Após diversas críticas ao desfile de veículos blindados e armamentos da Marinha, na próxima terça-feira (10/8), em Brasília, dia em que se prevê votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do voto impresso auditável, na Câmara, o presidente Jair Bolsonaro convidou os presidentes dos outros Poderes a acompanharem a passagem dos militares pela capital federal.
O mandatário direcionou o convite aos presidentes do Supremo Tribunal Federal (TSE), Luiz Fux; da Câmara, Arthur Lira (PP-AL); do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG); do Tribunal de Contas da União (TCU), Ana Arraes; do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Luís Roberto Barroso; do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Maria Cristina Irigoyen Peduzzi; e do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Humberto Martins. Ele também convidou, de forma genérica, deputados e senadores.
"Como ocorre desde 1988, a nossa Marinha realiza exercícios em Formosa/GO. Como a tropa vem do Rio, Brasília é passagem obrigatória. Muito me honraria sua presença amanhã na Presidência (08h30), onde receberei os cumprimentos da Força e lhes desejarei boa sorte na missão. Presidente Jair Bolsonaro. Chefe Supremo das Forças Armadas", escreveu, em seu Facebook.
De fato, o treinamento ocorre desde 1988, em Formosa, mas, pela primeira vez, será em conjunto com o Exército e a Aeronáutica. Também é a primeira vez que os militares vão em veículos blindados fazer o convite, o que eles chamam de ato "promocional" ou simbólico. O treinamento começou no dia 2 de agosto, e vai até o dia 18. Bolsonaro será convidado para ir no dia 16.
A situação ocorre em um cenário de profunda crise institucional entre os Poderes, ameaças de Bolsonaro à realização das eleições em 2022 e no dia em que a Câmara dos Deputados deve votar a PEC que institui o voto impresso auditável, proposta do governo que vem sendo alvo de críticas e cuja derrota é iminente.
O anúncio do ato gerou ampla repercussão negativa entre parlamentares, que avaliaram como uma tentativa de intimidação. Para irem ao Palácio do Planalto levar o referido convite, os militares devem passar em frente ao Congresso e ao STF, visto que todos ficam localizados na Praça dos Três Poderes. A senadora Simone Tebet (MDB-MS), por exemplo, chamou o desfile de intimidação, e afirmou que se de fato ocorrer, a Câmara precisa rejeitar a PEC "em resposta clara e objetiva de que vivemos numa democracia e que assim permaneceremos".
O presidente Arthur Lira disse em entrevista ao site O Antagonista que encarou o episódio como uma "trágica coincidência". "É bem verdade que essa Operação Formosa acontece desde 1988 aqui em Goiás. Mas também nunca houve um desfile na Esplanada dos Ministérios, na frente Palácio do Planalto. Com relação à votação, nós não deveremos ter problema. Se os deputados quiserem, a gente pode adiar a votação. Eu quero acreditar que este movimento já estava programado. Só não é usual. Não sendo usual, em um país que está polarizado, isso dá cabimento para que se especule algum tipo de pressão", afirmou.
A Marinha negou, em nota, que ida tenha relação com a PEC. Segundo instituição, o ato já estava planejado, e o comboio saiu do Rio no dia 8 de julho. No total, a operação conta com 150 viaturas, sendo que 14 ficarão em exposição na terça-feira, em frente ao prédio da Marinha na Esplanada dos Ministérios.
Cenário
A ação dos militares ocorre em um contexto maior. Recentemente, o jornal O Estado de S. Paulo publicou uma reportagem na qual dizia que o ministro Braga Netto mandou um recado ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), por meio de um interlocutor político, de que se a PEC do voto impresso auditável não fosse aprovada, não haveria eleições em 2022. Lira não desmentiu a reportagem. Braga Netto afirmou que não fala por meio de interlocutores, chamou o episódio de desinformação e defendeu, ao final da nota divulgada, o voto impresso.
Antes disso, os comandantes das três Forças e o ministro Braga Netto divulgaram uma dura nota contra o presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid-19, senador Omar Aziz (PSD-AM,), depois que ele disse que os bons militares estavam envergonhados com o "lado podre" das Forças. Nela, a cúpula militar disse que "as Forças Armadas não aceitarão qualquer ataque leviano às Instituições que defendem a democracia e a liberdade do povo brasileiro".
Depois disso, o comandante da Aeronáutica, tenente-brigadeiro do ar Carlos de Almeida Baptista Junior, disse em entrevista ao O Globo que as Forças não emitiriam 50 notas, que seria apenas aquela. “Homem armado não ameaça”, enfatizou. O comandante da Marinha, Almir Garnier Santos, apoiou a postura, ao publicar a entrevista em seu Twitter.