A Câmara rejeitou, ontem (12/8), a parte da proposta de emenda à Constituição (PEC) da reforma eleitoral que previa o fim do segundo turno nas eleições para presidente da República, governadores e prefeitos. Com a decisão, que atendeu a um destaque apresentado pelo PT, os deputados concluíram a análise da matéria em primeiro turno. Na véspera, o plenário já havia retirado do texto o chamado “distritão” e aprovado a volta das coligações para as campanhas a cargos proporcionais — vereadores, deputados estaduais e federais. A votação do texto em segundo turno ficou para a próxima terça-feira.
Na sessão de ontem, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), questionou os deputados se preferiam votar a PEC em segundo turno no mesmo dia ou se era melhor deixar para a semana que vem. A relatora da proposta, Renata Abreu (Podemos-SP), não estava presente. Esse foi um dos pontos que pesaram a favor do adiamento.
A derrubada do “distritão” resultou de um acordo entre 15 partidos. Essa modalidade eleitoral beneficiaria os candidatos mais votados, sem levar em conta os votos dados aos partidos, como acontece no atual sistema proporcional. O “distritão” é muito criticado por políticos e especialistas, que o associam ao enfraquecimento dos partidos e ao favorecimento a celebridades e postulantes já em exercício do mandato.
Pelo acordo, o “distritão” seria rejeitado, mas voltariam as coligações para cargos proporcionais, que haviam sido extintas pelo Congresso em 2017. Para os críticos, essas alianças partidárias favorecem os chamados partidos de aluguel e alianças entre políticos sem qualquer afinidade ideológica.
Apenas sete partidos não aderiram ao acordo: PSD, PSol, Novo, Cidadania, PV, Rede e PDT. Na retomada da sessão, ontem, líderes dessas siglas reafirmaram que o “distritão” e as coligações não fortalecem o sistema político-eleitoral.
Quanto às eleições para presidente, governador e prefeito, o texto original da PEC previa o fim do segundo turno a partir de 2024. No modelo proposto pela relatora, o eleitor escolheria até cinco candidatos, em ordem decrescente de preferência. Seria considerado eleito o candidato que obtivesse a maioria absoluta das primeiras escolhas dos eleitores, não computados os votos em branco e os nulos.
Ontem, porém, o plenário aprovou um destaque apresentado pelo PT pela retirada desse dispositivo e a manutenção das eleições majoritárias na forma como são realizadas atualmente, em até dois turnos. O destaque foi aprovado por 388 votos a 36.
CB - Veja as mudanças aprovadas pela Câmara dos Deputados
Mulheres
Os deputados aprovaram, também, o dispositivo da PEC que prevê a contagem em dobro dos votos dados pelos eleitores a mulheres e a pessoas negras. Esse mecanismo, válido entre os anos de 2022 a 2023, serve apenas para o cálculo das verbas que cada partido receberá do Fundo Eleitoral, e não para efeito da eleição da candidata ou candidato.
A deputada Gleisi Hoffmann (PR), presidente nacional do PT, comemorou a decisão. “Os votos dados a candidatas mulheres ou a candidatos negros para a Câmara dos Deputados nas eleições de 2022 a 2030 serão contados em dobro. Grande incentivo para que os partidos lancem cada vez mais candidaturas negras e femininas. Aprovamos agora”, frisou, pelas redes sociais.
Outra mudança importante aprovada pelos deputados é sobre a data de posse de presidentes e governadores. A partir das eleições de 2026, mudará de 1º de janeiro para 5 e 6 do mesmo mês, respectivamente.
Após a aprovação da reforma política em segundo turno na Câmara, a PEC seguirá para a análise do Senado, onde, se não for chancelada até 2 de outubro, não valerá para as eleições de 2022.
Pacheco vê retrocesso
A PEC da reforma eleitoral, apreciada a toque de caixa pela Câmara, é vista com ressalvas no Senado. O presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), já afirmou que existe muita resistência ao texto e criticou a volta das coligações partidárias, aprovada pelos deputados na apreciação da proposta em primeiro turno.
“Considero que é um retrocesso. Nós fizemos uma opção inteligente e, 2017, e um dos itens é justamente o fim das coligações e, com a cláusula de desempenho, fará com que nós tenhamos menos partidos políticos e uma melhor representatividade na política”, afirmou, ao portal G1. “Vamos submeter aos líderes partidários do Senado, aos senadores, para avaliação da tramitação dessa ideia, para que ela possa ser decidida, também, pelo Senado. Mas vejo uma tendência, no Senado, de estabelecer que as eleições de 2022 tenham que se dar com as mesmas regras impostas com a reforma de 2017.”
Para o líder do Podemos, Álvaro Dias (PR), até a próxima terça-feira, quando a matéria será votada em segundo turno pelos deputados, a adesão ou rejeição de senadores ficará mais clara. “Não sei se tem aceitação majoritária. Tenho certeza de que tem reações contrárias. Em relação ao nosso partido, vamos reunir a bancada para discutir a posição na próxima semana”, frisou. “A fala do presidente (Pacheco) influencia. É um voto, uma posição. Mas, em matéria de corrida eleitoral, os partidos se mobilizam para o próprio interesse. Muitos estão com dificuldade de criação de chapa própria e dependem de coligação.”
