CORONAVÍRUS

Barros investigado na CPI

Relator da comissão põe líder do governo na condição de suspeito por indícios de ilegalidades na compra de vacinas contra a covid-19 pelo Ministério da Saúde. Nome do deputado veio à tona na conversa que os irmãos Miranda tiveram com Bolsonaro sobre a Covaxin

O deputado Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo na Câmara, passou a ser investigado formalmente pela CPI da Covid. Relator do colegiado, o senador Renan Calheiros (MDB-AL) tomou a decisão por conta dos indícios de participação do parlamentar em esquemas de corrupção na aquisição de vacinas contra o novo coronavírus pelo Ministério da Saúde.

Barros estaria envolvido no esquema do contrato bilionário assinado pelo governo federal para a compra da Covaxin, do laboratório indiano Bharat Biotech. Em fevereiro, o governo fechou um acordo de R$ 1,6 bilhão para comprar 20 milhões de doses da vacina. Cada aplicação foi vendida a R$ 80,70, tornando o imunizante um dos mais caros negociados pelo Ministério da Saúde nesta pandemia.

O parlamentar entrou na mira da CPI por causa do depoimento ao colegiado do deputado Luis Miranda (DEM-DF) e do irmão dele, Luis Ricardo, chefe de importação do Departamento de Logística do ministério, que alertaram que a compra da Covaxin seria parte de um esquema de corrupção. Ao avisarem ao presidente Jair Bolsonaro sobre as suspeitas de irregularidades, o chefe do Executivo disse que seria “mais um rolo” do líder governista.

A CPI ainda suspeita do envolvimento de Barros na compra da vacina chinesa Convidecia, produzida pelo laboratório CanSino. O governo negociou a aquisição de 60 milhões de doses do imunizante, e o ministério chegou a assinar um contrato de intenção de compra, no valor de R$ 5 bilhões, no início de maio. Cada aplicação custaria US$ 17, valor mais elevado do que o de outros fármacos adquiridos pelo governo.

A contratação era intermediada pela Belcher Farmacêutica, que teve o contrato rompido unilateralmente, por decisão do CanSino. A empresa tem sede em Maringá (PR), onde Barros foi prefeito. A informação coletada pela CPI é de que um dos sócios da Belcher é filho de um empresário ligado ao deputado.

Relacionamentos

Diante dessas informações, Calheiros ponderou que “é necessário apurar de maneira aprofundada os atos do líder do governo Bolsonaro, suas relações e ligações políticas e empresariais, bem como na ausência de atitudes corretivas, especialmente, nas negociações e possíveis associações com servidores civis e militares do Ministério da Saúde investigados pela comissão”.

Segundo o senador, pelo “conjunto da obra” há “óbvios indícios de sua participação nessa rede criminosa que tentava vender vacina através de atravessadores, comprometendo, muitas vezes, setores da sua própria família e fazendo com que o país perdesse oportunidade de comprar vacinas na hora certa, vacinas que salvariam vidas”.

O relator ainda citou a proximidade de Barros com o ex-diretor de Logística do Ministério da Saúde, Roberto Ferreira Dias (exonerado em junho após a denúncia de que teria pedido propina para autorizar a compra da vacina AstraZeneca pelo governo federal e suspeito de chefiar um suposto esquema de pagamento de propina a parlamentares e servidores da pasta) e de Francisco Maximiano (sócio-proprietário da Precisa Medicamentos, que intermediou a compra da Covaxin) para justificar a investigação contra o deputado.

Ao tomar conhecimento da decisão da CPI, Barros não escondeu a irritação. Em uma rede social, escreveu: “CPI interrompe o meu depoimento, anuncia que sou investigado e que não pretende mais me ouvir. Não suportam a verdade e usam táticas covardes de vazamento. Minha conduta parlamentar é exemplar. Nada encontrarão. Agora, meus advogados conduzirão o relacionamento com a CPI”.

Em entrevista ao portal UOL, o deputado garantiu estar tranquilo. “Covardia deles. Eu estava lá, era só me perguntar. Tudo que me foi perguntado, esclareci com documentos. Então, quando ele (Calheiros) repete as mesmas coisas que esclareci à CPI, documentalmente, provando que não tenho envolvimento e me diz que estou sendo investigado pelo conjunto da obra, qual é o conjunto da obra? Não tem nenhum fato para imputar a mim”, reclamou.

