ELEIÇÕES

Bolsonaro centra fogo em Barroso, um dia depois de inquérito aberto no TSE

Mesmo investigado pelo TSE, chefe do Executivo mantém presidente da Corte como alvo preferencial. Ele acusa o ministro de tentar favorecer a volta de Lula ao Planalto e de integrar um movimento contra interesses nacionais. Conselho da OAB se solidariza com magistrado

Um dia depois de o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) abrir um inquérito administrativo para apurar ameaças às eleições, o presidente Jair Bolsonaro prosseguiu nos ataques ao presidente da Corte, Luís Roberto Barroso. Ele disse, ontem, que não aceitará intimidações e que o ministro — também membro do Supremo Tribunal Federal (STF) — se opõe ao voto impresso pelo “interesse pessoal” de favorecer a eleição do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 2022.

A decisão de abrir uma investigação foi tomada pelo TSE na segunda-feira, após Bolsonaro afirmar, em diferentes ocasiões, que não haverá eleições, caso o Congresso rejeite a proposta de emenda à Constituição (PEC) do voto impresso, em tramitação na Câmara. No mesmo dia, o tribunal enviou ao Supremo uma notícia-crime pedindo que o chefe do Planalto seja incluído como investigado no inquérito das fake news.

Bolsonaro reagiu aos dois atos: “Não aceitarei intimidações. Vou continuar exercendo meu direito de cidadão, de liberdade de expressão, de crítica”, frisou ele, que tem dirigido ofensas ao presidente do TSE pelo fato de o magistrado ser contrário à PEC. “O ministro Barroso presta um desserviço à nação brasileira, cooptando gente de dentro do Supremo, querendo trazer para si, ou dentro do TSE, como se fosse uma briga minha contra o TSE ou contra o Supremo. Não é contra o TSE nem contra o Supremo. É contra um ministro do Supremo, que também é presidente do Tribunal Superior Eleitoral, querendo impor sua vontade”, acrescentou, em conversa com apoiadores na saída do Palácio da Alvorada.

O chefe do Planalto também disparou contra Barroso durante entrevista à TV Piauí. “Eu não estou aqui para criticar poder nenhum, mas tiraram o cara (Lula) da cadeia, tornaram ele elegível, para não ser presidente? É improvável”, disparou. “Agora, por que tiraram aquele cara da cadeia? Por que o tornaram elegível? Passou na primeira instância, segunda instância, terceira instância (…). E anularam as provas também. Vários delatores devolveram mais de R$ 3 bilhões, uma prova de crime.”

“Complô”
O presidente disse, ainda, que a atuação de Barroso está relacionada a um movimento articulado, de fora do Brasil, contra os interesses nacionais. Ele frisou que a facada de que foi vítima na campanha de 2018 faz parte desse suposto complô. Além disso, novamente sem apresentar provas, voltou a enfatizar que houve fraudes nas eleições que ele próprio venceu.

“Você sabe os interesses de fora no Brasil, os interesses daqueles que perderam o poder para uma pessoa que não tinha nada para chegar. Tentaram me matar, mas não conseguiram”, emendou. Segundo ele, há muita coisa em disputa, inclusive a indicação de nomes para compor o STF.

“O que está em jogo, também, nas eleições de 22? Quem se eleger vai indicar mais dois nomes para o Supremo Tribunal Federal. É muita coisa em jogo. E se, porventura, tivermos desconfiança de fraude? Eu vou recorrer ao Supremo Tribunal Federal, cujo relator deve ser o ministro Barroso?”, questionou. “Por que Barroso não fica livre dessa manta de desconfiança e não diz: ‘Vamos fazer o voto impresso’?”, acrescentou.

Bolsonaro também insistiu na fake news de que o sistema eletrônico não pode ser auditado. “Temos um problema pela frente: umas urnas eletrônicas, que você não tem como auditá-las. E uma pessoa apenas, o ministro do STF, diz que a gente tem de acreditar”, afirmou, ainda em referência a Barroso. “Se eu estou apresentando mais uma forma de nós colocarmos um filtro e garantir a lisura das eleições, por que ele é contra? A gente começa a pensar outra coisa.”

Os ataques de Bolsonaro repercutiram na CPI da Covid, que, ontem, tomou o depoimento do reverendo Amilton Gomes de Paula (leia reportagem na página 5). O presidente da comissão, senador Omar Aziz (PSD-AM), disse que a polêmica em torno do voto impresso é mais uma estratégia diversionista de Bolsonaro para desviar o foco dos grandes problemas do país, como o alto número de mortes pela covid-19 e o recorde nas taxas de desemprego.

Conselho da OAB
Já o vice-presidente do Conselho Federal da OAB (CFOAB), Luiz Viana, enviou carta a Barroso se solidarizando com o ministro. “Só quem não conhece a história das eleições no Brasil desmerece a importância da urna eletrônica, que eliminou a possibilidade de fraude através dos mapas de totalização”, frisou ele, que classificou o discurso do presidente do TSE, na segunda-feira, como “histórico”.

Viana disse lamentar a análise, no Congresso, da PEC do voto impresso. Segundo ele, a discussão ocorre sob incentivo de fake news, que servem somente para “camuflar a complexidade da realidade social e política do país e para gerar falsas suspeições sobre a legitimidade do nosso processo eleitoral”.

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