, pelo valor de R$ 1,6 bilhão.
Barros também é apontado por Calheiros como alguém que teria proximidade com a Precisa. O parlamentar seria um dos responsáveis por facilitar a conclusão do acordo pela Covaxin. Na medida provisória (MP) elaborada pelo governo que permitia a importação e a distribuição de vacinas sem registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) — desde que aprovadas por autoridades sanitárias do exterior —, o deputado apresentou uma emenda para incluir, entre os órgãos internacionais habilitados, a congênere da Anvisa na Índia.
De acordo com o relator da CPI, os dois “possuem registros de passagens de recursos e/ou relacionamentos comerciais com origem ou destino na empresa Precisa-Comercialização de Medicamentos Ltda., seus sócios, familiares destes e outros investigados por esta CPI”. Outras sete pessoas foram apontadas por Calheiros como suspeitas de terem alguma participação com a empresa.
Com a quebra do sigilo fiscal, a comissão pediu que a Receita Federal envie ao colegiado a relação de empresas em que Barros, Wassef e os demais participam. A reportagem procurou Wassef, mas não conseguiu contato.
Nas redes sociais, Barros criticou a decisão do colegiado. “A CPI não encontrará nenhuma ligação minha com a Precisa. Todas as pessoas ouvidas no caso Covaxin negaram minha participação. A CPI extrapola, exagera e mente, mas, agora, a condução da relação com a CPI é com meus advogados”, afirmou Barros.
Antes da decisão de ontem da CPI, a defesa de Barros recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF) pedindo que a Corte anulasse quaisquer quebras de sigilo do deputado. O caso foi distribuído à ministra Cármen Lúcia, que cobrou explicações da CPI antes de tomar uma decisão.
A comissão ainda derrubou os sigilos fiscal, telefônico, bancário e telemático de blogueiros, jornalistas e influenciadores digitais bolsonaristas (veja Os alvos). Responsáveis por páginas como Instituto Força Brasil, Conexão Política, Crítica Nacional e Senso Incomum também foram atingidos. O objetivo da comissão é entender se houve algum tipo de financiamento público a essas pessoas para a disseminação de notícias falsas em meio à pandemia, que atrapalharam o enfrentamento da crise sanitária.
Gabinete paralelo
Os membros do chamado gabinete paralelo — que teria aconselhado Bolsonaro a tomar decisões contrárias à ciência no enfrentamento à pandemia — serão acusados de crime comum por Calheiros, ao fim dos trabalhos da comissão.
Esse gabinete seria formado por médicos que defendem a utilização de remédios comprovadamente ineficazes no tratamento contra a covid-19. Políticos e outros integrantes do governo de fora do Ministério da Saúde também são suspeitos de fazer parte desse grupo de aconselhamento.
“Pretendo, como relator — posso não aprovar nesta CPI —, responsabilizar por crime comum todos os membros do gabinete paralelo, pela maldade que fizeram contra o Brasil ao prescrever remédios ineficazes, ao estabelecer prioridades para gasto orçamentário, para execução de gasto público criminosamente”, afirmou Calheiros.
O senador comentou, ainda, que o relatório será apresentado na segunda quinzena de setembro e será conclusivo. “O meu relatório não vai mandar para procuradoria investigar nada. Ele vai concluir a partir das investigações realizadas aqui e pedindo para que, no prazo que a lei das Comissões Parlamentares de Inquérito reserva, a Procuradoria-Geral da República mande processar, e não investigar novamente. Não é esse o meu estilo, o meu propósito.”
Os alvos
Pessoas
» Deputado Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo na Câmara — sigilo fiscal
» Frederick Wassef, advogado — sigilo fiscal
» Francisco Maximiano, sócio-proprietário da Precisa Medicamentos — sigilo fiscal
» Emanuel Ramalho Cartori, sócio da Belcher Farmacêutica — sigilos fiscal, telefônico, bancário e telemático
» Allan Lopes dos Santos, jornalista do Canal Terça Livre — sigilos fiscal, telefônico, bancário e telemático
» Oswaldo Eustáquio Filho, jornalista — sigilo fiscal
Empresas e órgãos
» Global Gestão em Saúde — sigilos fiscal, telefônico, bancário e telemático
» Fib Bank Garantia de Fianças Fidejussórias — sigilos fiscal, telefônico, bancário e telemático
» Precisa Medicamentos — sigilos fiscal, telefônico, bancário e telemático
» Secretaria Nacional de Assuntos Humanitários (Senah) — sigilos fiscal, telefônico, bancário e telemático