Advogado é incluído

O advogado Túlio Silveira, que defende a Precisa Medicamentos — empresa que negociou com o Ministério da Saúde a venda de 20 milhões de doses da vacina indiana Covaxin pelo valor de R$ 1,6 bilhão —, foi incluído na lista de investigados da CPI da Covid. Protegido por um habeas corpus concedido pelo Supremo Tribunal Federal (STF), calou-se durante quase toda a sessão, inclusive sobre questões que não tinham relação com a negociação da Covaxin.

Nas poucas vezes que respondeu os senadores, Silveira reconheceu que participou de pelo menos duas reuniões com a Bharat Biotech, fabricante da Covaxin, mas não atuou em negociações e que apenas ajudou a companhia no aspecto jurídico. Mas documentos apresentados pela senadora Simone Tebet (MDS-MS) o desmentiram, como e-mails que ele enviou ao Ministério da Saúde pressionando para a pasta assinatura de um contrato mesmo sem uma procuração da Precisa com tradução juramentada, como diz a lei.

Apesar se se dizer advogado da Precisa, Silveira não explicou o porquê de ter ocupado outras funções na empresa, como gerente de parcerias internacionais e compliance e gerente de contratos. Instruído a apresentar à CPI a comprovação de que estava autorizado a atuar como advogado da empresa, não atendeu ao pedido dos senadores.

Outro fator que levantou suspeitas foi o fato de Silveira só ter aberto um escritório de advocacia próprio nas 48 horas que antecederam a assinatura do contrato da Covaxin pelo ministério. O acordo foi concluído em 25 de fevereiro, mas ele não tinha pessoa jurídica até dois dias antes. (AF)

Heinze nega lobby por laboratórios veterinários

O senador bolsonarista Luis Carlos Heinze (PP-RS) rebateu, ontem, as acusações de que teria feito lobby para a inclusão de empresas do setor veterinário na produção de vacinas contra a covid-19 e de que atuou como intermediário de negócios dentro do governo que incluíram a Precisa Medicamentos. As informações foram publicadas pelo jornal Folha de S.Paulo, que afirma que dias antes de o caso da vacina Covaxin chegar ao conhecimento do colegiado, e três meses antes da existência de uma lei que permitiu a atuação de indústrias de vacinas veterinárias no ramo de imunizantes para covid-19, o parlamentar procurou a Precisa para saber se a empresa poderia firmar parceria com grandes indústrias do setor animal para produção da vacina.

Segundo o senador, em conjunto com os senadores Confúcio Moura (MDB-RO), Izalci Lucas (PSDB-DF), Wellington Fagundes (PL-MT) e Nelsinho Trad (PSD-MS), na tentativa de procurar conhecer o assunto e apoiar o tratamento de vacinas, eles fizeram duas reuniões com o Instituto Butantan para tratar de alternativas de buscar o maior número de vacinas para a população, “já que existia uma guerra entre João Doria e Bolsonaro”.

“Na sequência, intensifiquei os esforços para viabilizar o envase e a produção de vacinas em laboratórios com vasta experiência na produção para o combate a viroses animais, que também poderiam fabricar agora vacinas para humanos. Esse trabalho resultou na aprovação do projeto de autoria do senador Wellington Fagundes”, explicou.

Heinze comentou, ainda, que “sempre estive muito envolvido com atividades relacionadas à busca de alternativas para a produção de vacinas nacionais. Buscamos e procuramos e apoiamos projetos da utilização de laboratórios com experiência prévia nessa produção de vacinas. Existem hoje 15 alternativas que estão ligadas ao Ministério da Ciência e Tecnologia”.

O senador criticou o jornal por citar as ligações que ele teria feito à Precisa. “Se pegarem no meu telefone não são duas, três, cinco, são milhares de ligações telefônicas, várias reuniões presenciais, o relato de meia dúzia de ligações minhas identificadas com certos representantes não faz da minha pessoa um lobista. Quem acha isto deverá provar e responder pelas acusações”, rebateu.

O parlamentar ficou conhecido por, nas sessões da CPI, defender o governo Bolsonaro. Habitualmente, tenta contrapor o número de mortos pelo novo coronavírus com o de vidas salvas, além de fazer a defesa da medicamentos sem eficácia no tratamento da covid-19 e citar vários cientistas cujos estudos são rejeitados pela comunidade científica internacional. (AF)