As comparações internacionais são o melhor instrumento para avaliarmos a qualidade do governo, do Parlamento e da política em geral. Esses julgamentos, no plano interno, são prejudicados pela polarização natural que separa as pessoas dentro de um mesmo país. As investigações modernas sobre a opinião política têm verificado que é a emoção, não a razão, o que determina em instância final o julgamento político. São os afetos que ditam a última palavra, e os afetos são quase sempre incompreensíveis. Por isso, é tão difícil, e até mesmo raro, que partidários e opositores alcancem um entendimento comum sobre qualquer coisa.
Isso não significa que governo e Parlamento estão acima de qualquer juízo imparcial. Pelo contrário, há muitos critérios objetivos para esse julgamento. Um bom recurso é observar o que se passa em outros países. O mundo todo está lutando para se recuperar da tragédia humana e econômica provocada pela pandemia, mas há exemplos de governos que estão não somente reparando os danos causados, mas se mobilizando para grandes e importantes mudanças.
Todos sabemos do profundo grau de polarização que alcançou a política americana após a eleição de Donald Trump. Pela primeira vez na história daquele país, militantes radicais chegaram ao ponto de invadir o edifício do Congresso e ameaçar a integridade física de seus integrantes, quando se reuniam para a sessão de homologação dos resultados eleitorais.
Passados poucos meses da posse de Joe Biden, a administração e o Parlamento, num acordo bipartidário, conseguiram aprovar um gigantesco programa de investimentos públicos, com aumento do deficit e da dívida, para relançar a economia do país e acabar com o desemprego. Presidente, senadores e deputados cuidando do interesse dos americanos, não da política.
Do outro lado do oceano, um país eternamente em crise, a Itália, parece que despertou para os problemas reais da sua população. Depois de assistir à demolição do seu sistema político e partidário no curso de uma larga operação judicial contra a corrupção e de ver os velhos políticos serem substituídos, primeiro por um magnata da imprensa, sem ideias ou valores, e, depois, por um comediante de televisão aliado a bolsões da direita radical, a política italiana recuou quando estava no limiar do abismo, empobrecida e sem esperança.
Formou-se um governo completamente novo e diferente, liderado pelo antigo presidente do Banco Central europeu, que presidiu a recuperação da economia europeia após a crise de 2008, o economista Mario Draghi. Em seis meses, estabeleceu bases firmes para a revitalização do país. Para começar, acelerou a vacinação e já superou a Alemanha, a França e a média dos países europeus em população imunizada. Agora, está implantando um enorme programa de investimentos, mobilizando 235 bilhões de euros para investimento nos próximos cinco anos, o que faz da Itália o país europeu que mais está investindo no crescimento de sua economia. A política, mesmo nos lugares mais improváveis, sempre pode salvar um país e sua democracia.
Enquanto isso, no Brasil, governo e políticos estão fazendo exatamente o contrário. O presidente só pensa nas eleições de 2022, e sua agenda só tem desfiles de motocicletas e tentativas de mudar as regras eleitorais para facilitar o seu caminho ou pôr em dúvida sua eventual derrota. Em vez de crescimento econômico e investimentos sociais, temos a luta pelo voto impresso e as disputas com o Tribunal Superior Eleitoral. Na sua cabeça, o Brasil é um país sem problemas, está todo mundo rico e feliz.
Os políticos no Congresso também não fazem outra coisa. Discutem e votam até de madrugada, mas apenas para mudar as leis para facilitar suas próprias eleições. Todas as demais questões passam bem ao largo. Para eles, também, o Brasil é um país rico e feliz.
Há 40 anos, o Brasil cresce menos do que a maioria dos países. O desemprego é o maior de nossa história. Grande parte da população vive na pobreza. O Brasil é um país rico de recursos, mas órfão da política.