Vice-líder do governo no Senado, Eduardo Gomes (MDB-TO) está entre os que veem a PEC com cautela. “Não posso falar que é ruim, pois não temos o resumo final. O distritão andou rápido e foi recusado com votação surpreendente. Estou no interior do Tocantins em um encontro de 120 vereadores. Eles veem a mudança de coligação com incoerência. Passaram por um regime como se tivesse ocorrido uma experiência, como se fossem cobaias”, destacou. “Não dá para bater o martelo e dizer que vai ser mal recebida. Mas há um questionamento pertinente sobre o motivo de uma reforma eleitoral a cada pleito.”
O líder do PSDB, Izalci Lucas (DF), ressaltou que havia uma rejeição forte, especialmente, ao distritão. “Tiraram o bode da sala e aprovaram a matéria. Na Cidade Ocidental (GO), já tivemos uma coligação do DEM com o PCdoB. Você vota em um comunista e recebe um liberal. Já tínhamos debatido essas incoerências”, disse. “O Senado é uma Casa majoritária. Nossa eleição não é proporcional. É uma matéria muito de interesse da Câmara. Não sei até que ponto senadores vão se meter nisso, pois não nos afeta. Vai ter muito questionamento, é evidente.” (LC e JV)
As mudanças
Veja o que foi aprovado em primeiro turno na Câmara
Coligações
Como parte do acordo para derrubar o “distritão”, o plenário aprovou a volta das coligações partidárias para as eleições proporcionais (deputados e vereadores) a partir de 2022. Para que isso ocorra, a PEC precisa ser aprovada no Senado e virar emenda constitucional antes do começo de outubro (um ano antes do pleito).
Votos em mulheres
A proposta prevê a contagem em dobro dos votos dados a candidatas e a negros para a Câmara, nas eleições de 2022 a 2030, para fins de distribuição entre os partidos políticos dos recursos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanhas (Fundo Eleitoral). Entretanto, essa contagem em dobro será aplicada apenas uma vez, ou seja, os votos para uma candidata negra, por exemplo, não poderão ser contados em dobro duas vezes. Um dos critérios para a distribuição dos recursos desses fundos é exatamente o número de votos obtidos, assim, a ideia é estimular candidaturas desses grupos.
Desempenho
O texto aprovado faz mudanças na Emenda Constitucional (EC) 97, de 2017, que trata da cláusula de desempenho e permite acesso aos recursos do Fundo Partidário e à propaganda no rádio e na televisão apenas aos partidos que tenham obtido um número mínimo de deputados federais ou uma percentagem mínima de votos válidos distribuídos em 1/3 dos estados. A proposta prevê acesso ao fundo e à propaganda eleitoral por parte dos partidos que tenham ao menos cinco senadores. A intenção é ser uma alternativa à regra atual, que exige 11 deputados eleitos em 2022 e 13, em 2026. Nessa conta dos cinco senadores entram, além dos eleitos, aqueles que o partido já tem no Senado e cuja vaga não esteja em disputa. A mesma regra valerá para as eleições de 2030 em diante, quando acaba a transição da cláusula de desempenho e ficam valendo regras definitivas.
Fidelidade partidária
Sobre a fidelidade partidária, o substitutivo prevê a perda do mandato dos deputados (federais, estaduais ou distritais) e vereadores que se desfiliarem da legenda, exceto quando o partido concordar ou em hipóteses de justa causa estipuladas em lei. Em nenhum dos casos, a mudança de partido será contada para fins de distribuição de recursos do Fundo Partidário, do Fundo Especial de Financiamento de Campanha e de acesso gratuito ao rádio e à televisão.
Data da posse
Quanto à posse de presidente da República e de governadores, o substitutivo muda a data de 1º de janeiro para 5 e 6 do mesmo mês, respectivamente. No entanto, as novas datas valem apenas para as posses dos eleitos a partir dos pleitos gerais de 2026.
Fonte: Agência Câmara de Notícias
Aprovada federação de partidos
A Câmara aprovou, ontem, a criação das federações partidárias, considerada uma garantia de representação para as legendas pequenas. O projeto, de origem do Senado, foi aprovado por 304 votos contra 119. A maioria das siglas apoiou a medida, com exceção do PSL, PSD, DEM e Novo. O texto segue, agora, para sanção presidencial e poderá valer já para as eleições de 2022, caso não haja vetos.
O texto original é de autoria de Renan Calheiros (MDB-AL) e permite a dois ou mais partidos se reunir em uma federação para que ela atue como se fosse uma única sigla nas eleições. Na Câmara, a medida foi relatada pelo deputado Silvio Costa Filho (Republicanos-PE).
“A federação, como nova forma de organização partidária, passa a funcionar independentemente do sistema eleitoral, seja ele proporcional, seja majoritário. Em qualquer hipótese, participará do processo eleitoral como um só partido, e seus candidatos eleitos dessa forma atuarão nas diversas casas parlamentares e nos governos. E o resultado concreto dessa nova formação é a redução efetiva do número de partidos, que concorrem às eleições, que atuam nos parlamentos”, escreveu Costa Filho no seu parecer.
O projeto prevê que, depois da eleição, esse “casamento” tem de durar pelo menos uma legislatura de quatro anos, ou seja, os federados serão obrigados a atuar como uma bancada no Congresso, embora possam manter seus símbolos e programas.
O tema entrou em debate após o “endurecimento” da cláusula de desempenho ou de “barreira” — ela funciona com uma espécie de “filtro”. Estipula um patamar mínimo de votos para que uma legenda tenha acesso ao Fundo Partidário, tempo de rádio e TV no horário eleitoral e espaços de liderança no Congresso, e cresce progressivamente a cada eleição.
O PCdoB, por exemplo, era um dos partidos ameaçados por essa regra. A presidente da legenda, Luciana Santos, acompanhou a votação do projeto no plenário da Câmara.